sexta-feira, 11 de março de 2011

"E disse Deus: Haja luz"

E houve luz. E viu Deus que era boa a luz; e fez separação entre a luz e as trevas. E Deus chamou à luz Dia; e às trevas chamou Noite. E foi a tarde e a manhã; o dia primeiro (Gn 1.3-5).


Grande número de passagens da Bíblia, quando lidas, não despertam nem revelam todo o seu conteúdo. Creio que, assim como ocorreu e ocorre comigo, também ocorra com outros leitores: lemos e relemos os textos, mas em dado momento ou dia vemos algo que havia passado desapercebido. E em muitas dessas vezes notamos algo “aparentemente” conflitante, contraditório, como essa passagem de Gênesis.


Não há nada de errado com nenhuma passagem bíblica, nem com o Hino da Criação (Gn 1 e 2). Mas, como é possível a existência da luz antes da criação dos luzeiros ou luminares, isto é, como pôde a luz surgir no sistema solar antes da criação dos astros, estrelas e planetas? Não são eles os geradores e refletores da própria luz? Como pôde haver luz no primeiro dia (Gn 1.3-5) se os luminares foram criados somente no quarto dia (Gn. 1.14-19)?

Há algum tempo, recebi uma carta perguntando sobre isso. Na época, apresentei, em resposta à essa carta, algumas sugestões de interpretação que alguns teólogos e comentaristas bíblicos costumam fazer. Mas, concordo: não pude esclarecer a questão de forma satisfatória. Felizmente hoje podemos entender com maior clareza, ou, na pior das hipóteses, propor uma explicação mais concreta sobre a natureza da luz, além da explicação dada pela própria fé, que é a prova das coisas que não vemos. Não basta apenas dizer – como alguns – que a luz é escuridão iluminada, não é mesmo?

Vamos considerar uma interpretação científica. Nascido em Edimburgo, na Escócia, em 1831, James Clerk Maxwell investiu em saber como a eletricidade gera magnetismo e vice-versa. Munido de baterias, ímãs e fios de cobre, Maxwell pôs-se a pesquisar.

Ao final da primeira fase de sua pesquisa, ele registrou o comportamento da eletricidade e do magnetismo na matéria de forma matemática, por meio do que conhecemos como As Quatro Equações de Maxwell.

Maxwell então fez a si mesmo uma pergunta estranha: “Como suas equações seriam formuladas no espaço vazio, no vácuo, num lugar onde não houvesse cargas elétricas, nem correntes elétricas?” Ele adaptou suas equações, reconsiderando alguns valores para os campos elétrico e magnético e outras variações do espaço tridimensional1, mas manteve (intuitivamente) a simetria entre esses campos. “Mesmo no vácuo”, comentou o astrônomo Carl Sagan2, “na ausência total de eletricidade, ou até de matéria, um campo magnético variável, segundo a proposição de Maxwell, provoca um campo elétrico, e vice-versa”. Provavelmente esse campo magnético é próprio do Universo.

Em suma, as quatro equações de Maxwell no vácuo afirmam:

1 – não há cargas elétricas no vácuo;

2 – não há unipolares magnéticos no vácuo;

3 – um campo magnético variável gera um campo elétrico; e

4 – vice-versa, um campo elétrico variável gera um campo magnético.

Assim, testando suas equações em laboratório, Maxwell observou que os campos elétrico e magnético no vácuo se propagavam, espantosamente, com a mesma velocidade que já fora medida para a luz!3 Constatou-se, então, que a eletricidade e o magnetismo estavam implicados de forma profunda na natureza da luz.

Em outras palavras, a presença de magnetismo no Universo gerava uma corrente elétrica, e vice-versa, e essa era a natureza da luz.

Curiosamente, isso, de certa forma, independe do sol que conhecemos ou das estrelas. Há uma infinidade de outros corpos celestes que podem ser os agentes produtores desses campos magnéticos e elétricos. Mas, Maxwell ainda disse que o vácuo “podia ser eletricamente polarizado”, isto é, possuir seus próprios campos eletromagnéticos, independente da matéria.

Maxwell sentiu-se obrigado a oferecer uma espécie de “modelo mecânico” para a propagação de uma onda eletromagnética (luz) através do vácuo perfeito. Assim, ele imaginou o espaço preenchido com uma substância misteriosa a que deu o nome de éter, que sustentava e continha os campos magnético e elétrico variando no tempo – algo semelhante a uma gelatina vibrante, mas invisível, que permeava o universo. O estremecimento do éter era a razão para a luz viajar através dele – assim como as ondas da água se propagam através da própria água e as ondas de som através do ar. Essa substância tinha de ser muitíssimo fina, “fantasmagórica”, quase incorpórea, para não alterar o curso dos planetas e estrelas, mas bastante rígida para sustentar todas essas ondas que se propagavam a uma velocidade prodigiosa: a velocidade da luz.

Assim, Maxwell descrevia o modo pelo qual a luz era difusa no vácuo e respondia cientificamente à pergunta que muitos de nós sempre fizemos.

Em resumo, temos:

1 – mesmo no vácuo, na ausência total de eletricidade, ou até de matéria, um campo magnético variável provoca um campo elétrico, e vice-versa;

2 – testando essas equações em laboratório, Maxwell observou que os campos elétrico e magnético no vácuo se propagavam, espantosamente, com a mesma velocidade que já fora medida para a luz;

3 – a presença de magnetismo no Universo gerava uma corrente elétrica, e vice-versa, e essa era a natureza da luz;

4 – Maxwell também considerou o espaço preenchido com uma substância misteriosa a que deu o nome de éter, responsável pela difusão da luz através do cosmo.

Albert Einstein comentou sobre a experiência de Maxwell: “A poucos homens no mundo tem sido concedida [por Deus] uma experiência dessas”.

Assim, é perfeitamente possível que a luz já existisse quando os luzeiros foram criados por Deus no quarto dia, o que não permite a conclusão de que a passagem apresenta uma contradição no relato feito pelo autor do Gênesis.

Mas ainda pode ser levantada a seguinte questão: a explicação de Maxwell exclui a criação divina do relato? A resposta é não. Não é preciso separar Deus da explicação proposta por Maxwell, pois se trata de questões distintas. A criação ex nihilo (do nada Deus faz tudo) não é excluída neste caso porque a questão levantada é qual a natureza da luz. A natureza de um evento físico é explicada por propostas dadas pela Física. Deus não pode ser explicado por eventos físicos; podemos observar evidências de Sua existência, mas não prová-la por esses meios.

Mas se considerarmos que a luz tem natureza espiritual devemos deixar de lado os experimentos de Maxwell e centrarmos em uma interpretação espiritual dos eventos da Criação, no caso a natureza da luz. Assim, para concluir, gostaria de instigá-lo um pouco.

Considere o seguinte: Deus é onipresente, está em todos os lugares, em todos os tempos, de eternidade em eternidade. João escreveu que Deus é luz (do grego foos): “Deus é luz, e não há nele trevas nenhuma” (1Jo 1.5).

Não seria o caso de uma interpretação não científica, mas espiritualizada do texto bíblico? Ora, a Bíblia foi inspirada pelo próprio Deus, e não seria errado considerar muitas de suas passagens de forma espiritual.

Quando disse “Haja luz”, Deus não estaria manifestando a Si mesmo no cosmo? A manifestação de Sua presença nas trevas (já que Deus é luz) não estaria marcando o início da criação feita por Ele mesmo? Ou a presença do Seu Espírito foi tão marcante e poderosa que até mesmo chegou a afetar o mundo físico produzindo campos eletromagnéticos, ou campos de luz? Vamos pedir luz a Ele para responder a isso, certo?
 
* Texto foi extraído do livro Ciência e Fatos Bíblicos (Ed. Dynamus), de minha autoria.
 
Siga-me no Twitter: @magnopaganelli

Nenhum comentário:

Postar um comentário