Uma amiga comentou a afirmação que ouviu durante a pregação, o que chamou a minha atenção. O pregador teria dito algo assim: “A visão define a ação, que determina o hábito, que molda o caráter e que nos leva ao destino. Isso equivale a habilidade de ver o futuro.” Há um pregador norteamericano que se notabilizou entre os cristãos, George Barna. Ele tem, publicado no Brasil, alguns bons livros sobre o poder da visão.
Mas qual o problema com a afirmação mencionada pela amiga? Nenhuma. Ela é verdadeira ou, no mínimo, faz sentido. Então por que importar-se com ela? Porque a afirmação foi feita num culto, numa reunião da Igreja, teoricamente amparada por textos e citações da Bíblia. E há problema com isso? Sim, e explico.
Considere que mensagens como essas e muitas outras semelhantes, estão à disposição de cristãos de todo nível, novos e velhos, iniciados e maduros, bem ou mal intencionados, leigos e oficiais. Um novo cristão, quando ouve uma mensagem dessa seguidamente, tenderá a pensar que o evangelho e todo o conteúdo da Bíblia estão amparados sobre modelos psicológicos de afirmação. Mais que isso, que qualquer ação do homem é, em si, uma ação unilateral, que depende apenas da disposição humana ou, no mínimo, da sua capacidade de enxergar além daquilo que o seu semelhante consegue enxergar. E nada mais particular que a visão!
Onde entra Jesus nessa história? Ele é quem dá a visão que precisamos ter. Ele é quem a revela e provê os recursos para que a alcancemos. Mas isso é tão marginal ao contexto da mensagem que corre o risco de passar despercebido ao ouvinte. E aí reside o malefício de mensagens com esse teor.
Por isso a pregação e o ensino cristãos devem – irremediavelmente – ser cristocêntricos. Se nossa pregação não passar por Jesus, não temos nada a dizer a uma audiência de cristãos. Antonio Vieira já via esse problema no Século 17, pois escreveu no Sermão da Sexagésima: “Prega-se sobre a Palavra, mas não a Palavra”. E acrescenta que essa era a causa de haver muitas igrejas, muitos pregadores, mas poucas conversões. E isso mudou hoje? De forma alguma, tanto que no Século 20 Billy Graham e John Stott disseram algo a esse respeito. O que houve de variação foi que as temáticas foram mudadas, mas ainda desconsiderando a necessidade da cristocentricidade.
O evangelho, que é simples e não menos de difícil aplicação, tem sido mudado em um emaranhado de formulações quase algébricas que destoam o sentido original já presente nos enunciados do Antigo Testamento. Os antigos judeus e a mente oriental não raciocinam em categorias analíticas. Seu enfoque está nas questões da vida, do longo prazo, do domínio próprio e do equilíbrio. Nós somos imediatistas, analíticos, pragmáticos. Eles pensam na família como grande desafio da vida de um homem; nós não conseguimos sucesso no lar, batemos recordes de divórcio e mesmo assim queremos resolver os problemas do planeta. A Bíblia não dá base a esse modo interpretação de suas verdades e princípios e forçá-la a isso é um atentado ao seu valor mais intrínseco: ser ela a revelação de Deus ao homem para que este tenha a vida.
Por que não desfrutamos a plenitude daquilo que o cristianismo oferece de melhor? Porque Jesus ensinou princípios e nós queremos fórmulas; Jesus apontou para a base do edifício, mas nós temos olhado para a torre de marfim.
Quem se aproxima do evangelho precisa considerar que Jesus pregou o Reino acima de tudo, inclusive da Igreja (tema que ele pouco explorou) e disse aos seus ouvintes que buscassem a Vida, a qual ele afirmou ser encontrada no relacionamento pessoal com ele. Nós, ao contrário, não enfatizamos o Reino, mas a Igreja (e o que podemos extrair da frequência a seus cultos) e queremos saber matematicamente como ter uma vida boa aqui e agora, não no futuro. Estamos tão longes da realidade espiritual ensinada pelo Senhor Jesus, assim como o Oriente está longe do Ocidente.
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