A proposta deste artigo é simples: aproveitar a mudança que as férias promovem na rotina e dar a devida atenção a nossa vida espiritual. Sabemos que muitos de nós passamos o ano todo procurando tem e espaço na agenda para dedicarmo-nos a oração e leitura da Bíblia, isto é, ter mais tempo para o Senhor.
As férias, mesmo que uma semana ou duas de descanso, são a melhor oportunidade anual para reprogramar nossas prioridades, rotinas, hábitos, colocar as coisas em dia, mudar costumes, enfim, um verdadeiro presente de Deus. E isto não funciona somente com as coisas que fazemos na área profissional, familiar ou pessoal. O âmbito espiritual não pode ser negligenciado neste período.
Como teremos mais tempo de folga, podemos fixar um tempo para rever nossa vida devocional, o que inclui oração e leitura e reflexão sobre porções da Bíblia – ou mesmo iniciar a leitura de toda a Bíblia – coisas que sempre queremos fazer, mas... nunca dá!
Quando fala em “fixar um tempo para nossa vida devocional”, isso não significa um tempo fixado rigidamente – tem que ser nessa hora, embora seja imperativo que este tempo seja diário. É possível fazer concessão de um período, cedo, a tarde – evite a noite, pois você pode estar cansado e saí já sabe o que acontecerá. Pessoalmente gosto de fixar esse tempo num horário determinado para não cair numa armadilha. Quando fazemos “muitas concessões” com o horário, assim que retornamos de férias as concessões são transformadas em “dispensas”, do tipo “ah, amanhã eu faço”. E aí você também já sabe o que acontece.
Outra dica importante é a da sede. Não vá com muita sede ao pote, pois você pode ficar enojado. Não queira orar uma hora todos os dias no início. Também não queira sair lendo um livro todo da Bíblia em uma só sentada, nem uma porção enorme de capítulos. Vá no seu ritmo e só aumente quando o seu próprio corpo pedir isso. Nesse caso, ser guiado pela emoção não é um bom negócio, como em outros muitos casos.
A proposta de um retiro espiritual é ser afastado da rotina diária dos trabalhos, estudos e dia-a-dia. Num retiro temos contato com coisas importantes que são negligenciadas por muitos de nós e aí ficamos encantados, queremos admiti-las em nossas vidas e os retiros funcionam como disparador dessas propostas que ficam ocultas em nossa mente e coração.
A proposta de transformar as férias em um retiro é exatamente essa: dar início, disparar o nosso desejo e hábito por coisa que queremos fazer mas que nunca nos programamos para elas. Assim, com a prática e exercício diárias de leitura da Bíblia – e por que não livros também? – e oração, quando retornarmos para as nossas obrigações, já incorporamos a vida devocional á nossa própria vida e aí é só uma questão de reajuste, de continuar fazendo aquilo que demos início, de encontrar um horário mais adequado. Mas o importante é o início.
Não perca esta oportunidade preciosa que temos. Afinal de contas, Deus mesmo criou um dia da semana para o homem dedicar ao descanso e a devoção espiritual a Ele. As férias são como uma renovação desse período, quando podemos readequar nossas vidas, refletindo sobre o que realmente faz sentido e tem valor. Faça isto!
Este espaço foi criado para discutir diferentes assuntos a partir da cosmovisão cristã. O que pretendo é o debate de ideias e o aprofundamento nas questões que interessam a Igreja de modo geral.
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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
A hora em que o crente perde
Ontem aconteceu uma coisa que chamou a minha atenção. Eu estava aconselhando alguém de meu convívio sobre um problema que a pessoa teve com seu vizinho. Para isso, citei um texto bíblico que eu mesmo uso como base para resolver problemas que, vez ou outra, eu também tenho. Nenhum vizinho é perfeito!
Mas percebi que ao citar um texto bíblico, aquela pessoa se mostrou avessa ao que eu disse, e alegou haver outro texto na Bíblia que ensina o contrário. Ora, me pareceu uma grande estupidez aquela conversa, uma vez que tentava resolver, ou pelo menos ajudar, o problema daquela pessoa. Somos da mesma igreja, temos a mesma fé!
Entendo que aconselhar é tentar mostrar algo que a pessoa aconselhada ainda não conseguiu ver, seja qual for o motivo. Uma vez que a pessoa consegue ver o que antes estava impedida de ver, pode tomar decisões com mais segurança, com maior clareza.
Isso também implica em conseguir reconhecer a vontade de Deus para cada caso. Todos nós queremos estar no centro da vontade de Deus. Afinal, Paulo disse que é a melhor coisa a fazer, pois a vontade de Deus “é boa, agradável e perfeita” (Romanos 12.2).
Mas o aconselhamento apontava para uma disputa em que eu não queria entrar. Calei-me, é lógico. E hoje, refletindo sobre o que aconteceu, lembrei-me de ensinos bíblicos que orientam a recuar – a palavra certa é perder – para ganhar.
O crente “perde” a sua vontade e o que ele ganha com isso é muito maior do que se fizesse aquilo que queria fazer. Duas evidências disso são o caso de Paulo e o de Jesus. Paulo disse: “E, na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como esterco, para que possa ganhar a Cristo”. (Filipenses 3.8)
Duas vezes Paulo fala em perda, e as compensa com uma vantagem maior, que é “a excelência do conhecimento de Cristo Jesus” e “ganhar a Cristo”.
Outro caso é o do próprio Senhor, que, chorando no jardim do Getsêmane, orou a famosa frase: “Meu Pai, se é possível passe de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres”. (Mateus 26.39) Jesus estava, na verdade, abrindo mão da sua vontade, “perdendo” a sua vontade, para ganhar a vontade do Pai.
A cruz é, aos olhos da maioria das pessoas, a perda maior. Ser crucificado era, naquela época, a maior vergonha a que um prisioneiro poderia ser submetido. Cristo sabia disso. Mas preferiu perder a sua honra para ganhar a que o Pai tinha para lhe dar.
Concluindo, perder para ganhar não é algo fácil. Nunca sabemos, ao certo, quando nem quanto ganharemos por perder nossa vontade em troca da vontade de Deus. Certamente é esse o motivo porque tão poucas pessoas conseguem entender a vontade de Deus. Mas ela continua sendo “boa, agradável e perfeita”.
Mas percebi que ao citar um texto bíblico, aquela pessoa se mostrou avessa ao que eu disse, e alegou haver outro texto na Bíblia que ensina o contrário. Ora, me pareceu uma grande estupidez aquela conversa, uma vez que tentava resolver, ou pelo menos ajudar, o problema daquela pessoa. Somos da mesma igreja, temos a mesma fé!
Entendo que aconselhar é tentar mostrar algo que a pessoa aconselhada ainda não conseguiu ver, seja qual for o motivo. Uma vez que a pessoa consegue ver o que antes estava impedida de ver, pode tomar decisões com mais segurança, com maior clareza.
Isso também implica em conseguir reconhecer a vontade de Deus para cada caso. Todos nós queremos estar no centro da vontade de Deus. Afinal, Paulo disse que é a melhor coisa a fazer, pois a vontade de Deus “é boa, agradável e perfeita” (Romanos 12.2).
Mas o aconselhamento apontava para uma disputa em que eu não queria entrar. Calei-me, é lógico. E hoje, refletindo sobre o que aconteceu, lembrei-me de ensinos bíblicos que orientam a recuar – a palavra certa é perder – para ganhar.
O crente “perde” a sua vontade e o que ele ganha com isso é muito maior do que se fizesse aquilo que queria fazer. Duas evidências disso são o caso de Paulo e o de Jesus. Paulo disse: “E, na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como esterco, para que possa ganhar a Cristo”. (Filipenses 3.8)
Duas vezes Paulo fala em perda, e as compensa com uma vantagem maior, que é “a excelência do conhecimento de Cristo Jesus” e “ganhar a Cristo”.
Outro caso é o do próprio Senhor, que, chorando no jardim do Getsêmane, orou a famosa frase: “Meu Pai, se é possível passe de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres”. (Mateus 26.39) Jesus estava, na verdade, abrindo mão da sua vontade, “perdendo” a sua vontade, para ganhar a vontade do Pai.
A cruz é, aos olhos da maioria das pessoas, a perda maior. Ser crucificado era, naquela época, a maior vergonha a que um prisioneiro poderia ser submetido. Cristo sabia disso. Mas preferiu perder a sua honra para ganhar a que o Pai tinha para lhe dar.
Concluindo, perder para ganhar não é algo fácil. Nunca sabemos, ao certo, quando nem quanto ganharemos por perder nossa vontade em troca da vontade de Deus. Certamente é esse o motivo porque tão poucas pessoas conseguem entender a vontade de Deus. Mas ela continua sendo “boa, agradável e perfeita”.
sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
A Igreja não tem problemas, que os têm somos nós
Quero tocar no tema novamente, mesmo – repito – não tendo procuração nem sendo advogado da Igreja (tratei de um aspecto desse tema no artigo A Semântica da Igreja).
Ao importar os modelos de igreja dos norte-americanos, trouxemos à reboque os problemas culturais e as expectativas dos gringos. Pragmatismo e sua sombra capitalista, Destino Manifesto, o geocentrismo que eles alimentam. Na década de 90, o próprio Carl Sagan em seu livro póstumo O mundo assombrado pelos demônios já apontava a ignorância daquele povo sobre tudo além de suas fronteiras e de seu umbigo.
Muito bem, aceitamos uma carroceria de Ferrari tendo um chassi e motor de Fusca. O sonho e o modelo eram deles, a realidade e a fraqueza eram nossas. As teologias, os modelos de crescimento de igreja, a alegada e incompreendida “Lei da semeadura” que faz enriquecer... tudo! Esse “kit felicidade”, num país pobre, mas emergente, com parte da pretensa liderança cristã ansiosa por poder e dinheiro, não poderia gerar outro tipo de gente e de igreja que essa anomalia que temos visto. Sim, o ajuntamento de crentes nos últimos anos não se configura a Igreja, mas desfigura-se em grupos sociais que precisam encontrar outro rótulo, porque não são crentes em Jesus. João disse que os que são de Cristo devem andar e viver como Ele andou.
Ouvi um pregador dizer: “Hoje vou ensinar o segredo para tirar os tesouros do céu e desfrutar aqui na terraaaaa!”. E “a platéia” aplaudiu! Aplaudiu por quê? Porque não eram cristãos. Se fossem, teriam reconhecido prontamente que a proposta do pregador é anticristã, é antibíblica, já que Jesus ensinou exatamente o contrário: “Não ajuntem aqui... mas no céu”.
A Igreja é a obra que Jesus disse que faria. Ela, a Igreja espiritual, que reúne cristãos, salvos, piedosos, esse organismo místico, invisível, não pode ter problemas, porque ela é a solução para o cansado e sobrecarregado. Igrejas não são denominações, não são programas. Mas as denominações, os moldes humanos, os programas de gestão e expansão, o “show gospel” e tudo o mais que fazemos e implantamos, isso sim tem problemas. Nós é que criamos e mantemos e nos afundamos em problemas, não a Igreja. O problema está em nós e em nossa ambição. A Igreja está bem, sempre esteve, e é com ela que o Senhor fará a sua cerimônia de núpcias; mas os “simpáticos” à Igreja, esses sim é que têm problemas.
Não podemos confundir o organismo espiritual com a instituição humana. Pior: não é justificável sair daqui para ali, pois enquanto estivermos nesse corpo, nada mudará radicalmente. Como Lutero, devemos querer reformar a igreja (instituição humana e temporal) de dentro para fora. Com todo o joio em seu meio, o Senhor ainda está no controle e não autoriza a poda da semente indesejável enquanto Ele mesmo não fizer isso (Mt 13.28-30). O ajuntamento humano é necessário (Hb 10.25) e, segundo Paulo, suportar os fracos é evidência da fraqueza dos fortes (Ef 4.2).
Ao importar os modelos de igreja dos norte-americanos, trouxemos à reboque os problemas culturais e as expectativas dos gringos. Pragmatismo e sua sombra capitalista, Destino Manifesto, o geocentrismo que eles alimentam. Na década de 90, o próprio Carl Sagan em seu livro póstumo O mundo assombrado pelos demônios já apontava a ignorância daquele povo sobre tudo além de suas fronteiras e de seu umbigo.
Muito bem, aceitamos uma carroceria de Ferrari tendo um chassi e motor de Fusca. O sonho e o modelo eram deles, a realidade e a fraqueza eram nossas. As teologias, os modelos de crescimento de igreja, a alegada e incompreendida “Lei da semeadura” que faz enriquecer... tudo! Esse “kit felicidade”, num país pobre, mas emergente, com parte da pretensa liderança cristã ansiosa por poder e dinheiro, não poderia gerar outro tipo de gente e de igreja que essa anomalia que temos visto. Sim, o ajuntamento de crentes nos últimos anos não se configura a Igreja, mas desfigura-se em grupos sociais que precisam encontrar outro rótulo, porque não são crentes em Jesus. João disse que os que são de Cristo devem andar e viver como Ele andou.
Ouvi um pregador dizer: “Hoje vou ensinar o segredo para tirar os tesouros do céu e desfrutar aqui na terraaaaa!”. E “a platéia” aplaudiu! Aplaudiu por quê? Porque não eram cristãos. Se fossem, teriam reconhecido prontamente que a proposta do pregador é anticristã, é antibíblica, já que Jesus ensinou exatamente o contrário: “Não ajuntem aqui... mas no céu”.
A Igreja é a obra que Jesus disse que faria. Ela, a Igreja espiritual, que reúne cristãos, salvos, piedosos, esse organismo místico, invisível, não pode ter problemas, porque ela é a solução para o cansado e sobrecarregado. Igrejas não são denominações, não são programas. Mas as denominações, os moldes humanos, os programas de gestão e expansão, o “show gospel” e tudo o mais que fazemos e implantamos, isso sim tem problemas. Nós é que criamos e mantemos e nos afundamos em problemas, não a Igreja. O problema está em nós e em nossa ambição. A Igreja está bem, sempre esteve, e é com ela que o Senhor fará a sua cerimônia de núpcias; mas os “simpáticos” à Igreja, esses sim é que têm problemas.
Não podemos confundir o organismo espiritual com a instituição humana. Pior: não é justificável sair daqui para ali, pois enquanto estivermos nesse corpo, nada mudará radicalmente. Como Lutero, devemos querer reformar a igreja (instituição humana e temporal) de dentro para fora. Com todo o joio em seu meio, o Senhor ainda está no controle e não autoriza a poda da semente indesejável enquanto Ele mesmo não fizer isso (Mt 13.28-30). O ajuntamento humano é necessário (Hb 10.25) e, segundo Paulo, suportar os fracos é evidência da fraqueza dos fortes (Ef 4.2).
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
Duvidar, uma atitude de fé
Este é o terceiro ― e deve ser o último ― artigo sobre o tema da dúvida. No primeiro texto o tema foi proposto e foi feita uma apologia “à boa dúvida”, a dúvida daqueles que perguntam por Deus; no segundo artigo fiz a ressalva esperada sobre a dúvida negativa, o aspecto da dúvida que nos afasta de Deus e nos leva a questionar a sua existência. Neste último texto espero demonstrar que a dúvida é elemento inerente à fé, é um dos passos da fé. A dúvida conduz à fé e é, até mesmo, esperada daqueles que querem e que esperam por um Deus manifesto.
Considere que o “não saber como” algo ocorre é um estado da dúvida. Jó é, talvez, o maior exemplo disso. Os primeiros capítulos de seu livro são registros sem fim de suas dúvidas. Ele não sabe o que se passa, tem perguntas diversas, questionamentos, inquietações. Jó é um ser em dúvida, um crente que duvida.
“Que esperança posso ter se já não tenho forças?” (6.11). “Mostrem-me onde errei” (6.24). “Como pode o homem mortal ser justo diante de Deus?” (9.2). “Como poderei discutir com ele?” (9.14). Essas e muitas outras são dúvidas que povoam o espírito do sofredor Jó e elas se amontoam até que no capítulo 38 Deus se digna responder socraticamente com mais perguntas.
As dúvidas de Jó são a própria encarnação ou a incrustação do elemento positivo da dúvida, que é a força que ela dá a quem possui, movendo-o na busca pela resposta. E essa resposta é Jesus. Quem pergunta por Deus tem a Jesus por resposta. Quem tem dúvidas sobre Deus recebe o Espírito de Cristo como resposta e é por ele convencido da sua realidade e “emanuelidade”.
Para encerrar, outro exemplo conhecido, o africano etíope, eunuco de Candace (At 8.26-39). Veja como duvida aquele homem: “Diga-me, por favor: de quem o profeta está falando? De si próprio ou de outro?” (v. 34). É a dúvida boa, aquela que move o homem à procura por respostas de Deus, pela iluminação que jamais será apagada. A resposta de Filipe descortinou um mundo de possibilidades ao eunuco, fez o seu quebra-cabeças messiânico fazer sentido a alguém alheio à toda a cultura hebraica. Agora, aquele homem duvidoso, era mais entendido sobre a fé messiânica do que qualquer rabino em Jerusalém.
É ou não é boa esta dúvida? Dúvida que inquieta e incomoda, que faz perguntas e quer mais que respostas, quer experiências; quer mais que jargões, quer a racionalidade da fé. “Ainda que ele me mate, nele esperarei!” ― Por que crer assim? Porque se sabe que mesmo morto Jesus nos trará à vida. Creio por que fui convencido, fui convencido porque entendi a oferta e entendi porque um dia, na minha dúvida, perguntei.
A fé faz sentido, mas só faz sentido para aquele que tem dúvida, que pergunta, que inquire. Para os outros ela é rotina, simples hábitos diários, obediência cega em determinados pontos geográficos. Para quem duvida ― e só para esses ― a fé traz respostas, permite apropriar-se da dádiva divina uma vez oferecida e da graça celestial cotidianamente proposta.
Considere que o “não saber como” algo ocorre é um estado da dúvida. Jó é, talvez, o maior exemplo disso. Os primeiros capítulos de seu livro são registros sem fim de suas dúvidas. Ele não sabe o que se passa, tem perguntas diversas, questionamentos, inquietações. Jó é um ser em dúvida, um crente que duvida.
“Que esperança posso ter se já não tenho forças?” (6.11). “Mostrem-me onde errei” (6.24). “Como pode o homem mortal ser justo diante de Deus?” (9.2). “Como poderei discutir com ele?” (9.14). Essas e muitas outras são dúvidas que povoam o espírito do sofredor Jó e elas se amontoam até que no capítulo 38 Deus se digna responder socraticamente com mais perguntas.
As dúvidas de Jó são a própria encarnação ou a incrustação do elemento positivo da dúvida, que é a força que ela dá a quem possui, movendo-o na busca pela resposta. E essa resposta é Jesus. Quem pergunta por Deus tem a Jesus por resposta. Quem tem dúvidas sobre Deus recebe o Espírito de Cristo como resposta e é por ele convencido da sua realidade e “emanuelidade”.
Para encerrar, outro exemplo conhecido, o africano etíope, eunuco de Candace (At 8.26-39). Veja como duvida aquele homem: “Diga-me, por favor: de quem o profeta está falando? De si próprio ou de outro?” (v. 34). É a dúvida boa, aquela que move o homem à procura por respostas de Deus, pela iluminação que jamais será apagada. A resposta de Filipe descortinou um mundo de possibilidades ao eunuco, fez o seu quebra-cabeças messiânico fazer sentido a alguém alheio à toda a cultura hebraica. Agora, aquele homem duvidoso, era mais entendido sobre a fé messiânica do que qualquer rabino em Jerusalém.
É ou não é boa esta dúvida? Dúvida que inquieta e incomoda, que faz perguntas e quer mais que respostas, quer experiências; quer mais que jargões, quer a racionalidade da fé. “Ainda que ele me mate, nele esperarei!” ― Por que crer assim? Porque se sabe que mesmo morto Jesus nos trará à vida. Creio por que fui convencido, fui convencido porque entendi a oferta e entendi porque um dia, na minha dúvida, perguntei.
A fé faz sentido, mas só faz sentido para aquele que tem dúvida, que pergunta, que inquire. Para os outros ela é rotina, simples hábitos diários, obediência cega em determinados pontos geográficos. Para quem duvida ― e só para esses ― a fé traz respostas, permite apropriar-se da dádiva divina uma vez oferecida e da graça celestial cotidianamente proposta.
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
O lado negativo da dúvida
Após ter escrito o primeiro artigo sobre a dúvida (Tenho dúvidas, graças a Deus) e destacado o seu lado positivo, senti-me incomodado com a interpretação que alguns leitores poderiam ter pelo fato de eu ter descrito a dúvida como algo bom e até mesmo uma possível ferramenta ou estratégia de Deus para aproximar de si algumas pessoas. Vou escrever mais sobre isso.
Neste texto, vou falar apenas e tão somente do modo como entendo a dúvida sendo um elemento contrário à fé, negativo, pernicioso e indesejável. É o contraponto ao primeiro artigo. Sei que historicamente a Igreja ― e porque não dizer todas as religiões ― lidou com a dúvida retratando-a como um estado ou sentimento que o crente deve repudiar, independente de sua profissão de fé neste ou naquele credo. A dúvida é radicalmente antagônica, contrária à fé e, portanto, ter dúvida equivale a ser um religioso de segunda categoria. Não é bem assim ― olha eu defendendo a dúvida novamente.
Como pude demonstrar no artigo anterior, a dúvida que deve ser rejeitada é aquela que me faz questionar a existência de Deus ou sua bondade, ou mesmo alguns de seus atributos. O aspecto negativo da dúvida é aquele que coloca o crente diante do seu Deus e o leva à fazer a pergunta ― Onde está o Senhor? Ou ― O Senhor se lembrará de mim? É o questionamento dos inimigos do salmista angustiado no Salmo 42.10: “Até os meus ossos sofrem agonia mortal quando os meus adversários zombam de mim, perguntando-me o tempo todo: "Onde está o seu Deus?”. Ou no mesmo salmo, v.3, quando o salmista está diante de grande sofrimento e é questionado sobre o socorro vindo de Deus: “Minhas lágrimas têm sido o meu alimento de dia e de noite, pois me perguntam o tempo todo: "Onde está o seu Deus?”.
O aspecto negativo da dúvida é, portanto, aquele que corrói e dissolve a segurança que temos na salvação de Deus e em seu socorro. Deus não se esquece de seus filhos, ainda que a própria mãe se esqueça de um deles (Is 49.15). É esta presença “emanuelica” que não pode ser questionada; sobre isto não pode haver qualquer dúvida, pois é contra este tipo de dúvida que a fé guerreia, a dúvida que afasta o homem do Deus o qual procura e depende, a dúvida que ergue uma barreira que impede a contemplação de Deus vindo em nosso auxílio.
As nossas ações de fé ― que não devem ser confundidas com insanidades de fé ― quando afetadas pela dúvida, são condenadas. Esse o motivo pelo qual Pedro foi repreendido pelo Senhor após ter caminhado um tanto sobre as águas; Pedro abriu mão da fé segura e permitiu a dúvida ocupar um espaço eu antes pertencia à fé (Mt 14.31). Por outro lado, as dúvidas que nos movem à procura por Deus, que sejam bem-vindas. Como no caso do eunuco da rainha Candace, que tateando procurava iluminação recebeu a resposta que apontou-lhe o Messias (At 8) aprovando e confirmando a fé salvadora.
Neste texto, vou falar apenas e tão somente do modo como entendo a dúvida sendo um elemento contrário à fé, negativo, pernicioso e indesejável. É o contraponto ao primeiro artigo. Sei que historicamente a Igreja ― e porque não dizer todas as religiões ― lidou com a dúvida retratando-a como um estado ou sentimento que o crente deve repudiar, independente de sua profissão de fé neste ou naquele credo. A dúvida é radicalmente antagônica, contrária à fé e, portanto, ter dúvida equivale a ser um religioso de segunda categoria. Não é bem assim ― olha eu defendendo a dúvida novamente.
Como pude demonstrar no artigo anterior, a dúvida que deve ser rejeitada é aquela que me faz questionar a existência de Deus ou sua bondade, ou mesmo alguns de seus atributos. O aspecto negativo da dúvida é aquele que coloca o crente diante do seu Deus e o leva à fazer a pergunta ― Onde está o Senhor? Ou ― O Senhor se lembrará de mim? É o questionamento dos inimigos do salmista angustiado no Salmo 42.10: “Até os meus ossos sofrem agonia mortal quando os meus adversários zombam de mim, perguntando-me o tempo todo: "Onde está o seu Deus?”. Ou no mesmo salmo, v.3, quando o salmista está diante de grande sofrimento e é questionado sobre o socorro vindo de Deus: “Minhas lágrimas têm sido o meu alimento de dia e de noite, pois me perguntam o tempo todo: "Onde está o seu Deus?”.
O aspecto negativo da dúvida é, portanto, aquele que corrói e dissolve a segurança que temos na salvação de Deus e em seu socorro. Deus não se esquece de seus filhos, ainda que a própria mãe se esqueça de um deles (Is 49.15). É esta presença “emanuelica” que não pode ser questionada; sobre isto não pode haver qualquer dúvida, pois é contra este tipo de dúvida que a fé guerreia, a dúvida que afasta o homem do Deus o qual procura e depende, a dúvida que ergue uma barreira que impede a contemplação de Deus vindo em nosso auxílio.
As nossas ações de fé ― que não devem ser confundidas com insanidades de fé ― quando afetadas pela dúvida, são condenadas. Esse o motivo pelo qual Pedro foi repreendido pelo Senhor após ter caminhado um tanto sobre as águas; Pedro abriu mão da fé segura e permitiu a dúvida ocupar um espaço eu antes pertencia à fé (Mt 14.31). Por outro lado, as dúvidas que nos movem à procura por Deus, que sejam bem-vindas. Como no caso do eunuco da rainha Candace, que tateando procurava iluminação recebeu a resposta que apontou-lhe o Messias (At 8) aprovando e confirmando a fé salvadora.
terça-feira, 14 de dezembro de 2010
Tenho dúvidas, graças a Deus
O papel da dúvida no ambiente da fé
A dúvida tem sido demonizada pelos cristãos desde que o movimento cristão sacudiu a religião do “olho-por-olho” e passou a demonstrar o que a fé era capaz de fazer na vida humana.
Dentre os textos mais conhecidos sobre a dúvida enquanto sentimento negativo, estão: Tiago, que disse: “... aquele que duvida é semelhante à onda do mar, levada e agitada pelo vento” (1.6). Paulo, que disse que “... aquele que tem dúvida é condenado se comer, porque não come com fé; e tudo o que não provém da fé é pecado” (Rm 14.23) e sobre Abraão que “... não duvidou nem foi incrédulo em relação à promessa de Deus, mas foi fortalecido em sua fé e deu glória a Deus, estando plenamente convencido de que ele era poderoso para cumprir o que havia prometido” (Rm 4.20,21).
Jesus também destacou o lado ruim da dúvida assegurando que “... se vocês tiverem fé e não duvidarem, poderão fazer não somente o que foi feito à figueira, mas também dizer a este monte: 'Levante-se e atire-se no mar', e assim será feito (Mt 21.21), além da condenação a Pedro: "Homem de pequena fé, por que você duvidou?" (Mt 14.31).
Há outras ocorrências nas quais a dúvida é posta frente a uma ação de fé, demonstrando que nelas, nas ações de fé, a dúvida é um impedimento e uma reprovação. Mas tome o texto de Paulo sobre os alimentos, onde diz que “... aquele que tem dúvida é condenado se comer, porque não come com fé”. Se comer com dúvida, isto é, se agir com dúvida.
Há uma condicionante “se” que explica quando a dúvida é prejudicial, visto que a ação decorrente da dúvida é perniciosa, por ser ação contra a própria consciência que aponta noutra direção.
É clássica a dúvida se o Senhor iria ou não livrar Israel dos midianitas por meio de Gideão (Jz 6). Igualmente conhecidas são as indagações de Abraão sobre os critérios de distinção entre justos e ímpios na destruição de Sodoma (Gn 18). E o que dizer de Tomé, que foi transformado num ícone da incredulidade? Ao ouvir seus amigos dizerem ter visto o Mestre, adiantou: "Se eu não vir as marcas dos pregos nas suas mãos, não colocar o meu dedo onde estavam os pregos e não puser a minha mão no seu lado, não crerei" (Jo 20.26).
O que vejo em comum na dúvida de Gideão, de Abraão e de Tomé é que eles não tomaram qualquer decisão, não se posicionaram e nada fizeram sem antes estarem seguros sobre o ponto da fé em questão. Gideão não foi para a guerra em dúvida; Abraão percebeu a grandeza da justiça de Deus na execução do juízo e Tomé não arriscou depositar sua fé em alguém que para ele era desconhecido: o Senhor ressurreto.
A dúvida por si, à parte de uma ação, apresenta-se como um estado saudável para o espírito, pois ela protege das decisões erradas, enganosas. O espírito que tem dúvida procura em Deus a sua clareza e, esta sim, uma vez manifesta, dissipa as trevas da insegurança para dar-lhe a iluminação da fé.
Condenadas devem ser as ações realizadas sob o domínio da dúvida, aquilo que fazemos insistindo contra a nossa própria consciência, forçando as nossas defesas, desprezando nossas convicções. A reprovação do pecado não está no comer, mas no comer com dúvida, pois “tudo o que não provém da fé é pecado” (Rm 14.23).
Tomé é lembrado quando o assunto é dúvida. Mas foi redimido por ser a expressão do cristão que não quer crer em qualquer coisa que lhe digam, em qualquer boato. Além da palavra de alguém, ele quer a experiência própria, pessoal, intransferível, que também será o seu porto seguro quando a sua fé for provada.
A dúvida tem sido demonizada pelos cristãos desde que o movimento cristão sacudiu a religião do “olho-por-olho” e passou a demonstrar o que a fé era capaz de fazer na vida humana.
Dentre os textos mais conhecidos sobre a dúvida enquanto sentimento negativo, estão: Tiago, que disse: “... aquele que duvida é semelhante à onda do mar, levada e agitada pelo vento” (1.6). Paulo, que disse que “... aquele que tem dúvida é condenado se comer, porque não come com fé; e tudo o que não provém da fé é pecado” (Rm 14.23) e sobre Abraão que “... não duvidou nem foi incrédulo em relação à promessa de Deus, mas foi fortalecido em sua fé e deu glória a Deus, estando plenamente convencido de que ele era poderoso para cumprir o que havia prometido” (Rm 4.20,21).
Jesus também destacou o lado ruim da dúvida assegurando que “... se vocês tiverem fé e não duvidarem, poderão fazer não somente o que foi feito à figueira, mas também dizer a este monte: 'Levante-se e atire-se no mar', e assim será feito (Mt 21.21), além da condenação a Pedro: "Homem de pequena fé, por que você duvidou?" (Mt 14.31).
Há outras ocorrências nas quais a dúvida é posta frente a uma ação de fé, demonstrando que nelas, nas ações de fé, a dúvida é um impedimento e uma reprovação. Mas tome o texto de Paulo sobre os alimentos, onde diz que “... aquele que tem dúvida é condenado se comer, porque não come com fé”. Se comer com dúvida, isto é, se agir com dúvida.
Há uma condicionante “se” que explica quando a dúvida é prejudicial, visto que a ação decorrente da dúvida é perniciosa, por ser ação contra a própria consciência que aponta noutra direção.
É clássica a dúvida se o Senhor iria ou não livrar Israel dos midianitas por meio de Gideão (Jz 6). Igualmente conhecidas são as indagações de Abraão sobre os critérios de distinção entre justos e ímpios na destruição de Sodoma (Gn 18). E o que dizer de Tomé, que foi transformado num ícone da incredulidade? Ao ouvir seus amigos dizerem ter visto o Mestre, adiantou: "Se eu não vir as marcas dos pregos nas suas mãos, não colocar o meu dedo onde estavam os pregos e não puser a minha mão no seu lado, não crerei" (Jo 20.26).
O que vejo em comum na dúvida de Gideão, de Abraão e de Tomé é que eles não tomaram qualquer decisão, não se posicionaram e nada fizeram sem antes estarem seguros sobre o ponto da fé em questão. Gideão não foi para a guerra em dúvida; Abraão percebeu a grandeza da justiça de Deus na execução do juízo e Tomé não arriscou depositar sua fé em alguém que para ele era desconhecido: o Senhor ressurreto.
A dúvida por si, à parte de uma ação, apresenta-se como um estado saudável para o espírito, pois ela protege das decisões erradas, enganosas. O espírito que tem dúvida procura em Deus a sua clareza e, esta sim, uma vez manifesta, dissipa as trevas da insegurança para dar-lhe a iluminação da fé.
Condenadas devem ser as ações realizadas sob o domínio da dúvida, aquilo que fazemos insistindo contra a nossa própria consciência, forçando as nossas defesas, desprezando nossas convicções. A reprovação do pecado não está no comer, mas no comer com dúvida, pois “tudo o que não provém da fé é pecado” (Rm 14.23).
Tomé é lembrado quando o assunto é dúvida. Mas foi redimido por ser a expressão do cristão que não quer crer em qualquer coisa que lhe digam, em qualquer boato. Além da palavra de alguém, ele quer a experiência própria, pessoal, intransferível, que também será o seu porto seguro quando a sua fé for provada.
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
O pastor que não tinha chamado para ser pastor
Certo pastor conta que a igreja a qual dirigia era o sonho de todo líder. Centenas de membros ativos, dizimistas fiéis, liderança coesa. O rol de membros crescia. Ele e sua família moravam bem e custeados pela igreja, ostentava bom salário e benefícios que o cargo lhe permitia. Sua família, esposa e filhos, todos firmes na fé em Jesus Cristo. Parecia um sonho!
No entanto, continuamente ele orava a Deus, reclamando que algo parecia estar fora de lugar. Ele expressava o vazio interior que o incomodava havia algum tempo. A igreja sequer desconfiava da agonia sentida por seu pastor.
Após meses orando a Deus e indagando-o sobre a carência espiritual que sentia, a tão esperada resposta veio. O Senhor respondeu a oração daquele pastor inquieto. Mas a resposta dada por Deus àquele homem causou uma surpresa tão grande que mudou o rumo de sua vida, de sua família e de seu ministério. A resposta dada pelo Senhor esclareceu-lhe a dúvida que tanto o incomodava e reorientou o sentido de seus esforços espirituais e ministeriais dali em diante. O Senhor respondeu a ele dizendo que “nunca o havia chamado para pastorear igrejas”. E mais, que “o chamado de Deus para a sua vida era para que pregasse o evangelho de modo itinerante, para que evangelizasse os pecadores, e não que se estabelecesse em uma igreja local”.
Isso causou um tremendo impacto na vida daquele homem que, em poucos dias, nomeou um substituto para a direção da igreja local e deixou o pastorado, transferindo-se para o campo missionário. Aquele pastor e sua família foram levar uma vida modesta em relação ao tempo à frente da igreja local, mas em compensação começaram um frutífero ministério evangelístico.
Quem não está sujeito a uma situação como esta? Para isto, é preciso entender biblicamente alguns pontos, como: como e quando Deus escolhe alguém? para quê você foi chamado? Quando devo começar meu ministério depois do chamado? qual a minha função no Corpo de Cristo? entre outros. A compreensão correta dessas questões é fundamental para manter-nos em pé diante do Senhor e da igreja quando a crise vier; e ela sempre vem. Por isso, antecipe-se à ela focando e alinhando-se ao que o Senhor espera de você para o ministério.
*Inscreva-se para o workshop sobre Vocação Ministerial, com o Pr. Magno Paganelli, em 19.01.2011. Ligue para (11) 3313-4545. Vagas limitadas.
No entanto, continuamente ele orava a Deus, reclamando que algo parecia estar fora de lugar. Ele expressava o vazio interior que o incomodava havia algum tempo. A igreja sequer desconfiava da agonia sentida por seu pastor.
Após meses orando a Deus e indagando-o sobre a carência espiritual que sentia, a tão esperada resposta veio. O Senhor respondeu a oração daquele pastor inquieto. Mas a resposta dada por Deus àquele homem causou uma surpresa tão grande que mudou o rumo de sua vida, de sua família e de seu ministério. A resposta dada pelo Senhor esclareceu-lhe a dúvida que tanto o incomodava e reorientou o sentido de seus esforços espirituais e ministeriais dali em diante. O Senhor respondeu a ele dizendo que “nunca o havia chamado para pastorear igrejas”. E mais, que “o chamado de Deus para a sua vida era para que pregasse o evangelho de modo itinerante, para que evangelizasse os pecadores, e não que se estabelecesse em uma igreja local”.
Isso causou um tremendo impacto na vida daquele homem que, em poucos dias, nomeou um substituto para a direção da igreja local e deixou o pastorado, transferindo-se para o campo missionário. Aquele pastor e sua família foram levar uma vida modesta em relação ao tempo à frente da igreja local, mas em compensação começaram um frutífero ministério evangelístico.
Quem não está sujeito a uma situação como esta? Para isto, é preciso entender biblicamente alguns pontos, como: como e quando Deus escolhe alguém? para quê você foi chamado? Quando devo começar meu ministério depois do chamado? qual a minha função no Corpo de Cristo? entre outros. A compreensão correta dessas questões é fundamental para manter-nos em pé diante do Senhor e da igreja quando a crise vier; e ela sempre vem. Por isso, antecipe-se à ela focando e alinhando-se ao que o Senhor espera de você para o ministério.
*Inscreva-se para o workshop sobre Vocação Ministerial, com o Pr. Magno Paganelli, em 19.01.2011. Ligue para (11) 3313-4545. Vagas limitadas.
sábado, 27 de novembro de 2010
A resposta
Todos caminhos levam a Deus
É o que diz a voz popular
Preciso dizer que por “deus” eu entendo
Ser tudo aquilo que o homem inventar.
O ecumenismo diz que deus é um só
Mudando apenas o nome que é dado
Aquele que crer nesse deus multinome
Também tenha certeza de estar engando.
Os orientais buscam há séculos
O equilíbrio do espírito com matéria
Precisam então integrar-se ao nirvana
O que não passa de grande pilhéria.
Os gregos e seus brilhantes filósofos
Meditam no que vem a ser a verdade
Nada alcançam além de galhofa
E de uma promíscua’irreal liberdade.
E por fim falemos dos santos judeus
Que se absteram do que era imundo
Só não perceberam ser Jesus o Cordeiro
Que veio tirar o pecado do mundo.
“João do evangelho” escreveu a verdade
As palavras do Mestre, a resposta obtida
Que um dia Jesus disse a todos os homens
“Eu Sou o caminho a verdade’a vida”.
É o que diz a voz popular
Preciso dizer que por “deus” eu entendo
Ser tudo aquilo que o homem inventar.
O ecumenismo diz que deus é um só
Mudando apenas o nome que é dado
Aquele que crer nesse deus multinome
Também tenha certeza de estar engando.
Os orientais buscam há séculos
O equilíbrio do espírito com matéria
Precisam então integrar-se ao nirvana
O que não passa de grande pilhéria.
Os gregos e seus brilhantes filósofos
Meditam no que vem a ser a verdade
Nada alcançam além de galhofa
E de uma promíscua’irreal liberdade.
E por fim falemos dos santos judeus
Que se absteram do que era imundo
Só não perceberam ser Jesus o Cordeiro
Que veio tirar o pecado do mundo.
“João do evangelho” escreveu a verdade
As palavras do Mestre, a resposta obtida
Que um dia Jesus disse a todos os homens
“Eu Sou o caminho a verdade’a vida”.
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
Consciência negra? Não, consciência do próximo.
Após uma semana de casados, minha esposa e eu fomos ao mercado para a memorável primeira compra de mantimentos. Morávamos numa casa próxima de onde fui criado. Passados alguns metros, entre um aceno e outro, um cumprimento e outro, ela comentou admirada: – Você só conhece negros?
De fato tenho muitos conhecidos dessa etnia ainda hoje. Nos damos muito bem.
Mas a despeito das diferenças étnicas – uma vez que somos todos “raça humana” e não raça isso ou raça aquilo – é no mínimo estranho evocar “consciência” de uma etnia que, segundo dados do IPEA, já em 2008 era maioria no Brasil.
Deve ficar claro que manifestações como essas de estabelecimento de feriados, passeatas, manifestações de qualquer natureza fazem sentido em favor de etnias que são minoritárias numa sociedade plural e democrática. Por que ninguém se levanta para convocar uma defesa dos bolivianos escravizados nas oficinas de costura no bairro do Bom Retiro, em S. Paulo? Eles sim são minoria e precisam ser defendidos. Ainda não foi assinada a abolição da escravatura imposta naquele bairro, na maioria por asiáticos que vez ou outra estampam páginas policiais nos jornais.
Estranho e sem sentido esse feriado em homenagem a Zumbi dos Palmares, que segundo os últimos estudos divulgados mês passado, até mesmo senhor de escravos foi, seguindo os modelos africanos de liderança tribal. Pararam centenas de cidades por conta de uma etnia que não consegue resolver os problemas internos de – curiosamente – preconceito! É notável e antigos os comentários entre caucasianos sobre o preconceito entre negros. Cresci vendo e ouvindo isso.
Ficaria envergonhado também se o mecanismo para meu ingresso numa universidade fosse a ascendência de minha família. Cotas para descendentes de italianos? Eu fingiria que não é comigo. Se dissesse que as cotas garantem a entrada de pobres e desfavorecidos, ainda assim é caso a ser pensado, pois até mesmo os mais simples quando se aplicam chegam onde muito abastado não põe o pé. Pergunte a muitos milionários que têm o quarto ano primário como grau máximo em sua formação. Mas critério étnico? Isso sim é segregação. E mais: totalitarismo, porque os negros já eram maioria em 2008.
É preciso ter consciência do próximo, e não de um em detrimento do outro. Quem sabe se os negros daqui não poderiam importar alguma coisa boa dos EUA e aprender mais com o presidente eleito dos EUA, que repudiou veementemente um apoio que o associava a uma pretensa representação étnica e disse publicamente rejeitar o apoio, fazendo-se candidato dos norte-americanos, e não dos negros daquele país?
http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/clipping/maio/negros-serao-maioria-no-pais-ja-em-2008-diz-ipea/
De fato tenho muitos conhecidos dessa etnia ainda hoje. Nos damos muito bem.
Mas a despeito das diferenças étnicas – uma vez que somos todos “raça humana” e não raça isso ou raça aquilo – é no mínimo estranho evocar “consciência” de uma etnia que, segundo dados do IPEA, já em 2008 era maioria no Brasil.
Deve ficar claro que manifestações como essas de estabelecimento de feriados, passeatas, manifestações de qualquer natureza fazem sentido em favor de etnias que são minoritárias numa sociedade plural e democrática. Por que ninguém se levanta para convocar uma defesa dos bolivianos escravizados nas oficinas de costura no bairro do Bom Retiro, em S. Paulo? Eles sim são minoria e precisam ser defendidos. Ainda não foi assinada a abolição da escravatura imposta naquele bairro, na maioria por asiáticos que vez ou outra estampam páginas policiais nos jornais.
Estranho e sem sentido esse feriado em homenagem a Zumbi dos Palmares, que segundo os últimos estudos divulgados mês passado, até mesmo senhor de escravos foi, seguindo os modelos africanos de liderança tribal. Pararam centenas de cidades por conta de uma etnia que não consegue resolver os problemas internos de – curiosamente – preconceito! É notável e antigos os comentários entre caucasianos sobre o preconceito entre negros. Cresci vendo e ouvindo isso.
Ficaria envergonhado também se o mecanismo para meu ingresso numa universidade fosse a ascendência de minha família. Cotas para descendentes de italianos? Eu fingiria que não é comigo. Se dissesse que as cotas garantem a entrada de pobres e desfavorecidos, ainda assim é caso a ser pensado, pois até mesmo os mais simples quando se aplicam chegam onde muito abastado não põe o pé. Pergunte a muitos milionários que têm o quarto ano primário como grau máximo em sua formação. Mas critério étnico? Isso sim é segregação. E mais: totalitarismo, porque os negros já eram maioria em 2008.
É preciso ter consciência do próximo, e não de um em detrimento do outro. Quem sabe se os negros daqui não poderiam importar alguma coisa boa dos EUA e aprender mais com o presidente eleito dos EUA, que repudiou veementemente um apoio que o associava a uma pretensa representação étnica e disse publicamente rejeitar o apoio, fazendo-se candidato dos norte-americanos, e não dos negros daquele país?
http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/clipping/maio/negros-serao-maioria-no-pais-ja-em-2008-diz-ipea/
terça-feira, 16 de novembro de 2010
Há vagas para apologistas
Foram abertas novas vagas para a função de apologista na Igreja brasileira. É desejável conhecimento bíblico mínimo, uma vez que a causa será combater aqueles que nunca leram a Bíblia uma só vez, mas insistem em ensiná-la e pregá-la. Aprecia-se conhecimento teológico básico, pelos mesmos motivos.
Parece piada, mas a situação é tal. Cada vez menos a Igreja “evangélica” conhece o evangelho, e como diz o adágio, “em terra de cego, quem tem olho é rei”.
Uma pesquisa recente realizada pela Sociedade Bíblica Ibero-americana no Brasil revelou que 50,68% dos pastores brasileiros nunca leram a Bíblia. Pergunto: o que estão ensinando, então? Respondo: – Nada, quando não o pior: ensinos antibíblicos e, portanto, anticristãos.
Ouvi, pessoalmente, um pastor esbravejando no púlpito que naquela noite ele “ensinaria o segredo para retirar os tesouros do céu para desfrutarmos aqui na terra”. Erro crasso, uma vez que Jesus ensinou exatamente o oposto: “Não acumulem para vocês tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem destroem, e onde os ladrões arrombam e furtam. Mas acumulem para vocês tesouros nos céus, onde a traça e a ferrugem não destroem, e onde os ladrões não arrombam nem furtam” (Mt 6.19,20).
Outro pastor disse para a igreja que “naquele ano [2009] eles escreveriam Atos 29”, dando a entender que a Igreja faria evangelismo e missões. Em seguida disse para os irmãos abrirem suas Bíblias em Atos 29. Prontamente os membros e alguns pastores no púlpito puseram-se a procurar tal capítulo. O pastor perguntou: “Quem encontrou Atos 29 diga ‘Glória a Deus’”. O coro se fez ouvir. Achando estranho, ele insistiu: “Quem encontrou Atos 29 levante a mão”. Até alguns pastores levantaram suas mãos.
Na floresta amazônica, ao contrário do original bíblico em Gênesis 12, “deus [com “d” minúsculo mesmo] levantou um patriarca”. Cansado de ser simplesmente progenitor de apóstolos, o aero-profeta autodenominou-se patriarca, em pé de igualdade a Abraão. Será preciso atualizar a canção infantil que diz “Pai Abraão, tem muitos filhos, muitos filhos ele tem...” para “Pai Abraão, tem concorrente, um concorrente ele tem...”.
Aqui em São Paulo, o “pastor zero-cal” cobra R$ 160,00 a inscrição para ordenação ao ministério, mais a taxa de R$ 255 para a credencial (R$ 415,00). Só para a sede foram ordenados mais de 1500 obreiros (faturamento de mais de R$ 622.500,00). Quem ganha salário mínimo não pode mais servir ao Senhor como obreiro. E mais: agora, pastor presidente de campo que não inscrever sua esposa para a arrecadação – digo ordenação – ao pastorado, perde o campo. Não adianta ter 50 anos de bons serviços ao Reino: se a esposa negar-se a consagração, está tudo acabado – e por “justa” causa.
Socorro, alguém defenda a doutrina e o bom senso na instituição, já que a defesa da Igreja é atribuição de Jesus.
Parece piada, mas a situação é tal. Cada vez menos a Igreja “evangélica” conhece o evangelho, e como diz o adágio, “em terra de cego, quem tem olho é rei”.
Uma pesquisa recente realizada pela Sociedade Bíblica Ibero-americana no Brasil revelou que 50,68% dos pastores brasileiros nunca leram a Bíblia. Pergunto: o que estão ensinando, então? Respondo: – Nada, quando não o pior: ensinos antibíblicos e, portanto, anticristãos.
Ouvi, pessoalmente, um pastor esbravejando no púlpito que naquela noite ele “ensinaria o segredo para retirar os tesouros do céu para desfrutarmos aqui na terra”. Erro crasso, uma vez que Jesus ensinou exatamente o oposto: “Não acumulem para vocês tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem destroem, e onde os ladrões arrombam e furtam. Mas acumulem para vocês tesouros nos céus, onde a traça e a ferrugem não destroem, e onde os ladrões não arrombam nem furtam” (Mt 6.19,20).
Outro pastor disse para a igreja que “naquele ano [2009] eles escreveriam Atos 29”, dando a entender que a Igreja faria evangelismo e missões. Em seguida disse para os irmãos abrirem suas Bíblias em Atos 29. Prontamente os membros e alguns pastores no púlpito puseram-se a procurar tal capítulo. O pastor perguntou: “Quem encontrou Atos 29 diga ‘Glória a Deus’”. O coro se fez ouvir. Achando estranho, ele insistiu: “Quem encontrou Atos 29 levante a mão”. Até alguns pastores levantaram suas mãos.
Na floresta amazônica, ao contrário do original bíblico em Gênesis 12, “deus [com “d” minúsculo mesmo] levantou um patriarca”. Cansado de ser simplesmente progenitor de apóstolos, o aero-profeta autodenominou-se patriarca, em pé de igualdade a Abraão. Será preciso atualizar a canção infantil que diz “Pai Abraão, tem muitos filhos, muitos filhos ele tem...” para “Pai Abraão, tem concorrente, um concorrente ele tem...”.
Aqui em São Paulo, o “pastor zero-cal” cobra R$ 160,00 a inscrição para ordenação ao ministério, mais a taxa de R$ 255 para a credencial (R$ 415,00). Só para a sede foram ordenados mais de 1500 obreiros (faturamento de mais de R$ 622.500,00). Quem ganha salário mínimo não pode mais servir ao Senhor como obreiro. E mais: agora, pastor presidente de campo que não inscrever sua esposa para a arrecadação – digo ordenação – ao pastorado, perde o campo. Não adianta ter 50 anos de bons serviços ao Reino: se a esposa negar-se a consagração, está tudo acabado – e por “justa” causa.
Socorro, alguém defenda a doutrina e o bom senso na instituição, já que a defesa da Igreja é atribuição de Jesus.
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Ecumenismo e diálogo inter-religioso
A questão do desenvolvimento de uma cultura do ecumenismo e do estabelecimento do diálogo inter-religioso esbarra em alguns entraves. Dentre os mais conhecidos está a alegada ameaça à centralidade de Cristo. Esse ponto é, já, questionado no âmbito do ecumenismo entre grupos ditos cristãos; que dirá quando avança sobre campos onde a adoração e culto se prestam a deuses “outros”!
A pergunta que se coloca, ao menos nos lábios cristãos mais ortodoxos é: – É possível o diálogo? E se sim, em que base? Esse é o ponto discutido de forma segura em A Reconciliação Cósmica e o Diálogo Inter-religioso, do Prof. Julio Zabatiero, a partir de reflexões em Colossenses 1.15-20.
O texto aos colossenses, um hino cristológico, provavelmente incorporado por Paulo a sua epístola, descreve a obra redentora do Salvador por meio de uma metáfora cuja utilização e aplicação tem sido muito escassa nos meios cristãos. A reconciliação promovida pela redenção se dá pelo “ministério da reconciliação” e pela “palavra da reconciliação” (2Co 5.18,19), a qual se torna a expressão da “vocação do povo de Deus (...) em Cristo”. Cristo reconcilia em si todas as coisas, pessoas, poderes e a própria criação. Portanto, uma igreja cristocêntrica há de observar “nele” a sua própria vocação e cumpri-la, e isso pelo exercício da reconciliação.
O primeiro ponto estudado pelo autor trata da estrutura do hino, o qual está dividido em duas estrofes. A primeira (vv. 15-17) apontando para a ação de Deus em Cristo na criação e a segunda (vv. 18-20) na reconciliação. E o que Deus reconcilia em Cristo? Todas as coisas: toda a criação; todas as coisas nos céus e na terra; todas as coisas que foram criadas por Ele, pois somente nele tudo subsiste; e isso com a finalidade de que tudo tenha a supremacia, uma vez que em Cristo habita toda a plenitude a fim de que ele reconcilie todas as coisas. São destaques que o próprio texto dá por meio dessas palavras e que o autor enfatiza a fim de fundar o seu argumento, qual seja, que a redenção de Cristo é ampla ou deve ser estendida àqueles ou àquilo que não está tão próximo.
Definidos os (amplos) limites do alcance da redenção (1), o autor passa a destacar a mensagem do hino. As lentes da exegese latino-americana o fazem ver (justificadamente) o “caráter político da linguagem do hino”, o que tem sido notado também por autores “norte-atlânticos”. Esses termos de natureza política estão “vinculados à linguagem da diplomacia e da ideologia do Império Romano”. E que termos são esses? Exatamente os termos que equivocadamente são tomados pelas interpretações dualísticas, espiritualísticas e místicas ao longo do tempo: principados e potestades. Pela lente da exegese em questão, a relação dos termos está ligada aos poderes terrenos e celestiais, respectivamente, ao contrário da comum interpretação que os liga a qualquer entidade de natureza espiritual ou demoníaca.
É nessa base onde o autor entende ser possível a percepção do viés inter-religioso do discurso paulino no hino. A humanidade está dividida em compartimentos étnicos, culturais, políticos e religiosos e cabe à Igreja a promoção da reconciliação dessa humanidade dividida, separada. E, parafraseando Moisés, no anúncio da reconciliação a igreja dirá que “quem a está enviando para esta tarefa?”. A resposta é Jesus Cristo.
A Igreja é (e aqui entra outra metáfora) o Corpo, cuja cabeça é Cristo, meio pelo qual a reconciliação é (e somente dessa forma) realizada. Que outro personagem, que outro tema, que outra ideologia, que outro elemento Deus propôs para que a reconciliação pudesse ser efetivada? Nenhum outro nome debaixo do céu. No passado “a própria Lei de Deus se tornou o principal obstáculo à unidade humana”, mas na plenitude dos tempos a “supremacia de Cristo na nova criação” que restaura a unidade humana é a resposta de Deus àqueles que questionam “a fidelidade de Deus ao seu projeto original”, e isso se dá em tons escatológicos. É “uma nova humanidade em Cristo Jesus, criada ‘segundo Deus na justiça e na santidade que vem da verdade’ (Ef 4.24)”. É preciso, no entanto, destacar aqui o termo humanidade, uma vez que essa humanidade é o fruto da reconciliação promovida em Cristo. A reconciliação em Cristo não cria uma nova “religião mundial, mas uma humanidade re-unificada” (p. 6). Esse é o ponto que satisfaz e responde a pergunta do segundo parágrafo, sobre em que bases se dará o diálogo.
A partir da reconciliação da humanidade ou da criação em Cristo Jesus de uma nova humanidade, se dará a proposta de reconciliação dos poderes. Pessoas formam o poder e não o contrário. É preciso, portanto, tratar as causas (pessoas) para curar as consequências (as estruturas). E aqui temos, nova e inevitavelmente, as lentes da exegese latino-americana, quiçá a quarta lente da história da teologia cristã. (2)
Para explicar o modo como são alcançados os poderes que necessitam reconciliação, o Prof. Zabatieiro aponta a necessidade de despir as cascas (camadas, na linguagem dele) que equivocam a compreensão do que seja o objeto, de fato, da reconciliação. Quer Deus reconciliar a Igreja ou as denominações? Quer Deus reconciliar a Cristandade? Ou a reconciliação se dará no aspecto da espiritualidade? O que é reconciliado na ação redentora de Cristo?
Esse tem sido um “fator inevitável de tensão” no diálogo inter-religioso: a afirmação do senhorio único de Jesus Cristo. Mas essa é a base das declarações paulinas, já que o projeto de Deus contempla esse, e não outro, modelo. Assim, o primeiro poder apontado pelo autor é o eclesiástico. É urgente a necessidade de invalidar a afirmação “de que fora da igreja não há salvação”. “As igrejas são apenas instrumentos do reinado de Deus, e não o próprio reinado! O alvo e o critério da missão são o crescimento do senhorio de Cristo, e não o da igreja”. Nada mais claro e explícito do que essas palavras. Elas sintetizam uma verdade que as declarações eclesiológicas ocultam por tanto tempo e lança luz à compreensão da originalidade do projeto de Deus já na criação (tema subjacente ao hino).
A segunda casca a “ser removida é a da identificação do Cristo com a Cristandade”, entendendo cristandade como a instituição eclesiástica aliada aos poderes políticos. Nada disso! E que evidências temos para fazer tal afirmação? Cornélio (At 10.4,31), que não está na Igreja mas é incluído (reconciliado) pelo próprio Deus, por seu ato e vontade soberana, na Igreja. E com base em que faz isso? Na premissa de que a Igreja é constituída por pessoas e não por modelos e processos, e na sua ciência de que o que as pessoas são ligadas ao Corpo pela fé e o que fazem (suas obras) mantêm-nas unidas ao Corpo e justificam sua permanência ali.
Terceiro, afaste-se da idéia de que a espiritualidade e a ética ocidentais são os paradigmas autoritativos e mantenedores da reconciliação. Nada do que foi elaborado ou desenvolvido pelas culturas (ainda que por séculos ou milênios) pode ser a chancela da manifestação interventiva do Cristo. Certamente a nossa cultura e a nossa ética necessitam ser redimidas. O autor acrescenta, ainda, o nível da reconciliação ecológica, e deve ter em mente o âmbito da criação (reflexo de sua teologia calvinista... e isso não é crítica). Aqui temos novamente uma questão de cidadania. A responsabilidade sobre a reconciliação da criação é tarefa cristã, porque o cristão entende a intervenção divina no processo. No entanto, essa compreensão também se dá no não-cristão, porque Deus escreveu em seu coração a lei moral. Assim, quando ele promove a manutenção da ecologia e da sustentabilidade, o faz por ser igualmente obra da criação de Deus, e assim o faz como cidadão. A sociabilização, o respeito, a moralidade, o desejo pelo sagrado, todos são aspectos inerentes ao ser humano enquanto cidadão.
Nesse ponto, o autor indica a consequência da ação reconciliadora em Cristo, que é a evangelização. Teríamos excluído a evangelização por meio dos quatro atos listados anteriormente? De forma alguma, somente não o fizemos por vias do que ele chama “evangelização imposta”, mas “evangelização inculturada” (essas expressões são de Stephen B. Bevans & Roger P. Schrorder, in Constants in context). Battista Soares trata largamente desse modelo evangelístico em seu livro A igreja cidadã (3), onde apresenta projetos de melhoria da qualidade de vida em comunidades carentes, notadamente no Maranhão. Por meio de projetos de captação de recursos para implementação de culturas auto sustentáveis, a Igreja melhora a qualidade de vida das pessoas e a apresentação do evangelho toma novo impulso e nova aparência e atrativos, para não falar da eficácia na sua transmissão.
Esse tema também é encontrado em Lutero, quando trata da tríplice diaconia. A diaconia elementar, vivida na família e no trabalho remunerado; a diaconia da Igreja, realizada no treinamento e aprendizado da fé para unidade fraternal cristã e em sentido criacional e, por último, a diaconia política, voltada à comunidade civil (no combate à miséria, fome, carência da população).
Em outras palavras, é nesse sentido que o texto de Julio Zabatiero caminha. “Do ponto de vista do diálogo inter-religioso, a paz de Cristo exige uma comunidade plenamente cônscia da sua identidade transformada e transformadora”. Em que direção? Ao estabelecimento, não de uma “igreja mundial”, como disse em outro trecho, mas do Reino de Deus, que comporta, dentre outras coisas, a própria Igreja, que é uma das ferramentas a serem usadas no estabelecimento daquele.
Concluindo, parafraseando um texto meu usado em outro contexto, se a igreja fizesse “o dever de casa”, muitos planos do Governo (p. ex. o Fome Zero) teriam sido implantados pela Igreja para ter apoio do Governo, e não o contrário. É sobre isso que Lutero falava, foi isso o que Calvino elaborou magistralmente, e esse também é o sentido que o diálogo inter-religioso, apoiado na reconciliação que há em Cristo pretende fazer-se ouvir. Essa é, oportunamente, a indicação dada por Tiago sobre a verdadeira religião, aquela que cuida do próximo em sentido fraternal, “despido dos uniformes e cosméticos denominacionais” (para usar uma antiga expressão de Caio Fábio) que visam mais a auto-promoção que o amor em sentido missionário.
(1) Na verdade, a ordem de interpretação do texto não se presta a essa afirmação que faço, mas tais “limites” estão visíveis em todo o texto do hino. O texto está dividido em estrofes e não em unidades que indicam alcance, linguagem, mensagem etc.
(2) Sendo a primeira a lente judaica, no nascedouro, as lentes filosóficas quando o Cristianismo vai para a Europa, as lentes pragmáticas quando chega aos Estados Unidos e as lentes político-sociológicas ou mesmo libertacionistas na América Latina.
(3) Soarez, Batistta. A Igreja cidadã. São Paulo: Arte Editorial, 2007.
A pergunta que se coloca, ao menos nos lábios cristãos mais ortodoxos é: – É possível o diálogo? E se sim, em que base? Esse é o ponto discutido de forma segura em A Reconciliação Cósmica e o Diálogo Inter-religioso, do Prof. Julio Zabatiero, a partir de reflexões em Colossenses 1.15-20.
O texto aos colossenses, um hino cristológico, provavelmente incorporado por Paulo a sua epístola, descreve a obra redentora do Salvador por meio de uma metáfora cuja utilização e aplicação tem sido muito escassa nos meios cristãos. A reconciliação promovida pela redenção se dá pelo “ministério da reconciliação” e pela “palavra da reconciliação” (2Co 5.18,19), a qual se torna a expressão da “vocação do povo de Deus (...) em Cristo”. Cristo reconcilia em si todas as coisas, pessoas, poderes e a própria criação. Portanto, uma igreja cristocêntrica há de observar “nele” a sua própria vocação e cumpri-la, e isso pelo exercício da reconciliação.
O primeiro ponto estudado pelo autor trata da estrutura do hino, o qual está dividido em duas estrofes. A primeira (vv. 15-17) apontando para a ação de Deus em Cristo na criação e a segunda (vv. 18-20) na reconciliação. E o que Deus reconcilia em Cristo? Todas as coisas: toda a criação; todas as coisas nos céus e na terra; todas as coisas que foram criadas por Ele, pois somente nele tudo subsiste; e isso com a finalidade de que tudo tenha a supremacia, uma vez que em Cristo habita toda a plenitude a fim de que ele reconcilie todas as coisas. São destaques que o próprio texto dá por meio dessas palavras e que o autor enfatiza a fim de fundar o seu argumento, qual seja, que a redenção de Cristo é ampla ou deve ser estendida àqueles ou àquilo que não está tão próximo.
Definidos os (amplos) limites do alcance da redenção (1), o autor passa a destacar a mensagem do hino. As lentes da exegese latino-americana o fazem ver (justificadamente) o “caráter político da linguagem do hino”, o que tem sido notado também por autores “norte-atlânticos”. Esses termos de natureza política estão “vinculados à linguagem da diplomacia e da ideologia do Império Romano”. E que termos são esses? Exatamente os termos que equivocadamente são tomados pelas interpretações dualísticas, espiritualísticas e místicas ao longo do tempo: principados e potestades. Pela lente da exegese em questão, a relação dos termos está ligada aos poderes terrenos e celestiais, respectivamente, ao contrário da comum interpretação que os liga a qualquer entidade de natureza espiritual ou demoníaca.
É nessa base onde o autor entende ser possível a percepção do viés inter-religioso do discurso paulino no hino. A humanidade está dividida em compartimentos étnicos, culturais, políticos e religiosos e cabe à Igreja a promoção da reconciliação dessa humanidade dividida, separada. E, parafraseando Moisés, no anúncio da reconciliação a igreja dirá que “quem a está enviando para esta tarefa?”. A resposta é Jesus Cristo.
A Igreja é (e aqui entra outra metáfora) o Corpo, cuja cabeça é Cristo, meio pelo qual a reconciliação é (e somente dessa forma) realizada. Que outro personagem, que outro tema, que outra ideologia, que outro elemento Deus propôs para que a reconciliação pudesse ser efetivada? Nenhum outro nome debaixo do céu. No passado “a própria Lei de Deus se tornou o principal obstáculo à unidade humana”, mas na plenitude dos tempos a “supremacia de Cristo na nova criação” que restaura a unidade humana é a resposta de Deus àqueles que questionam “a fidelidade de Deus ao seu projeto original”, e isso se dá em tons escatológicos. É “uma nova humanidade em Cristo Jesus, criada ‘segundo Deus na justiça e na santidade que vem da verdade’ (Ef 4.24)”. É preciso, no entanto, destacar aqui o termo humanidade, uma vez que essa humanidade é o fruto da reconciliação promovida em Cristo. A reconciliação em Cristo não cria uma nova “religião mundial, mas uma humanidade re-unificada” (p. 6). Esse é o ponto que satisfaz e responde a pergunta do segundo parágrafo, sobre em que bases se dará o diálogo.
A partir da reconciliação da humanidade ou da criação em Cristo Jesus de uma nova humanidade, se dará a proposta de reconciliação dos poderes. Pessoas formam o poder e não o contrário. É preciso, portanto, tratar as causas (pessoas) para curar as consequências (as estruturas). E aqui temos, nova e inevitavelmente, as lentes da exegese latino-americana, quiçá a quarta lente da história da teologia cristã. (2)
Para explicar o modo como são alcançados os poderes que necessitam reconciliação, o Prof. Zabatieiro aponta a necessidade de despir as cascas (camadas, na linguagem dele) que equivocam a compreensão do que seja o objeto, de fato, da reconciliação. Quer Deus reconciliar a Igreja ou as denominações? Quer Deus reconciliar a Cristandade? Ou a reconciliação se dará no aspecto da espiritualidade? O que é reconciliado na ação redentora de Cristo?
Esse tem sido um “fator inevitável de tensão” no diálogo inter-religioso: a afirmação do senhorio único de Jesus Cristo. Mas essa é a base das declarações paulinas, já que o projeto de Deus contempla esse, e não outro, modelo. Assim, o primeiro poder apontado pelo autor é o eclesiástico. É urgente a necessidade de invalidar a afirmação “de que fora da igreja não há salvação”. “As igrejas são apenas instrumentos do reinado de Deus, e não o próprio reinado! O alvo e o critério da missão são o crescimento do senhorio de Cristo, e não o da igreja”. Nada mais claro e explícito do que essas palavras. Elas sintetizam uma verdade que as declarações eclesiológicas ocultam por tanto tempo e lança luz à compreensão da originalidade do projeto de Deus já na criação (tema subjacente ao hino).
A segunda casca a “ser removida é a da identificação do Cristo com a Cristandade”, entendendo cristandade como a instituição eclesiástica aliada aos poderes políticos. Nada disso! E que evidências temos para fazer tal afirmação? Cornélio (At 10.4,31), que não está na Igreja mas é incluído (reconciliado) pelo próprio Deus, por seu ato e vontade soberana, na Igreja. E com base em que faz isso? Na premissa de que a Igreja é constituída por pessoas e não por modelos e processos, e na sua ciência de que o que as pessoas são ligadas ao Corpo pela fé e o que fazem (suas obras) mantêm-nas unidas ao Corpo e justificam sua permanência ali.
Terceiro, afaste-se da idéia de que a espiritualidade e a ética ocidentais são os paradigmas autoritativos e mantenedores da reconciliação. Nada do que foi elaborado ou desenvolvido pelas culturas (ainda que por séculos ou milênios) pode ser a chancela da manifestação interventiva do Cristo. Certamente a nossa cultura e a nossa ética necessitam ser redimidas. O autor acrescenta, ainda, o nível da reconciliação ecológica, e deve ter em mente o âmbito da criação (reflexo de sua teologia calvinista... e isso não é crítica). Aqui temos novamente uma questão de cidadania. A responsabilidade sobre a reconciliação da criação é tarefa cristã, porque o cristão entende a intervenção divina no processo. No entanto, essa compreensão também se dá no não-cristão, porque Deus escreveu em seu coração a lei moral. Assim, quando ele promove a manutenção da ecologia e da sustentabilidade, o faz por ser igualmente obra da criação de Deus, e assim o faz como cidadão. A sociabilização, o respeito, a moralidade, o desejo pelo sagrado, todos são aspectos inerentes ao ser humano enquanto cidadão.
Nesse ponto, o autor indica a consequência da ação reconciliadora em Cristo, que é a evangelização. Teríamos excluído a evangelização por meio dos quatro atos listados anteriormente? De forma alguma, somente não o fizemos por vias do que ele chama “evangelização imposta”, mas “evangelização inculturada” (essas expressões são de Stephen B. Bevans & Roger P. Schrorder, in Constants in context). Battista Soares trata largamente desse modelo evangelístico em seu livro A igreja cidadã (3), onde apresenta projetos de melhoria da qualidade de vida em comunidades carentes, notadamente no Maranhão. Por meio de projetos de captação de recursos para implementação de culturas auto sustentáveis, a Igreja melhora a qualidade de vida das pessoas e a apresentação do evangelho toma novo impulso e nova aparência e atrativos, para não falar da eficácia na sua transmissão.
Esse tema também é encontrado em Lutero, quando trata da tríplice diaconia. A diaconia elementar, vivida na família e no trabalho remunerado; a diaconia da Igreja, realizada no treinamento e aprendizado da fé para unidade fraternal cristã e em sentido criacional e, por último, a diaconia política, voltada à comunidade civil (no combate à miséria, fome, carência da população).
Em outras palavras, é nesse sentido que o texto de Julio Zabatiero caminha. “Do ponto de vista do diálogo inter-religioso, a paz de Cristo exige uma comunidade plenamente cônscia da sua identidade transformada e transformadora”. Em que direção? Ao estabelecimento, não de uma “igreja mundial”, como disse em outro trecho, mas do Reino de Deus, que comporta, dentre outras coisas, a própria Igreja, que é uma das ferramentas a serem usadas no estabelecimento daquele.
Concluindo, parafraseando um texto meu usado em outro contexto, se a igreja fizesse “o dever de casa”, muitos planos do Governo (p. ex. o Fome Zero) teriam sido implantados pela Igreja para ter apoio do Governo, e não o contrário. É sobre isso que Lutero falava, foi isso o que Calvino elaborou magistralmente, e esse também é o sentido que o diálogo inter-religioso, apoiado na reconciliação que há em Cristo pretende fazer-se ouvir. Essa é, oportunamente, a indicação dada por Tiago sobre a verdadeira religião, aquela que cuida do próximo em sentido fraternal, “despido dos uniformes e cosméticos denominacionais” (para usar uma antiga expressão de Caio Fábio) que visam mais a auto-promoção que o amor em sentido missionário.
(1) Na verdade, a ordem de interpretação do texto não se presta a essa afirmação que faço, mas tais “limites” estão visíveis em todo o texto do hino. O texto está dividido em estrofes e não em unidades que indicam alcance, linguagem, mensagem etc.
(2) Sendo a primeira a lente judaica, no nascedouro, as lentes filosóficas quando o Cristianismo vai para a Europa, as lentes pragmáticas quando chega aos Estados Unidos e as lentes político-sociológicas ou mesmo libertacionistas na América Latina.
(3) Soarez, Batistta. A Igreja cidadã. São Paulo: Arte Editorial, 2007.
sábado, 6 de novembro de 2010
Não quero candelabro
Existe uma expressão bíblica chamada “sombra” (Hb 8.5; 10.1). Como a própria palavra indica, uma sombra não é a realidade, mas uma projeção, uma parca figura daquilo que é real, verdadeiro: “A Lei traz apenas uma sombra dos benefícios que hão de vir, e não a sua realidade. Por isso ela nunca consegue, mediante os mesmos sacrifícios repetidos ano após ano, aperfeiçoar os que se aproximam para adorar.” (Hb 10.1, NVI).
A palavra sombra é usada para apontar todos os aspectos da lei, dos sacrifícios e toda a tipologia do Antigo Testamento, que teria cumprimento futuro na pessoa, vida e obra de Jesus Cristo. No passado, Deus não removia pecados, mas deixava-os ali, cobertos (Rm 3.25), até que o sacrifício perfeito fosse realizado. Por isso, quando João Batista vê a Jesus, diz que ele é “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29). Os cordeiros usados nos sacrifícios antigos eram sombras do Cordeiro real, perfeito, que removeu definitivamente os pecados. Assim, não sacrificamos mais animais, pois o sacrifício perfeito já foi feito. Preferimos o real à sombra.
Há centenas de figuras tipológicas no Antigo Testamento cujo cumprimento está em Cristo. Eram todas sombras. Veja a tampa da arca, chamada propiciatório (Ex 25.21a), ou seja, um lugar onde o relacionamento entre Deus e o homem se tornava “propício” (Hb 9.11-15; comp. “trono da graça” em Hb 4.14-16 e “lugar de comunhão” em Ex 25.21-22). Mas a tampa da arca, o propiciatório, era sombra do que viria. Por isso João e Paulo referem-se a Cristo como nossa “propiciação” (1Jo 2.2; 4.10; Rm 3.25), pois somente por sua obra o nosso relacionamento com Deus se tornou favorável, propício. A sombra, então, deve desaparecer, já que o verdadeiro significado foi revelado. Preferimos o real à sombra.
Poderia mencionar muitas figuras do Antigo Testamento que eram simplesmente símbolos da realidade, sombra dos benefícios que haviam de vir. O candelabro, por exemplo, provia iluminação dentro do tabernáculo, já que não havia incidência de luz externa em seu interior. Isso significa que a compreensão das coisas de Deus não vem pela iluminação intelectual ou racional, mas pela iluminação dada pelo Espírito de Deus e nada mais. O próprio Jesus disse ser a verdadeira luz (“Eu sou a luz do mundo”. Jo 8.12). Quando Jesus se manifestou ao mundo, não foi preciso usar representações dele, sombras dele, pois o real já estava entre nós e compreendemos o que a sombra queria dizer veladamente.
Por isso, não entendo quando uma Igreja é enfeitada com elementos judaicos, ultrapassados e impróprios para aqueles que dizem já ter a revelação completa de Cristo. Não faz qualquer sentido usar arcas, candelabros, querubins, shofares, celebrar as festas judaicas, nem toda essa parafernália gospel que só deveria ser usada por aqueles que ainda não conhecem a Cristo.
Adotar qualquer desses objetos apenas indica que o real, o verdadeiro, ainda não está ali; por isso é preciso colocar algo no lugar onde o real ainda será manifestado. Adotar qualquer desses objetos ou cerimônias dá a seguinte mensagem: ainda estamos aguardando a revelação daquele que essas coisas representam. Ainda teremos o Cordeiro, ainda seremos propícios a Deus, ainda teremos luz, pois estamos em trevas, nas sombras dos benefícios que hão de vir.
Paulo escreveu a carta aos gálatas para esse fim: dizer que não deveriam retornar aos símbolos do passado, já que o real havia sido manifestado (“Maldito todo aquele que não persiste em praticar todas as coisas escritas no livro da Lei”, Gl 3.1-10). E o autor da carta aos hebreus também afirma que a sombra “... nunca consegue, mediante os mesmos sacrifícios repetidos ano após ano, aperfeiçoar os que se aproximam para adorar.” (Hb 10.1). No esforço por melhorar a aparência do culto, muitas igrejas têm dado testemunho de não conhecerem o que estão adorando.
A palavra sombra é usada para apontar todos os aspectos da lei, dos sacrifícios e toda a tipologia do Antigo Testamento, que teria cumprimento futuro na pessoa, vida e obra de Jesus Cristo. No passado, Deus não removia pecados, mas deixava-os ali, cobertos (Rm 3.25), até que o sacrifício perfeito fosse realizado. Por isso, quando João Batista vê a Jesus, diz que ele é “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29). Os cordeiros usados nos sacrifícios antigos eram sombras do Cordeiro real, perfeito, que removeu definitivamente os pecados. Assim, não sacrificamos mais animais, pois o sacrifício perfeito já foi feito. Preferimos o real à sombra.
Há centenas de figuras tipológicas no Antigo Testamento cujo cumprimento está em Cristo. Eram todas sombras. Veja a tampa da arca, chamada propiciatório (Ex 25.21a), ou seja, um lugar onde o relacionamento entre Deus e o homem se tornava “propício” (Hb 9.11-15; comp. “trono da graça” em Hb 4.14-16 e “lugar de comunhão” em Ex 25.21-22). Mas a tampa da arca, o propiciatório, era sombra do que viria. Por isso João e Paulo referem-se a Cristo como nossa “propiciação” (1Jo 2.2; 4.10; Rm 3.25), pois somente por sua obra o nosso relacionamento com Deus se tornou favorável, propício. A sombra, então, deve desaparecer, já que o verdadeiro significado foi revelado. Preferimos o real à sombra.
Poderia mencionar muitas figuras do Antigo Testamento que eram simplesmente símbolos da realidade, sombra dos benefícios que haviam de vir. O candelabro, por exemplo, provia iluminação dentro do tabernáculo, já que não havia incidência de luz externa em seu interior. Isso significa que a compreensão das coisas de Deus não vem pela iluminação intelectual ou racional, mas pela iluminação dada pelo Espírito de Deus e nada mais. O próprio Jesus disse ser a verdadeira luz (“Eu sou a luz do mundo”. Jo 8.12). Quando Jesus se manifestou ao mundo, não foi preciso usar representações dele, sombras dele, pois o real já estava entre nós e compreendemos o que a sombra queria dizer veladamente.
Por isso, não entendo quando uma Igreja é enfeitada com elementos judaicos, ultrapassados e impróprios para aqueles que dizem já ter a revelação completa de Cristo. Não faz qualquer sentido usar arcas, candelabros, querubins, shofares, celebrar as festas judaicas, nem toda essa parafernália gospel que só deveria ser usada por aqueles que ainda não conhecem a Cristo.
Adotar qualquer desses objetos apenas indica que o real, o verdadeiro, ainda não está ali; por isso é preciso colocar algo no lugar onde o real ainda será manifestado. Adotar qualquer desses objetos ou cerimônias dá a seguinte mensagem: ainda estamos aguardando a revelação daquele que essas coisas representam. Ainda teremos o Cordeiro, ainda seremos propícios a Deus, ainda teremos luz, pois estamos em trevas, nas sombras dos benefícios que hão de vir.
Paulo escreveu a carta aos gálatas para esse fim: dizer que não deveriam retornar aos símbolos do passado, já que o real havia sido manifestado (“Maldito todo aquele que não persiste em praticar todas as coisas escritas no livro da Lei”, Gl 3.1-10). E o autor da carta aos hebreus também afirma que a sombra “... nunca consegue, mediante os mesmos sacrifícios repetidos ano após ano, aperfeiçoar os que se aproximam para adorar.” (Hb 10.1). No esforço por melhorar a aparência do culto, muitas igrejas têm dado testemunho de não conhecerem o que estão adorando.
* Para aprofundar-se no tema, sugiro a leitura do meu livro Onde Estava o Cristo. http://www.arteeditorial.com.br/catalogo/shopexd.asp?id=1
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Evangelho e cultura
A história da Igreja descreve algumas questões que, vez ou outra, retornam a pauta do dia, revelando que alguns pontos não são facilmente equacionados em relação a outros. Que Cristo é o único caminho para o Pai é ponto passivo, não se discute mais. Mas e a questão trazida pelo Rev. Julio Zabatiero em Evangelho e Cultura, da relação entre evangelho, cultura e contextualização tem surpreendido alguns cristãos ao longo dos séculos, notadamente aqueles envolvidos com a pregação do evangelho e com as missões.
O autor parte das definições de cultura e evangelho, pontuando cada uma delas de maneira clara e universalmente aceitas (embora não exclusivas), e indicando que nosso interesse, como fazedores de teologia, é “posicionar-se a respeito das relações entre Evangelho e Cultura” como tarefa fundamental. Mesmo tendo conceituado cada elemento da discussão, vemos, ainda, uma advertência de que “o Evangelho não é uma cultura, mas um conjunto de formas simbólicas originalmente construído através de um processo histórico em que Deus se revela à humanidade, no âmbito da sociedade e cultura judaicas”.
O destaque dado ao fato da existência de uma revelação de Deus à humanidade é notável, já que indica que, como revelação, (a) poderia ter sido manifestada a qualquer outra cultura ou sociedade e (b) não é – como de fato está explícito – uma cultura, como fruto da elaboração ou como produto essencialmente humano. Assim, “o Evangelho pode se encarnar em cada cultura na qual é anunciado, de modo que sua transcendência permaneça juntamente com a sua imersão nessa cultura específica” (grifo acrescentado).
O terceiro ponto, após trabalhar os conceitos de Evangelho e de cultura, é a questão da forma ou do modo como se dá a contextualização. E introduz o tema ou a discussão já antecipando que, “na medida em que a Palavra de Deus se encarna na igreja, o evangelho toma forma na cultura”, ou seja, a manutenção da genuinidade do evangelho (em oposição a uma pregação dogmática) promove a imediata ambientação da igreja à cultura na qual está inserida e a transformação da própria cultura – o que é, em última análise, uma resposta positiva a uma das funções do evangelho, que é a transformação do indivíduo. Esta é a avaliação de Mendonça e Velasques, sobre o fator que norteava as missões da corrente calvinista.
A outra corrente, de natureza “avivalista”, lidava com a conversão individual, “pela experiência pessoal e emotiva”. Nesta, notava-se a ruptura com o ambiente do indivíduo agora convertido, mas as mudanças eram notáveis “através da adoção de novos padrões de conduta”.
Concluindo, ambos os modelos frutificaram na cultura brasileira. E o mesmo, com pequenas ressalvas, poderia ser dito da inserção do Evangelho em outras culturas. William Carey (1762-1834), em missão pela Índia, decidiu que não pregaria contra o islamismo, mas que aproximaria dos indianos por meio do evangelho, mas isso decidiu apenas após anos sem colher um só fruto de seu trabalho no campo missionário.
Dessa forma, entendo ser necessária a contextualização, protegendo os princípios inegociáveis e negociando os parâmetros permitidos pelas Escrituras. O caminho deve permanecer sendo o mesmo anunciado pelo Senhor. Mas o modo como vamos andar por este caminho é determinado, ao que parece, pela topografia de cada cultura.
Citando Enio Müller, “a verdade não é um objeto do qual eu me aproprio, mas um caminho no qual eu ando”. E se ando por um caminho, é natural ver paisagens distintas a cada espaço percorrido.
Diante do protestantismo de missão em terras brasileiras, os brasileiros, muitos deles, não aceitaram a pregação norte-americana – e este é o questionamento que me ocorre diante do texto proposto. Mas será que foram os missionários dos EUA que abriram a porta para a importação da cultura daquele país? Sim, porque até então os padrões sociais eram determinados pelas matrizes católicas européias/portuguesas. Se foram esses missionários os responsáveis pela vinda dos hábitos e costumes norte-americanos e os brasileiros não aceitaram a fé que anunciavam, mas apenas a cultura – e esta de natureza questionável nas últimas décadas – são eles, em última análise, que podem ser responsabilizados pela atual situação na qual o brasileiro recebe como “sagrado” tudo o que desce ao hemisfério sul. Isto é apenas uma reflexão.
O autor parte das definições de cultura e evangelho, pontuando cada uma delas de maneira clara e universalmente aceitas (embora não exclusivas), e indicando que nosso interesse, como fazedores de teologia, é “posicionar-se a respeito das relações entre Evangelho e Cultura” como tarefa fundamental. Mesmo tendo conceituado cada elemento da discussão, vemos, ainda, uma advertência de que “o Evangelho não é uma cultura, mas um conjunto de formas simbólicas originalmente construído através de um processo histórico em que Deus se revela à humanidade, no âmbito da sociedade e cultura judaicas”.
O destaque dado ao fato da existência de uma revelação de Deus à humanidade é notável, já que indica que, como revelação, (a) poderia ter sido manifestada a qualquer outra cultura ou sociedade e (b) não é – como de fato está explícito – uma cultura, como fruto da elaboração ou como produto essencialmente humano. Assim, “o Evangelho pode se encarnar em cada cultura na qual é anunciado, de modo que sua transcendência permaneça juntamente com a sua imersão nessa cultura específica” (grifo acrescentado).
O terceiro ponto, após trabalhar os conceitos de Evangelho e de cultura, é a questão da forma ou do modo como se dá a contextualização. E introduz o tema ou a discussão já antecipando que, “na medida em que a Palavra de Deus se encarna na igreja, o evangelho toma forma na cultura”, ou seja, a manutenção da genuinidade do evangelho (em oposição a uma pregação dogmática) promove a imediata ambientação da igreja à cultura na qual está inserida e a transformação da própria cultura – o que é, em última análise, uma resposta positiva a uma das funções do evangelho, que é a transformação do indivíduo. Esta é a avaliação de Mendonça e Velasques, sobre o fator que norteava as missões da corrente calvinista.
A outra corrente, de natureza “avivalista”, lidava com a conversão individual, “pela experiência pessoal e emotiva”. Nesta, notava-se a ruptura com o ambiente do indivíduo agora convertido, mas as mudanças eram notáveis “através da adoção de novos padrões de conduta”.
Concluindo, ambos os modelos frutificaram na cultura brasileira. E o mesmo, com pequenas ressalvas, poderia ser dito da inserção do Evangelho em outras culturas. William Carey (1762-1834), em missão pela Índia, decidiu que não pregaria contra o islamismo, mas que aproximaria dos indianos por meio do evangelho, mas isso decidiu apenas após anos sem colher um só fruto de seu trabalho no campo missionário.
Dessa forma, entendo ser necessária a contextualização, protegendo os princípios inegociáveis e negociando os parâmetros permitidos pelas Escrituras. O caminho deve permanecer sendo o mesmo anunciado pelo Senhor. Mas o modo como vamos andar por este caminho é determinado, ao que parece, pela topografia de cada cultura.
Citando Enio Müller, “a verdade não é um objeto do qual eu me aproprio, mas um caminho no qual eu ando”. E se ando por um caminho, é natural ver paisagens distintas a cada espaço percorrido.
Diante do protestantismo de missão em terras brasileiras, os brasileiros, muitos deles, não aceitaram a pregação norte-americana – e este é o questionamento que me ocorre diante do texto proposto. Mas será que foram os missionários dos EUA que abriram a porta para a importação da cultura daquele país? Sim, porque até então os padrões sociais eram determinados pelas matrizes católicas européias/portuguesas. Se foram esses missionários os responsáveis pela vinda dos hábitos e costumes norte-americanos e os brasileiros não aceitaram a fé que anunciavam, mas apenas a cultura – e esta de natureza questionável nas últimas décadas – são eles, em última análise, que podem ser responsabilizados pela atual situação na qual o brasileiro recebe como “sagrado” tudo o que desce ao hemisfério sul. Isto é apenas uma reflexão.
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
Espiritualidades contemporâneas
A fim de indicar a possibilidade de diferentes conceitos de espiritualidade discutidos hoje, dentro de cenários culturais e religiosos diversos, há dois textos recomendados pela academia. Um, de Ana Maria Tepedino, Espiritualidade: relações e conexões, parte do ponto de vista feminino e resvala na convicção de que questões milenares do âmbito social, de gênero (masculino x feminino), políticas e até mesmo econômicas podem ser resolvidas com a correta compreensão e formulação de uma nova sensibilidade espiritual, um ecocentrismo em vez de egocentrismo e a consequente promoção da saúde humana, social e, evidentemente, espiritual.
O outro texto, do Rev. Ricardo Barbosa de Souza, Espiritualidade e Espiritualidades, trilha um caminho bem diverso. Busca as raízes históricas da perda humana da espiritualidade, perda esta ocorrida após uma saudável explosão do cultivo desse aspecto da vida humana (e da própria relação com Deus e consigo), nos primeiros séculos da era cristã, passando pelo período monástico, medieval, escolástico e Reforma, desembocando no Iluminismo, quando a racionalidade sufocou a procura pelo significado espiritual do homem.
Mas esse “sufocamento” não passou desapercebido. O espírito humano “mandou a conta” por meio de uma sociedade sem referencias seguros e duradouros, emocionalmente doentia e desconectada da realidade mais ampla da vida, na qual são contemplados os elementos sociais, pessoais e transcendentais da experiência humana.
Identifico-me mais com a segunda proposta, pois diferente do primeiro texto, não aborta o olhar para do ambiente religioso – ao contrário – olha por meio da história e de seus desdobramentos sociais, mas usa as lentes da espiritualidade bíblica. O primeiro texto, apesar de ser apresentado por meio de um discurso que abusa das expressões e modismos mais atuais, lança um olhar para o alto sem ter lançado um fundamento para isso. Parece estar revestido de uma “aura” pós-moderna, com preocupações características do século 21, mas não trabalha com a herança recebida, e que nos legou a atual situação e configuração das coisas.
Assim, entendo que uma espiritualidade que faça sentido no século 21, não pode desconsiderar o homem, a compreensão que tem de si, mas partindo de um referencial adequado, qual seja, Deus. E que Deus ou que perspectiva de Deus? A partir da revelação contida na Palavra de Deus, na teologia cristã. A teologia cristã e sua ascendência (os textos bíblicos) lidam com aspectos emocionais e racionais promovendo a restauração do equilíbrio necessário para a formação de uma pessoa.
Essa pessoa, decorrente do exercício da espiritualidade que procura na teologia cristã o seu tutor, resultará num cidadão que vê a Deus, o próximo e o mundo no qual todos vivem e convivem harmoniosamente, como o ambiente social onde deverá ocorrer a manifestação da sua própria espiritualidade. Explico melhor. A reflexão teológica que parte da perspectiva cristã irá formar cidadãos para o mundo. Não irá formar cristãos para atuarem em seus guetos. A reflexão teológica cristã aponta para o valor da espiritualidade em função não de si mesmo, do isolamento, do sectarismo e alienação. Antes, leva a ver o mundo de Deus, com esse Deus presente, com as demais criações e criaturas de Deus.
Essa pessoa cuidará de promover a pacificação, terá um olhar ecológico, verá a Deus no próximo e a necessidade de estender a ele a misericórdia (que em última instância é proveniente de Deus). É nisso que se distingue a espiritualidade cristã. Ela não vê nas estruturas, nas demandas atuais e nos problemas pontuais o sinal de advertência. Ela faz uma leitura mais ampla e eleva o pensamento humano para, por meio dessa altitude, poder ver melhor e mais distante.
Para mim, espiritualidade é a prática de uma vida inserida na dinâmica social, que considera ou que leia o mundo e suas demandas com os olhos da Palavra de Deus. É ter a mente de Cristo e pensar os pensamentos dele nas tomadas de decisões em questões pessoais, religiosas, profissionais, sociais e políticas. É viver no mundo sem tirar os olhos de Deus. É como expressou o autor da carta aos Hebreus: “Olhando para Jesus, o autor e consumador da fé”, ou como orou Josafá, “Os nossos olhos estão postos em ti”. Josafá, rei, responsável pela segurança de Israel, estava cercado por três exércitos inimigos, mas mesmo assim não deixou de considerar a possibilidade da atuação e intervenção de Deus em sua causa militar.
Conseguir manter, nas mais diversas situações, a confiança em Deus, a presença diante dele e o equilíbrio que decorre essa postura é o objeto da espiritualidade, sua razão de ser e o seu objetivo.
quarta-feira, 28 de julho de 2010
Espiritualidade e saúde
O texto do Dr. Leo Pessini, A espiritualidade interpretada pelas ciências e pela saúde (2007), é uma importante e rica fonte de citações de renomados pesquisadores da área da saúde a respeito da secular discussão sobre religião e ciência. Aqui reside um aspecto que diferencia o enfoque do artigo, pois à questão “religião e ciência” (ou religião versus ciência), o autor acrescenta espiritualidade e saúde, elementos contemporâneos neste debate.
É conhecida a “batalha” travada entre os dois campos do conhecimento humano. Teólogos e cientistas acusam-se, refutam-se, rejeitam-se, argumentam contra e desdenham-se mutuamente, reivindicando legitimidade para o seu próprio discurso, para as suas próprias teses e teorias, para as suas cosmovisões.
Dentre muitos esclarecimentos que o artigo traz, é interessante destacar a distinção feita entre religião e espiritualidade. A religião é um sistema e é institucionalizada e a espiritualidade pode ser experimentada até mesmo por um ateu. Outro destaque importante para fixar a posição de cada área do conhecimento é a apontada pelo físico Marcelo Gleiser, de que a ciência ocupa-se em dar respostas para coisas do âmbito da natureza, enquanto que a religião vai lidar com o mundo da fé e da realidade sobrenatural.
De fato, baseado no que se pode observar no cenário religioso/espiritual (para não citar aqui diversas passagens das Escrituras do Novo Testamento) não é coerente desprezar as ocorrências que testemunham no sentido de que algo verificável (base do método científico) tem ocorrido. Os relatos de cura nos Evangelhos, os testemunhos ouvidos em nossos dias, todos são elementos palpáveis de que há uma relação umbilical entre os aspectos físicos e espirituais no ser humano.
O estudo etimológico do Antigo Testamento, por exemplo, revela que não há uma palavra no idioma hebraico para corpo. Não há distinção entre os âmbitos físico-químico e espirituais do ser. Alma ou alma vivente é o modo como os autores daquela porção das Escrituras referem-se ao homem. Uma unidade indivisível, um sistema fechado onde existem causas e efeitos próprios. Somente com os gregos veio o conceito de corpo físico e corpo imaterial, o que, mesmo assim, não elimina o vínculo e as reações correspondentes que podem ocorrer quando há desequilíbrio em algum desses “corpos” e o efeito que um provoca no outro.
Um conhecido meu, psiquiatra, confidenciou-me que já tratou casos de pacientes com dificuldades em sentir-se perdoado. Embora tivesse sido assistido em algumas seções de aconselhamento e terapia, somente a ministração de drogas que atuam em elementos químicos específicos nos neurotransmissores pode afastar a sensação de rejeição da divindade.
Poderia, aqui, dar o testemunho da minha própria conversão. Após mais de seis anos na dependência de drogas como cocaína e maconha, uma oração feita por uma cristã levou-me a fé libertadora. Na linguagem do artigo, houve cura somática por uma ação no âmbito da espiritualidade. Não fiquei internado num centro de reabilitação ou dependente de drogas lícitas para controlar qualquer síndrome de abstinência, não tive reações colaterais de qualquer natureza; simplesmente fui liberto, curado do vício, da dependência na qual vivia há anos por meio de um reequilíbrio entre o material e o espiritual. Quem não conhece alguém que teve a mesma experiência? É observável, só não se sabe como, do ponto de vista médico.
Assim, fazem bem as ciências médicas e mesmo as corporações experimentar um aprofundamento nas questões espirituais. Como disse David Sloan, até mesmo o ateu tem condições de experimentar a espiritualidade em suas mais diversas relações, seja com a família, com as amizades, com a natureza, com as artes.
É evidente que, como cristãos, indicaríamos a espiritualidade baseada ou a partir dos pressupostos bíblicos. Mas como o tema é a espiritualidade (e não espiritualidade cristã, somente) que pode aliar-se à ciência médica na busca por cura e melhoria na qualidade de vida das pessoas, não podemos dogmatizar e condicionar a legitimidade dessa experiência ao raio de ação da instituição religiosa cristã. Até porque seria uma franca heresia entender que o cristianismo detém os direitos de uso do exercício da espiritualidade ou que tenha patenteado as doses e a fórmula para a cura que advém da experiência mística.
É conhecida a “batalha” travada entre os dois campos do conhecimento humano. Teólogos e cientistas acusam-se, refutam-se, rejeitam-se, argumentam contra e desdenham-se mutuamente, reivindicando legitimidade para o seu próprio discurso, para as suas próprias teses e teorias, para as suas cosmovisões.
Dentre muitos esclarecimentos que o artigo traz, é interessante destacar a distinção feita entre religião e espiritualidade. A religião é um sistema e é institucionalizada e a espiritualidade pode ser experimentada até mesmo por um ateu. Outro destaque importante para fixar a posição de cada área do conhecimento é a apontada pelo físico Marcelo Gleiser, de que a ciência ocupa-se em dar respostas para coisas do âmbito da natureza, enquanto que a religião vai lidar com o mundo da fé e da realidade sobrenatural.
De fato, baseado no que se pode observar no cenário religioso/espiritual (para não citar aqui diversas passagens das Escrituras do Novo Testamento) não é coerente desprezar as ocorrências que testemunham no sentido de que algo verificável (base do método científico) tem ocorrido. Os relatos de cura nos Evangelhos, os testemunhos ouvidos em nossos dias, todos são elementos palpáveis de que há uma relação umbilical entre os aspectos físicos e espirituais no ser humano.
O estudo etimológico do Antigo Testamento, por exemplo, revela que não há uma palavra no idioma hebraico para corpo. Não há distinção entre os âmbitos físico-químico e espirituais do ser. Alma ou alma vivente é o modo como os autores daquela porção das Escrituras referem-se ao homem. Uma unidade indivisível, um sistema fechado onde existem causas e efeitos próprios. Somente com os gregos veio o conceito de corpo físico e corpo imaterial, o que, mesmo assim, não elimina o vínculo e as reações correspondentes que podem ocorrer quando há desequilíbrio em algum desses “corpos” e o efeito que um provoca no outro.
Um conhecido meu, psiquiatra, confidenciou-me que já tratou casos de pacientes com dificuldades em sentir-se perdoado. Embora tivesse sido assistido em algumas seções de aconselhamento e terapia, somente a ministração de drogas que atuam em elementos químicos específicos nos neurotransmissores pode afastar a sensação de rejeição da divindade.
Poderia, aqui, dar o testemunho da minha própria conversão. Após mais de seis anos na dependência de drogas como cocaína e maconha, uma oração feita por uma cristã levou-me a fé libertadora. Na linguagem do artigo, houve cura somática por uma ação no âmbito da espiritualidade. Não fiquei internado num centro de reabilitação ou dependente de drogas lícitas para controlar qualquer síndrome de abstinência, não tive reações colaterais de qualquer natureza; simplesmente fui liberto, curado do vício, da dependência na qual vivia há anos por meio de um reequilíbrio entre o material e o espiritual. Quem não conhece alguém que teve a mesma experiência? É observável, só não se sabe como, do ponto de vista médico.
Assim, fazem bem as ciências médicas e mesmo as corporações experimentar um aprofundamento nas questões espirituais. Como disse David Sloan, até mesmo o ateu tem condições de experimentar a espiritualidade em suas mais diversas relações, seja com a família, com as amizades, com a natureza, com as artes.
É evidente que, como cristãos, indicaríamos a espiritualidade baseada ou a partir dos pressupostos bíblicos. Mas como o tema é a espiritualidade (e não espiritualidade cristã, somente) que pode aliar-se à ciência médica na busca por cura e melhoria na qualidade de vida das pessoas, não podemos dogmatizar e condicionar a legitimidade dessa experiência ao raio de ação da instituição religiosa cristã. Até porque seria uma franca heresia entender que o cristianismo detém os direitos de uso do exercício da espiritualidade ou que tenha patenteado as doses e a fórmula para a cura que advém da experiência mística.
terça-feira, 20 de julho de 2010
Espiritualidade em busca de sujeitos
Quero comentar dois textos que podem ser chamados de síntese – cada um na sua respectiva área – do espírito distinto que rege ocidentais e orientais. O comércio do sagrado, do Pr. Dionísio Oliveira da Silva, é o retrato puro e simples da pragmática norte-americana. Embora não reflita com cem por cento de acerto a espiritualidade brasileira nem latino americana (ainda que parte dela), traz consigo a marca do sentimento popular, das ânsias e desejos, tanto dos americanos do sul quanto dos do norte.
Em determinados pontos do texto podemos identificar claramente o espírito malandro, o jeitinho, tão característicos do nosso povo, e também a própria idolatria tão característica de uma nação colonizada por católicos e amamentada por africanos, com suas práticas rituais. A caricatura que o autor faz da identificação da divindade com a mercadoria (no mercado) é a mais pura representação do rumo (e por que não dizer da práxis) que hoje algumas igrejas tem experimentado. Há quem vá dizer que isso é reflexo direto da importação da teologia dos EUA. Outros, por sua vez, dirão que é a precária cena social no nosso próprio continente que demanda esse tipo de busca, uma vez constatada a falência do Estado para dirimir questões que são (ou seriam) da sua esfera de responsabilidade. Ambos tem a sua parcela de razão.
No entanto, não podemos negar a culpa, por assim dizer, do sujeito, do negociante. As teologias e as espiritualidades não nascem por si; são elaboradas por alguém em função da sua relação com o outro (e muitas vezes até com a divindade!). Assim, o sujeito da ação é, ao menos em última análise, o responsável por esta demanda. Não houvesse interesse, busca, resposta, esse discurso materialista, pragmático, mercantilista não teria ecoado e se avolumado no cenário religioso, no terreno do sagrado, na esfera onde deveríamos encontrar refúgio para os cansados. Mas não, houve uma importação dos interesses pessoais para a mesa onde a ceia da comunhão com o espírito estava sendo celebrada. E o pão que deveria ser uma representação da presença de Deus passou a ser o objeto da adoração.
Já o outro texto, com a pauta oriental em suas construções, vai cumprir o papel que lhe cabe, qual seja, expressar a sensibilidade, a serenidade e a leveza do pensamento e comportamento orientais. Este, no entanto, tem um tempero mais agressivo que o habitual. A experiência religiosa e a meditação, de Jiddu Krishnamurti, trabalha a conceituação dos termos propostos no seu título (experiência religiosa e meditação), fazendo contrapontos com o que não é experiência religiosa e a má compreensão do que é a meditação. Claramente vê-se aqui um ataque com luvas de pelica ao – e novamente ele – pragmatismo ocidental e ao espírito de urgência alimentado e cultivado por cada um de nós. Mais que isso, ataca-se toda e qualquer forma de religião, organização religiosa ou os “gurus”. Falha o autor, pois ao pretender apontar o caminho, qualquer que seja, faz-se ele mesmo de guru. O texto é pontuado de contradições em suas conceituações e contradições internas (uma afirmação contradiz outra logo em seguida).
Ele não quer lidar com a religião e ataca frontalmente o objeto da religião e da espiritualidade ocidental (Deus), afirmando que se trata de projeção da mente. Não é possível, segundo ele, conhecer nem experimentar a divindade, qualquer que seja, pois como podemos experimentar algo que não sabemos de antemão como é? Assim, segundo ele, fica comprometida também a própria experiência religiosa. Mas o que ele coloca no lugar de Deus em seu texto é o próprio homem, e o homem que medita. Medita como? Novamente ele ataca, e agora o seu próprio ninho, os gurus da meditação zen, meditação transcendental etc. Para o autor, são “vendedores de sistemas” e “sistemas mecanizam” o homem em vez e libertá-los.
Qual a saída? “Comprar o pacote” que ele vende e, com isso, vejo um ciclo vicioso do qual ele não sairá facilmente; não neste texto. Pois o que faz em seguida é oferecer o seu sistema, embora dando-lhe outro nome para “evitar” ser confundido com o que ataca. Não estou mergulhado na cultura oriental, mas pareceu-me ser a versão asiática da pragmática e do comércio do sagrado.
Para concluir, gostaria de apontar algo que achei muito proveitoso, quando trata do modo como lidar com a memória, com as experiências e os pensamentos. O autor vai propor um “olhar para fora”, para fora de si em busca do belo, do ideal. É possível, aqui, para o cristão, refletir sobre o próprio significado da ecclesia, que nada mais é do que “sair do meio” (no caso, o sistema judaico). Ao menos nas obras que tenho lido, pouco se fala sobre esse ponto (devo confessar que leio pouco sobre o assunto e quando o faço, leio autores ocidentais).
A proposta é, ainda, muito similar ao conceito de kenose cristão, o esvaziar-se de si mesmo, a exemplo do que faz Jesus e que Paulo narra em Filipenses 2.5-11. Talvez o que ficará da leitura desses textos são o alerta para a materialização exacerbada que ocorre no comércio do sagrado e essa questão que acabei de apontar, da necessidade de um esvaziamento dos próprios interesses, das próprias ganâncias tão nossas e que prejudicam não outros, mas a nós mesmos. A troca de experiências com os orientais deveria, sim, ter algo a ensinar.
sexta-feira, 16 de julho de 2010
Como esperamos a aurora?
A obra do historiador Jean Delumeau, À Espera da Aurora (2007, Loyola, 215pp.), é uma importante peça de análise e perspectivas sobre o Cristianismo, mormente o cristianismo Católico Romano.
Desse modo, é possível dividir a obra em duas partes, a primeira lançando um olhar retroativo nas questões, digamos, da sociologia da religião, comparando-o com outras cosmovisões e apontando certa “inocência” daquele em relação aos enganos destas.
A segunda parte Delumeau utiliza, após ter lançado o fundamento do seu edifício, para fazer uma leitura contemporânea sobre o diálogo inter-religioso e o faz do ponto de vista católico romano. Ele entende ser esta a instituição a responsável pela iniciativa de tal diálogo, uma vez que a vê como a majoritária instituição dentro do ambiente cristão. Mas não é apenas isso o que Delumeau pretende. Sua proposta é fundamentar o diálogo inter-religioso com vistas “à aurora”, a qual espera, e deve ser entendida como o novo limiar na comunidade religiosa global, quando as diferenças cúlticas serão mantidas cada qual no seu ambiente, mas o espaço público será marcado pela convergência de elementos comuns a todos os credos que se dispõem a uma convivência pacífica, de aprendizado mútuo e de troca de experiências. Nessa altura, ele pergunta, repercutindo a pergunta dos bispos em Lourdes, na França, em 2000: “Como anunciar o Evangelho hoje em dia?”
Delumeau, então, analisa o Cristianismo, primeiramente, em termos de números, e começa o seu texto citando pesquisas exaustivamente, todas elas executadas e levadas a cabo por órgãos do velho continente. É possível, a partir da leitura de tais pesquisas, notar (parafraseando Rubem Alves em Dogmatismo e Tolerância ou em Religião e Repressão) que as instituições estão em baixa, ao passo que a crença está em alta. Essa constatação é amparada pelo olhar evolucionista, quando deixa claro que somos (o Cristianismo) muito jovens.
É neste mesmo capítulo cuja tônica é apresentar números e a realidade – não considerada nas estatísticas – que os cristãos, à exemplo do que fez, também foram massacrados e martirizados. Não somente perseguiu (p. ex. na Inquisição), mas foi, notadamente no século XX, vítima de um programa de erradicação, num século quando a geração nada sabe a respeito do religioso cristão, mas demonstra, paradoxalmente (segundo as estatísticas), um crescimento do interesse em espiritualidade.
Em seguida, Delumeau, que já havia apontado o Cristianismo como responsável por grandes desenvolvimentos da humanidade, elabora um capítulo que se resume no seguinte: ciência e religião não devem excluir-se, mas ambas devem ficar maravilhadas diante da “obra da criação”. E esta obra, para a religião, aponta o Criador; para a ciência, aponta o belo. No entanto, Delumeau trata de colocar os devidos pontos a estes termos, quando fala da ciência e sua incapacidade de dar a palavra final. A cada descoberta, novos enigmas. A ética, por exemplo, não é simples alocamento químico-molecular. É transcendental, como em Dostoieviski (embora ele não cite o escritor russo). A palavra final é dada pela Bíblia e o fundamento da ética e da moral é Deus, e não o homem.
Na segunda metade do livro, Delumeau vai estreitando cada vez mais o seu foco para apontar, como já especifiquei no início dessa resenha, as questões do diálogo inter-religioso e este encabeçado pela igreja Católica. Cita vastamente frases e situações envolvendo Paulo VI e João Paulo II, suas viagens, concílios e documentos, com o claro intuito de demonstrar a existência de boa vontade por parte dessas lideranças – e também no arraial luterano e metodista – mas que é preciso fazer mais e fazer algo que retire do discurso e do papel e seja traduzido por ações e convivência que demonstre a eficiência de tais atitudes.
Gostaria de destacar dois pontos na obra de Delumeau, um positivo e outro negativo. O negativo é que, talvez por uma questão de “orgulho” nacionalista, o autor concentra suas leituras a fontes européias. As ocorrências de dados sobre a Ásia e América Latina não são dele, mas dessas mesmas fontes que – elas sim – preocuparam-se em dar um panorama mais abrangente do assunto tratado.
Delumeau peca com este “estreitamento”, pois ignora grandes trabalhos feitos, por exemplo, no Novo Mundo. Um caso bem conhecido, a obra de D. James Kennedy E se Jesus não tivesse nascido (2003, Ed. Vida), é imensamente mais abrangente (e faz isso num só capítulo, não em metade de sua obra!) quando cita as atrocidades cometidas por ideologias várias frente àquelas das quais os cristãos vez ou outra são acusados, como as Cruzadas e a Inquisição.
O Dr. Kennedy cita as mais de 40 milhões de pessoas mortas sob o regime de Stálin, o que Delumeau (embora Stalin seja do mesmo continente) ignora. O Dr. Kennedy aponta também, os seis milhões de judeus e “de nove a dez milhões de outras pessoas (na maioria cristãos)” que foram liquidados. E o que dizer de Mao Tsé Tung, com os mais de 70 milhões de chineses e mais dois milhões de pessoas de outras etnias?
O Dr. Kennedy chega até mesmo a fazer contas, somando as mortes ocorridas sob os regimes supra citados, adicionando aquelas ocorridas durante as guerras do século XX, e chega a um número aproximado de 130 milhões. “Usando os mais exagerados critérios e números não seria possível chegar a mais de 17 milhões de pessoas mortas por cristãos professos em nome de Jesus, em vinte séculos de história cristã” (p. 300, ênfase minha).
Do ponto de vista positivo, apreciei muito o capítulo 5 (A recusa da culpabilidade hereditária), no qual o autor resgata a origem da doutrina do pecado original e sua hereditariedade (ou, na expressão do autor, a solidariedade). A menos nas obras que tenho lido recentemente, pouco tem sido dito sobre o tema. Delumeau remonta tal doutrina a reflexões feitas por Agostinho e ampara sua afirmação dizendo que nem mesmo a “teologia” dos judeus considerava esse pecado. E mais, diz que “até o último quarto do século II a questão do pecado original permaneceu obscura nos textos dos Padres apostólicos” (p. 89).
Delumeau acusa a insistência na manutenção dessa doutrina a uma má interpretação da escolástica agostiniana. Não herdamos a culpa do pecado de Adão (ele cita Jesus e Ezequiel) mas os efeitos do mal “no mundo”. Chegamos aqui e o mal já estava instaurado. Neste sentido, justifica-se falar em “redenção”. É possível associar o dito de Delumeau ao de Huberto Rohden, quando antecipa que a “queda” não é negativa, antes, um impulso para o próprio desenvolvimento humano. Neste sentido, o que chamamos Queda pode ser o próprio “levantar-se”. Quem poderá suportar este discurso?
Desse modo, é possível dividir a obra em duas partes, a primeira lançando um olhar retroativo nas questões, digamos, da sociologia da religião, comparando-o com outras cosmovisões e apontando certa “inocência” daquele em relação aos enganos destas.
A segunda parte Delumeau utiliza, após ter lançado o fundamento do seu edifício, para fazer uma leitura contemporânea sobre o diálogo inter-religioso e o faz do ponto de vista católico romano. Ele entende ser esta a instituição a responsável pela iniciativa de tal diálogo, uma vez que a vê como a majoritária instituição dentro do ambiente cristão. Mas não é apenas isso o que Delumeau pretende. Sua proposta é fundamentar o diálogo inter-religioso com vistas “à aurora”, a qual espera, e deve ser entendida como o novo limiar na comunidade religiosa global, quando as diferenças cúlticas serão mantidas cada qual no seu ambiente, mas o espaço público será marcado pela convergência de elementos comuns a todos os credos que se dispõem a uma convivência pacífica, de aprendizado mútuo e de troca de experiências. Nessa altura, ele pergunta, repercutindo a pergunta dos bispos em Lourdes, na França, em 2000: “Como anunciar o Evangelho hoje em dia?”
Delumeau, então, analisa o Cristianismo, primeiramente, em termos de números, e começa o seu texto citando pesquisas exaustivamente, todas elas executadas e levadas a cabo por órgãos do velho continente. É possível, a partir da leitura de tais pesquisas, notar (parafraseando Rubem Alves em Dogmatismo e Tolerância ou em Religião e Repressão) que as instituições estão em baixa, ao passo que a crença está em alta. Essa constatação é amparada pelo olhar evolucionista, quando deixa claro que somos (o Cristianismo) muito jovens.
É neste mesmo capítulo cuja tônica é apresentar números e a realidade – não considerada nas estatísticas – que os cristãos, à exemplo do que fez, também foram massacrados e martirizados. Não somente perseguiu (p. ex. na Inquisição), mas foi, notadamente no século XX, vítima de um programa de erradicação, num século quando a geração nada sabe a respeito do religioso cristão, mas demonstra, paradoxalmente (segundo as estatísticas), um crescimento do interesse em espiritualidade.
Em seguida, Delumeau, que já havia apontado o Cristianismo como responsável por grandes desenvolvimentos da humanidade, elabora um capítulo que se resume no seguinte: ciência e religião não devem excluir-se, mas ambas devem ficar maravilhadas diante da “obra da criação”. E esta obra, para a religião, aponta o Criador; para a ciência, aponta o belo. No entanto, Delumeau trata de colocar os devidos pontos a estes termos, quando fala da ciência e sua incapacidade de dar a palavra final. A cada descoberta, novos enigmas. A ética, por exemplo, não é simples alocamento químico-molecular. É transcendental, como em Dostoieviski (embora ele não cite o escritor russo). A palavra final é dada pela Bíblia e o fundamento da ética e da moral é Deus, e não o homem.
Na segunda metade do livro, Delumeau vai estreitando cada vez mais o seu foco para apontar, como já especifiquei no início dessa resenha, as questões do diálogo inter-religioso e este encabeçado pela igreja Católica. Cita vastamente frases e situações envolvendo Paulo VI e João Paulo II, suas viagens, concílios e documentos, com o claro intuito de demonstrar a existência de boa vontade por parte dessas lideranças – e também no arraial luterano e metodista – mas que é preciso fazer mais e fazer algo que retire do discurso e do papel e seja traduzido por ações e convivência que demonstre a eficiência de tais atitudes.
Gostaria de destacar dois pontos na obra de Delumeau, um positivo e outro negativo. O negativo é que, talvez por uma questão de “orgulho” nacionalista, o autor concentra suas leituras a fontes européias. As ocorrências de dados sobre a Ásia e América Latina não são dele, mas dessas mesmas fontes que – elas sim – preocuparam-se em dar um panorama mais abrangente do assunto tratado.
Delumeau peca com este “estreitamento”, pois ignora grandes trabalhos feitos, por exemplo, no Novo Mundo. Um caso bem conhecido, a obra de D. James Kennedy E se Jesus não tivesse nascido (2003, Ed. Vida), é imensamente mais abrangente (e faz isso num só capítulo, não em metade de sua obra!) quando cita as atrocidades cometidas por ideologias várias frente àquelas das quais os cristãos vez ou outra são acusados, como as Cruzadas e a Inquisição.
O Dr. Kennedy cita as mais de 40 milhões de pessoas mortas sob o regime de Stálin, o que Delumeau (embora Stalin seja do mesmo continente) ignora. O Dr. Kennedy aponta também, os seis milhões de judeus e “de nove a dez milhões de outras pessoas (na maioria cristãos)” que foram liquidados. E o que dizer de Mao Tsé Tung, com os mais de 70 milhões de chineses e mais dois milhões de pessoas de outras etnias?
O Dr. Kennedy chega até mesmo a fazer contas, somando as mortes ocorridas sob os regimes supra citados, adicionando aquelas ocorridas durante as guerras do século XX, e chega a um número aproximado de 130 milhões. “Usando os mais exagerados critérios e números não seria possível chegar a mais de 17 milhões de pessoas mortas por cristãos professos em nome de Jesus, em vinte séculos de história cristã” (p. 300, ênfase minha).
Do ponto de vista positivo, apreciei muito o capítulo 5 (A recusa da culpabilidade hereditária), no qual o autor resgata a origem da doutrina do pecado original e sua hereditariedade (ou, na expressão do autor, a solidariedade). A menos nas obras que tenho lido recentemente, pouco tem sido dito sobre o tema. Delumeau remonta tal doutrina a reflexões feitas por Agostinho e ampara sua afirmação dizendo que nem mesmo a “teologia” dos judeus considerava esse pecado. E mais, diz que “até o último quarto do século II a questão do pecado original permaneceu obscura nos textos dos Padres apostólicos” (p. 89).
Delumeau acusa a insistência na manutenção dessa doutrina a uma má interpretação da escolástica agostiniana. Não herdamos a culpa do pecado de Adão (ele cita Jesus e Ezequiel) mas os efeitos do mal “no mundo”. Chegamos aqui e o mal já estava instaurado. Neste sentido, justifica-se falar em “redenção”. É possível associar o dito de Delumeau ao de Huberto Rohden, quando antecipa que a “queda” não é negativa, antes, um impulso para o próprio desenvolvimento humano. Neste sentido, o que chamamos Queda pode ser o próprio “levantar-se”. Quem poderá suportar este discurso?
quinta-feira, 1 de julho de 2010
Ele, a Vida
Ele, a vida é o título de um poema de Mouses. Quando leio João 5.39,40 lembro desse título: “Vocês estudam cuidadosamente as Escrituras, porque pensam que nelas vocês têm a vida eterna. E são as Escrituras que testemunham a meu respeito; contudo, vocês não querem vir a mim para terem vida.”
Com essas palavras, Jesus está dizendo várias coisas. Muito pode ser dito sobre estes dois versículos, mas certamente o mais importante, a verdade mais impressionante, o ensino mais marcante que se pode extrair da passagem reside no fato do encontro com Jesus. O eixo do texto é o próprio Jesus e um aspecto é patente: as Escrituras são importantes, é necessário estudá-la, mas elas não nos dão vida. Jesus está dizendo que as Escrituras são a placa de sinalização para Ele. Elas são as placas que indicam que Ele é o Caminho. Elas apontam para Ele, o Caminho; Ele, a Vida.
O erro dos fariseus dos dias de Jesus e dos nossos fariseus é esse: estudar as Escrituras, decorá-la, repeti-la, ensiná-la, mas nunca promover o encontro com Ele, a Vida. As Escrituras testemunham a respeito de Jesus, mas é preciso ir a Ele para termos vida. As Escrituras e o Cristianismo sinalizam que é preciso relacionar-se pessoalmente com Jesus para haver qualquer vestígio de mudança em nós, para que vivamos.
Sem relacionamento pessoal com a Vida, não há vida. Tudo o que fizermos sem a mais íntima e profunda comunhão pessoal com Jesus deve ser apontado como religioso no seu sentido mais negativo, pois é intelectualmente enganoso e não promove vida. Porque conhecer as Escrituras é um modo eficiente de fazer-nos sábios, como conhecer teologia é um modo eficiente de fazer-nos intelectuais, mas aqueles que querem algo mais intenso e duradouro precisam ter um encontro com Ele, a Vida.
sexta-feira, 25 de junho de 2010
Contribua com a “minha” incompetência
O programa de rádio começou assim: “– A paz do Senhor. Não, eu não deveria desejar a paz, porque vocês não depositaram nem 30% do valor do programa; nem R$ 5,00 vocês podem depositar?” Na outra banda, o programa na TV mantém os dados bancários e a indesejável solicitação: “Ajude-nos. Seja um mantenedor do nosso programa”. Há outros apelos piores.
Se existe algo que envergonha a muitos cristãos é a “pedição” de dinheiro para manter programas de rádio e TV. Por que alguém pediria recursos para essa ação “evangelística”? Porque não é do ramo, não sabe planejar – e pior, é incompetente.
Veja programas no rádio e na TV que não são para o público cristão. Eles são bons, têm qualidade, são organizados, alcançam o público-alvo, dão IBOPE e vendem o produto. Por quê? Porque alguém sabe montar o projeto, alguém planeja, sabe prever crescimento e sai da cadeira para ir atrás de patrocinadores (e muitos desses patrocinadores até mesmo ajudam no planejamento das ações do programa com seus especialistas).
Mas os pastores e apóstolos midiáticos não. Eles querem comer camarão a preço de arroz com feijão. Primeiro contratam um horário no rádio ou na TV, sem planejamento, “tudo pela fé”, e depois colocam a culpa da sua desorganização, da sua fantasia, da sua falta de responsabilidade (e mais uma porção de adjetivos) nos ouvintes e telespectadores – se é que os têm. E fazem isso em rede nacional, lavando roupa suja ao vivo – e muitas vezes a cores. É lamentável, é vergonhoso.
Eu penso que não há necessidade de todas as igrejas serem representadas no rádio e na TV. Noventa por cento dos casos é o “apresentador-pastor” que quer aparecer, equiparar-se com o outro que está no ar, ou mesmo querem aumentar o rebanho para faturarem mais. Qual programa desses, que está na TV, pode ser rotulado de evangelístico? Nenhum! Todos são programetes de crente para crente. Alguns estão na TV para lavarem roupa suja da denominação, para falarem e serem ouvidos sem que a outra parte tenha direito a resposta. É uma aula de falta de amor e de falta de civilidade. Pessoalmente, fico envergonhado. Fico como avestruz, com vontade de enfiar a cabeça na terra. A falta de união fica evidente e isso é desserviço ao evangelho, não evangelização. Perdemos almas com isso, não as ganhamos. Ganhamos antipatia da população mais atenta e perdemos moral diante de todos. Se a pastorada quer pregar o evangelho, que comece organizando a própria casa (a igreja e a doméstica também).
Encher os templos com visitantes convidados no ar pode indicar outra deficiência: a falta de programas de discipulado, de treinamento, de ensino. Essas igrejas não têm essa preocupação, pois estão completamente dependentes de recursos midiáticos para manter os bancos de suas igrejas lotados. “Sai um, Deus manda outro”, dizem.
Quem quiser ajudar esses pastores a fazer a coisa certa, que pare de contribuir com a incompetência deles. Apóie iniciativas sérias. Nas igrejas há bons profissionais do ramo, estrategistas, especialistas em planejamento, em mídias sociais, que poderiam ser aproveitados com a finalidade de melhorar a apresentação do evangelho, quando essa for de fato a proposta. Do contrário, atenda ao apelo do pastor: “Financie a minha incompetência. Deposite agora mesmo a sua contribuição”.
sexta-feira, 18 de junho de 2010
Tchau, teologia! Vai com Deus...
Jesus respondeu: “Vocês estão enganados porque não conhecem as Escrituras nem o poder de Deus!”
A história da Igreja ensina que as diferenças de opinião sobre modos de interpretação (abordagens) e doutrinas (posicionamentos) sempre ocorreram. A novidade nos últimos anos é que os cristãos não mais divergem sobre abordagens nem sobre posicionamentos, porque nada sabem sobre a Bíblia nem sobre teologia. A maioria dos cristãos não considera a teologia e suas doutrinas algo importante, relevante e nem de aplicação prática em suas vidas.
Nas igrejas (e reuniões informais dos “sem-igreja”), no entanto, todos querem acertar o alvo e se darem bem. Mas como isso acontecerá, se não conhecem a proposta bíblica? O clímax da afirmação acima, feita por Jesus, é que nós “erramos”, e ele dá o motivo: por falta de conhecimento. Vincent Cheung em sua obra diz que “não há propósito maior para o homem senão o de conhecer a Deus”, e, “visto que Deus se revelou através da Escritura, conhecer a Escritura é conhecê-lo, e isto significa estudar teologia”. Isso não significa, necessariamente, matricular-se numa escola de teologia.
Até para servir a Deus em nossas “igrejas de bairro” necessitamos, ao menos, de uma teologia “funcional”, formulações para que nosso serviço seja feito de acordo a Palavra de Deus. Nada pode ser realizado na vida espiritual cristã sem a mínima noção de teologia: não podemos crer, não podemos evangelizar, não podemos pregar, não podemos ensinar, não podemos nem orar sem conhecimento teológico!
Em Romanos 10.13-15a há, por exemplo, uma proposição teológica: “Porque ‘todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo’. Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem não ouviram falar? E como ouvirão, se não houver quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados?” (NVI). Em outras palavras, é preciso aprender a verdade de Deus para pregá-la e levar outros a crer.
Alguém pode não gostar de teologia sistemática (Cristologia, Harmatiologia, Escatologia), mas precisa ao menos da teologia bíblica (do Antigo Testamento ou do Novo Testamento, ou a dos apóstolos – João, Lucas, Paulo, Pedro). A Teologia, portanto, é inevitável. A questão então se torna: Sua Teologia é correta?
A Teologia equivocada leva inevitavelmente ao desastre espiritual (e a outros desastres também!). Há grupos que, por não formularem corretamente uma teologia básica, chegam a negar a existência de Deus. Outros formulam conceitos errados sobre Jesus e sua divindade, e assim invalidam a sua obra eficaz. Também há formulações erradas sobre o Espírito Santo e sobre as Escrituras, como Jesus advertiu no versículo acima.
Há exemplos clássicos de erros por causa do desconhecimento das Escrituras e da Teologia:
- Jesus nunca disse: “De mil passarás, a dois mil não chegarás”, como alguns dizem
- A reencarnação não existe, mas sim a ressurreição
- Jesus também nunca disse: “Não cai uma folha de uma árvore sem que Deus não saiba”
- Jesus nunca disse aos perdidos: “Eis que estou à porta e bato...”. Ele disse isso à Igreja (a cristãos!).
Há uma lista que poderia ser relacionada aqui. Uma lista não, algumas boas páginas!
Diante da necessidade do estudo das Escrituras e visto que estudar as Escrituras é procurar conhecer a Deus para servi-lo melhor e sem erros, a Teologia é a maneira mais segura de preparar nossa vida espiritual para que seja uma vida de acertos constantes. Você pode programar-se para o estudo da Palavra de Deus se sentir em seu coração que ama o Senhor e quer melhorar o seu conhecimento a respeito dele e o seu relacionamento pessoal com o Senhor Jesus. Mas negar-se a conhecê-lo melhor e conhecer a Palavra que testifica a seu respeito é garantia de erros e afastamento. Quem dá adeus ao estudo das Escrituras não vai com Deus...
quarta-feira, 16 de junho de 2010
Pontos de contato para a comunicação num mundo pós-moderno
1. Existe farta abertura para a espiritualidade. O homem é um ser espiritual: “Mas é o espírito dentro do homem que lhe dá entendimento; o sopro do Todo-poderoso”. (Jó 32.8. RC: “Na verdade, há um espírito no homem, e a inspiração do Todo-poderoso os faz entendidos”). “Também pôs no coração do homem o anseio pela eternidade” (Ec 3.11).
Na modernidade a exaltação era a razão e ao conhecimento científico: o que pode ser provado? “Antigamente, o que estava sendo dito não era questionado. Ele questionou o saber constituído e criou a cultura moderna, a cultura em que a verdade não é questão de autoridade, mas de comprovação. Nasce com esta atitude de Galileu o homem moderno, que pode ser mostrado assim: não é o que a Igreja diz, o que Aristóteles (cuja autoridade era indiscutível) diz, mas o que se pode provar”. (Isaltino Gomes). Com isso, houve um esfriamento em relação aos postulados da religião e da fé, uma descrença na Palavra de Deus associada às “promessas não cumpridas” feitas por setores da cristandade.
Na pós-modernidade, há novamente uma explosão de espiritualidade. O homem estava sufocado com o pensamento científico que produziu duas Grandes Guerras e não melhorava a vida das pessoas com a modernidade e o avanço tecnológico. Agora até as grandes corporações investem em espiritualidade, livros sobre espiritualidade, sobre “Jesus isso“, “Jesus aquilo” estão nas listas dos mais vendidos. Mas também houve um resgate da superstição: gnomos, duendes, pedras, cristais e outros.
2. Os absolutos. O homem pós-moderno diz não haver absoluto. O que é verdade/absoluto para alguém pode não ser para outro. Isso é discurso desconstrutivista. Não corresponde a verdade, pois:
a) todos lutam por um mundo melhor (se não há absolutos, o que é um mundo melhor?)
b) experimente agredir alguém (o que é agressão para um, pode não ser para outro)
c) Dostoievski: “Se Deus está morto, então tudo é permitido”. Vamos roubar e matar.
A Bíblia é supra-cultural embora sua escrita revele traços profundos de determinadas culturas. Sua aplicação cabe em qualquer grupo, pois a verdade não é a minha verdade, mas a Verdade de Deus; não é a verdade da instituição que importa, mas os princípios eternos do Criador.
Arnold Toymbee: “Alguns dos nossos especialistas-sacerdotes são chamados de psiquiatras, alguns de psicólogos, alguns de sociólogos, alguns de estatísticos. Chamam pecado de “desvio social”, que é um conceito estatístico, e chamam o mal de “psicopatologia”, que é um conceito médico”.
A igreja deve dar ênfase a dois conceitos fortemente atacados: a moralidade e a verdade. Lutero: “A prova definitiva do pecador é que ele não conhece seu próprio pecado. Nossa tarefa é fazer com que ele o veja”. Proclamar a o evangelho da salvação em Jesus Cristo pode trazer convicção do pecado
3. Individualismo. Em Juízes 21.25: “Cada um fazia o que achava mais reto”. Isso decorre da falta de uma estrutura moral, onde a sociedade se desintegra em facções que guerreiam entre si e contra indivíduos isolados e depravados. É um retorno ao barbarismo, a perversão, a anarquia como nos tempos mais antigos.
Paulo, quando escreve aos Coríntios, já enfrentava esse problema. “Eu sou de Paulo, eu sou de Apolo” revela o embrião do comportamento pós-moderno há 2 mil anos. Ele diz que o ser, a persona é desintegrada naquele que É, no Deus que tudo pode. Nós não somos, mas Ele é tudo em todos (aldeia global).
Os pós-modernistas dizem que o sentido da linguagem só pode ser determinado dentro da “comunidade interpretativa”. Para os cristãos, a igreja é a sua comunidade interpretativa. E também a síntese de unidade e pluralismo no Corpo quase soa como pós-moderna.
Pessoas pós-modernas são voltadas para o grupo. Reside aí um forte apelo aos pequenos grupos, grupos de comunhão, grupos de estudo etc.
Por outro lado, o Senhor respeita a individualidade de cada um (vide a analogia da Igreja como um Corpo formado por diversos membros individualmente).
4. Testemunho vivo. Leith Anderson afirma que “as pessoas de hoje tendem a não pensar de forma sistemática nem dar atenção a uma argumentação racional. Assim as idéias podem ser mais bem abordadas de questão em questão e pela influência de relacionamentos. Pessoas que sirvam como modelo, mentores e amigos moldam o pensamento das pessoas, para melhor ou para pior, mais do que uma lógica objetiva”.
Jesus se comunicava por meio de parábolas, não por meio de tratados abstratos.
segunda-feira, 14 de junho de 2010
A tecnociência é a parteria da pós-humanidade
Futurólogos preveem que antes do final do século XXI desaparecerá o último humano da face da Terra, dando lugar aos cyborgs, seres biológicos e maquínicos, anunciou a filósofa argentina Esther Diaz, professora da Universidade Nacional de Lanús.
“A tecnociência é a religião global de hoje e a saúde é o seu bem maior”, disse Esther na segunda-feira, 10, para uma platéia de professores e estudantes da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), em São Leopoldo, ao falar sobre “O desejo e a ética como base para a investigação e a docência universitária”.
A ciência, enfatizou Diaz, é muito mais do que conhecimento, porque ela lida com o poder. Daí que a biopolítica, ou o biopoder, quer o controle da vida, da saúde, do sexo, da morte.
Antigamente, quando o coração parava de bater era o indicativo de que a pessoa estava morta. Hoje, um aparelho marca o momento da morte encefálica. Na atualidade, a pessoa não morre mais em casa, numa cama rodeada de parentes e num ambiente familiar, mas morre numa Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), solitariamente.
Hoje, o biopoder atua sobre a vida, como aconteceu nos campos de extermínio, e atua sobre a morte, como se verifica nas unidades de terapia intensiva. As UTIs não passam de locais onde se espera a morte, disse.
Se no passado cabia às religiões aspirarem a vida eterna, hoje é a técnica que almeja a vida eterna biológica, disse Diaz. “As promessas de salvação não vêm mais do mundo religioso, mas do mundo científico”, agregou.
As pessoas passam a ser, então, uma fusão de natureza e técnica, início da era pós-humana. “A técnica, hoje, se introjeta no corpo por manipulação genética, implante, transplante”, arrolou a palestrante.
Parodiando Karl Marx – “a violência é a parteira da história” – a filósofa argentina mencionou que “a tecnociência é a parteira do pós-humano”.
Embora o poder tente convencer a humanidade de que a ciência é neutra, universal, é preciso questionar a racionalidade científica, brigar para que a ética perpasse a ciência, e ter claro que a ciência não é neutra nem universal.
Enquanto a Aids se restringiu ao continente africano, o vírus HIV mereceu pouca atenção da indústria de fármacos. Assim que a pandemia chegou a países desenvolvidos, o quadro mudou, ganhou pesquisas e medicamentos, apontou a filósofa, ressaltando, assim, que a ciência não é universal nem neutra, que ela não está aí para todos da mesma forma.
Não se trata de negar a técnica e a ciência, frisou, mas de pensá-las, questioná-las e definir que papel elas desempenharão no futuro.
por Edelberto Behs. Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação (ALC).