Todos sempre ouvimos, aqui ou ali, sobre a importância de Jesus Cristo na vida cristã e na teologia bíblica. Sabemos alguma coisa sobre tal importância, mas neste post quero destacar algo que por vezes passa despercebido.
Quem não tem a curiosidade de conhecer a Deus? Moisés pediu para ver a face de Deus (Ex 33.18-20). Discípulos fizeram o mesmo pedido a Jesus (Jo 14.8). E qual a resposta a esses pedidos? Jesus. Ele mesmo é a resposta, embora isso pareça jargão. Vejamos.
Quando escreve aos colossenses, Paulo afirmou: “Porque foi do agrado do Pai que toda a plenitude (gr. pleroma) nele habitasse” (Cl 1.19). Na mesma carta afirmou, ainda: “Porque nele habita corporalmente (gr. somatikos) toda a plenitude (gr. pleroma) da divindade” (Cl 2.9).
Quando Paulo usou a expressão somatikos, ele quis que seus leitores entendessem que não era uma referência ao Espírito de Cristo presente entre eles, mas ao próprio corpo humano de Jesus, ou seja, o Cristo encarnado que trazia consigo a plena divindade e, portanto, tratava-se de Deus encarnado: Emanuel!
Alguém poderia objetar que o texto conhecido como da kenose (esvaziamento), Filipenses 2.5-11, desfaz essa afirmação. O texto diz que Jesus “esvaziou-se” ao assumir a forma humana. A expressão e a passagem são por vezes mal compreendidas quando interpretamos esse “esvaziamento” como um uma mudança na natureza, e não uma mudança na condição. A encarnação de Deus Filho não muda a sua natureza (nem a sua essência); muda somente a condição. Jesus considerou que a permanência em meio à glória que havia junto a Deus “não era algo a que deveria apegar-se” enquanto que a sua criação gemia sob o pecado e suas consequências.
Desse modo, ele esvaziou-se “da sua glória” junto a Deus, abrindo mão dela, e encarnado, assumiu a ausência de glória num corpo limitado como o corpo humano. Sua natureza, a essência divina, por sua vez, permaneceu inalterada. Ele não deixou de ser Deus na encarnação. Se o fizesse não seria Emanuel, Deus conosco. Ele deixou a sua glória, não a sua divindade.
Fora das cartas de Paulo, o autor (ou autora?) aos Hebreus também afirma a mesma verdade: “O qual [Jesus] sendo o resplendor da sua [de Deus] glória, e a expressão exata do seu ser...". Que declaração fantástica! Transmite certa precisão matemática a nós leitores. Jesus é a expressão exata do ser de Deus! Não há muito o que acrescentar a uma declaração como essa.
Para concluir a nossa reflexão, palavras do próprio Jesus. Ao responder ao pedido de Filipe, que queria ver o Pai, Jesus disse: “Estou a tanto tempo convosco, e não me tendes conhecido? Quem vê a mim vê o Pai.” Não há ruptura entre ambos, Deus Pai e Deus Filho. Noutro lugar Jesus mesmo disse que ele e o Pai eram um.
Queremos aproximarmo-nos mais de Deus? Somente por meio de Jesus. Ele é o caminho, ninguém vai ao Pai a não ser por ele e, estar unido a Jesus é estar unido ao Pai. Que verdade libertadora e motivadora ao mesmo tempo. E mais emocionante é saber que temos acesso a ele, Deus manifesto, Deus conosco, o nosso Emanuel, Deus presente.
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Este espaço foi criado para discutir diferentes assuntos a partir da cosmovisão cristã. O que pretendo é o debate de ideias e o aprofundamento nas questões que interessam a Igreja de modo geral.
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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
domingo, 29 de janeiro de 2012
Há importância na Teologia?
"Jesus respondeu: ‘Vocês estão enganados porque não conhecem as Escrituras nem o poder de Deus!'" (Mt 22.29)
Esse é um texto narra um dos vários momentos em que religiosos judeus procuravam fazer Jesus tropeçar por conta de palavras ou do próprio raciocínio. O clímax do texto é a afirmação de que os homens erram. E ele dá o motivo: por falta de conhecimento.
Vincent Cheung diz que “não há propósito maior para o homem senão o de conhecer a Deus...” e “visto que Deus se revelou através da Escritura, conhecer a Escritura é conhecê-lo, e isto significa estudar teologia” (Introdução à Teologia Sistemática, Arte Editorial, 2008).
Por que estudar teologicamente?
Há, em determinados setores da igreja brasileira, certa resistência ao estudo da teologia. Tal resistência se dá por erros de interpretação da própria Bíblia. A velha história de que a letra mata, mas o Espírito vivifica é das mais freqüentemente usadas nesse argumento.
Sabemos, no entanto, que o autor refere-se não à letra dos livros didáticos, mas ao texto do mandamento da Lei de Moisés, que ao apontar o pecado (e essa era a função da Lei), promovia a morte do pecador. Este, conhecendo a sua transgressão, tomava consciência da morte e a única alternativa era a graça de Deus (o Espírito vivifica) se quisesse sobreviver.
Em outra passagem Paulo declara que não tinha consciência do seu pecado se não fosse pela Lei (ou letra da Lei de Moisés).
A teologia é necessária até para servir a Deus em nossas igrejas. Necessitamos, no mínimo, de uma teologia “funcional”, diretrizes para que nosso serviço seja feito de acordo a Palavra de Deus. O que faz um servo? Que funções desempenham os pastores? Os diáconos? Os presbíteros? Essas respostas são encontradas mediante um estudo “teológico” das Escrituras.
Nada pode ser feito sem uma noção de teologia: não podemos crer, não podemos evangelizar, não podemos pregar, não podemos ensinar, não podemos nem mesmo orar sem conhecimento teológico, pois João escreveu nas cartas que, se pedirmos algo "fora" da vontade de Deus, ele não atende ao nosso pedido. Portanto, é necessário teológicosra compreender a vontade de Deus, a fim de tornar nossas orações eficazes.
Até mesmo em Romanos 10.13-15a, um texto aparentemente simples, há uma proposição teológica: “porque ‘todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo’. Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem não ouviram falar? E como ouvirão, se não houver quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados?”
Aqui vemos proposições sobre a verdade de Deus para pregá-lo e levar outros a crer.
Deus quer revelar-se ao homem por meio de sua Palavra a fim de que não cometamos os erros que Jesus apontou no texto de Mateus 22.23-33. A Teologia é inevitável. Mas, então, a questão torna-se: Sua Teologia é correta?
- Uma Teologia equivocada leva a desastre espiritual e inevitável;
- Há grupos/seitas que negam a existência de Deus pelo desconhecimento;
- Conceitos errados sobre Jesus e sua divindade podem levar ao desvio gradual;
- Conceitos errados sobre o Espírito Santo podem enfraquecer a vida espiritual;
- Conceitos errados sobre as Escrituras conduzem ao distanciamento do Senhor.
Exemplos de textos interpretados erroneamente:
- De mil passarás, a dois mil não chegarás: Jesus nunca disse isso, mas afirmou que ninguém sabe o dia e a hora (veja Mt 24.36);
- Reencarnação é ensinada abertamente; a Bíblia nada diz sobre ela, mas sobre ressurreição (Hb 9.27);
- Não cai uma folha de uma árvore sem que Deus não saiba. Essa afirmação é dita freqüentemente nas igrejas, mas não encontra-se na Bíblia. O que Jesus disse foi: "Antes, todos os fios da vossa cabeça estão contatos", afirmando a sua oniciência;
- Eis que estou à porta e bato... Pregadoress usam esse texto na hora de fazer apelo, ao final de seus sermões, mas o texto é uma palavra de advertência de Jesus para crentes (igreja de Laodicéia), e não para pessoas não-salvas (Ap 3.20);
- Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo. Aqui cristãos usam o texto para argumentar em favor do fogo do Pentecoste, mas o fogo – neste texto – refere-se ao fogo do juízo (Leia o contexto de Mt 3.10-12);
- Onde estiver dois ou três em meu nome... Pregadores com igrejas vazias gostam de usar esse texto para animar os que estão presentes. No entanto, a questão das 2 ou 3 testemunhas num determinado caso é questão judaica de julgamento válido quando houver 2 ou 3 pessoas na porta da cidade. Se somos o Templo do Espírito Santo, não é necessário 2 ou 3 pessoas para que Ele esteja presente.
Diante da necessidade do estudo das Escrituras e visto que estudar as Escrituras é procurar conhecer a Deus para servi-lo melhor e sem erros, a Teologia é a maneira mais segura de preparar nossa vida espiritual para que seja uma vida de acertos constantes.
Você pode programar-se para o estudo da Palavra de Deus se sentir em seu coração que ama o Senhor e quer melhorar o seu conhecimento a respeito dele e melhorar o seu nível espiritual.
Que o Criador o oriente em seus estudos e que esses momentos sejam guiados pelo Seu Santo Espírito a produzir frutos de piedade para a glória de Deus.
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Esse é um texto narra um dos vários momentos em que religiosos judeus procuravam fazer Jesus tropeçar por conta de palavras ou do próprio raciocínio. O clímax do texto é a afirmação de que os homens erram. E ele dá o motivo: por falta de conhecimento.
Vincent Cheung diz que “não há propósito maior para o homem senão o de conhecer a Deus...” e “visto que Deus se revelou através da Escritura, conhecer a Escritura é conhecê-lo, e isto significa estudar teologia” (Introdução à Teologia Sistemática, Arte Editorial, 2008).
Por que estudar teologicamente?
Há, em determinados setores da igreja brasileira, certa resistência ao estudo da teologia. Tal resistência se dá por erros de interpretação da própria Bíblia. A velha história de que a letra mata, mas o Espírito vivifica é das mais freqüentemente usadas nesse argumento.
Sabemos, no entanto, que o autor refere-se não à letra dos livros didáticos, mas ao texto do mandamento da Lei de Moisés, que ao apontar o pecado (e essa era a função da Lei), promovia a morte do pecador. Este, conhecendo a sua transgressão, tomava consciência da morte e a única alternativa era a graça de Deus (o Espírito vivifica) se quisesse sobreviver.
Em outra passagem Paulo declara que não tinha consciência do seu pecado se não fosse pela Lei (ou letra da Lei de Moisés).
A teologia é necessária até para servir a Deus em nossas igrejas. Necessitamos, no mínimo, de uma teologia “funcional”, diretrizes para que nosso serviço seja feito de acordo a Palavra de Deus. O que faz um servo? Que funções desempenham os pastores? Os diáconos? Os presbíteros? Essas respostas são encontradas mediante um estudo “teológico” das Escrituras.
Nada pode ser feito sem uma noção de teologia: não podemos crer, não podemos evangelizar, não podemos pregar, não podemos ensinar, não podemos nem mesmo orar sem conhecimento teológico, pois João escreveu nas cartas que, se pedirmos algo "fora" da vontade de Deus, ele não atende ao nosso pedido. Portanto, é necessário teológicosra compreender a vontade de Deus, a fim de tornar nossas orações eficazes.
Até mesmo em Romanos 10.13-15a, um texto aparentemente simples, há uma proposição teológica: “porque ‘todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo’. Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem não ouviram falar? E como ouvirão, se não houver quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados?”
Aqui vemos proposições sobre a verdade de Deus para pregá-lo e levar outros a crer.
Deus quer revelar-se ao homem por meio de sua Palavra a fim de que não cometamos os erros que Jesus apontou no texto de Mateus 22.23-33. A Teologia é inevitável. Mas, então, a questão torna-se: Sua Teologia é correta?
- Uma Teologia equivocada leva a desastre espiritual e inevitável;
- Há grupos/seitas que negam a existência de Deus pelo desconhecimento;
- Conceitos errados sobre Jesus e sua divindade podem levar ao desvio gradual;
- Conceitos errados sobre o Espírito Santo podem enfraquecer a vida espiritual;
- Conceitos errados sobre as Escrituras conduzem ao distanciamento do Senhor.
Exemplos de textos interpretados erroneamente:
- De mil passarás, a dois mil não chegarás: Jesus nunca disse isso, mas afirmou que ninguém sabe o dia e a hora (veja Mt 24.36);
- Reencarnação é ensinada abertamente; a Bíblia nada diz sobre ela, mas sobre ressurreição (Hb 9.27);
- Não cai uma folha de uma árvore sem que Deus não saiba. Essa afirmação é dita freqüentemente nas igrejas, mas não encontra-se na Bíblia. O que Jesus disse foi: "Antes, todos os fios da vossa cabeça estão contatos", afirmando a sua oniciência;
- Eis que estou à porta e bato... Pregadoress usam esse texto na hora de fazer apelo, ao final de seus sermões, mas o texto é uma palavra de advertência de Jesus para crentes (igreja de Laodicéia), e não para pessoas não-salvas (Ap 3.20);
- Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo. Aqui cristãos usam o texto para argumentar em favor do fogo do Pentecoste, mas o fogo – neste texto – refere-se ao fogo do juízo (Leia o contexto de Mt 3.10-12);
- Onde estiver dois ou três em meu nome... Pregadores com igrejas vazias gostam de usar esse texto para animar os que estão presentes. No entanto, a questão das 2 ou 3 testemunhas num determinado caso é questão judaica de julgamento válido quando houver 2 ou 3 pessoas na porta da cidade. Se somos o Templo do Espírito Santo, não é necessário 2 ou 3 pessoas para que Ele esteja presente.
Diante da necessidade do estudo das Escrituras e visto que estudar as Escrituras é procurar conhecer a Deus para servi-lo melhor e sem erros, a Teologia é a maneira mais segura de preparar nossa vida espiritual para que seja uma vida de acertos constantes.
Você pode programar-se para o estudo da Palavra de Deus se sentir em seu coração que ama o Senhor e quer melhorar o seu conhecimento a respeito dele e melhorar o seu nível espiritual.
Que o Criador o oriente em seus estudos e que esses momentos sejam guiados pelo Seu Santo Espírito a produzir frutos de piedade para a glória de Deus.
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sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
Apropriação indébita
Há vários anos, no seu início, ouço os títulos dados para as metas religiosas, espirituais, nas igrejas brasileiras. “Ano de Abraão”, “Ano de Neemias”, “Ano de Gideão”, “Ano disso conforme Aquilo”. A prática não é privilégio somente dos Hernandes; muitas outras igrejas adotam-na.
A mim incomoda essa tentativa de viver a experiência pessoal à luz da história bíblica. Explico.
Sabemos que o Senhor não criou dois apóstolos Paulo, nem dois Moisés, nem dois “Abraões”. Somente um de cada. A nós também. Nem mesmo se você é gêmeo há uma duplicidade na experiência espiritual.
Que quer dizer que determinado grupo irá viver “o Ano” daquele personagem bíblico? Penso que há nisso uma tentativa de estabelecer alguma “segurança”, como se estabelecêssemos um pacto com Deus de que queremos transferir as ocorrências reais daqueles homens para a nossa própria vida. Se Abraão expandiu suas possessões, quero igualmente ampliar minhas posses, comprar casas, apartamentos, terrenos enfim. Se Neemias restaurou os muros de Jerusalém, quero igualmente ter restaurada a minha vida hoje devastada, seja financeiramente (geralmente é), seja emocionalmente, seja “familiarmente”, e por aí vai.
É legítimo? É possível. Mas penso ser inocente. E infantilizante.
A Bíblia chama a si de “luz”. Ela pretende iluminar nossos passos. Nisso todos concordamos. Nesse sentido, a compreensão que tenho é de que os líderes, os mestres do povo, deveriam usar os exemplos bíblicos para lançar luz diante de nossos próprios problemas, ensinando como enfrentá-los. Explico melhor.
A insistência em que nós “viveremos” as experiências daqueles homens leva-nos a criar a expectativa de algo maior do que realmente pode ser. “Aqueles homens” fizeram isso e aquilo, mas quem garante que Deus chamou cada um de nós para as mesmas coisas? Ninguém garante. Assim, quem entra numa campanha dessas, espera viver nos próximos 366 dias (2012 é bissexto) a experiência definitiva para a sua pendenga.
Há sempre um ou outro que será contemplado. Mas essa tentativa mística de “luz tabórica”* deixa de aproveitar o melhor da espiritualidade e da experiência cristã na sua vida. Quando queremos viver as experiências passadas, afastamo-nos do empenho para desenvolver a nossa própria experiência com Ele, realizada a partir do entendimento de que somos únicos, e que nossa relação com Jesus é igualmente ímpar, única.
Os nomes do passado, sejam os nomes bíblicos, sejam os da Tradição, fizeram grandes obras porque se colocaram nas mãos de Deus para um novo evento, sabendo que eram eles (e não outros) que deveriam ser usados por Deus. Não houve dois John Wesley, não houve dois Hudson Taylor, não houve dois Adoniram Judson, não houve dois George Muller. Repita em voz alta o seu nome e acrescente-o à frase: “Não há dois .....” (ou “Não há duas.....”).
O melhor a fazer é manter a Bíblia como ela é: ela é a verdade que se manifesta em forma de luz para iluminar, esclarecer a compreensão da nossa vida conforme o Senhor der o entendimento. Não devemos fazer “copy > paste” da vida de quem quer que seja, a não ser de um: o próprio Jesus. Dele são todos os anos, todos os dias, dele somos todos nós.
* Em mística, “luz tabórica” é uma referência à experiência da transfiguração de Jesus no Monte Tabor, e remete à iluminação dada por diálogo com personagens passados ou ainda com a própria pessoa do Senhor.
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A mim incomoda essa tentativa de viver a experiência pessoal à luz da história bíblica. Explico.
Sabemos que o Senhor não criou dois apóstolos Paulo, nem dois Moisés, nem dois “Abraões”. Somente um de cada. A nós também. Nem mesmo se você é gêmeo há uma duplicidade na experiência espiritual.
Que quer dizer que determinado grupo irá viver “o Ano” daquele personagem bíblico? Penso que há nisso uma tentativa de estabelecer alguma “segurança”, como se estabelecêssemos um pacto com Deus de que queremos transferir as ocorrências reais daqueles homens para a nossa própria vida. Se Abraão expandiu suas possessões, quero igualmente ampliar minhas posses, comprar casas, apartamentos, terrenos enfim. Se Neemias restaurou os muros de Jerusalém, quero igualmente ter restaurada a minha vida hoje devastada, seja financeiramente (geralmente é), seja emocionalmente, seja “familiarmente”, e por aí vai.
É legítimo? É possível. Mas penso ser inocente. E infantilizante.
A Bíblia chama a si de “luz”. Ela pretende iluminar nossos passos. Nisso todos concordamos. Nesse sentido, a compreensão que tenho é de que os líderes, os mestres do povo, deveriam usar os exemplos bíblicos para lançar luz diante de nossos próprios problemas, ensinando como enfrentá-los. Explico melhor.
A insistência em que nós “viveremos” as experiências daqueles homens leva-nos a criar a expectativa de algo maior do que realmente pode ser. “Aqueles homens” fizeram isso e aquilo, mas quem garante que Deus chamou cada um de nós para as mesmas coisas? Ninguém garante. Assim, quem entra numa campanha dessas, espera viver nos próximos 366 dias (2012 é bissexto) a experiência definitiva para a sua pendenga.
Há sempre um ou outro que será contemplado. Mas essa tentativa mística de “luz tabórica”* deixa de aproveitar o melhor da espiritualidade e da experiência cristã na sua vida. Quando queremos viver as experiências passadas, afastamo-nos do empenho para desenvolver a nossa própria experiência com Ele, realizada a partir do entendimento de que somos únicos, e que nossa relação com Jesus é igualmente ímpar, única.
Os nomes do passado, sejam os nomes bíblicos, sejam os da Tradição, fizeram grandes obras porque se colocaram nas mãos de Deus para um novo evento, sabendo que eram eles (e não outros) que deveriam ser usados por Deus. Não houve dois John Wesley, não houve dois Hudson Taylor, não houve dois Adoniram Judson, não houve dois George Muller. Repita em voz alta o seu nome e acrescente-o à frase: “Não há dois .....” (ou “Não há duas.....”).
O melhor a fazer é manter a Bíblia como ela é: ela é a verdade que se manifesta em forma de luz para iluminar, esclarecer a compreensão da nossa vida conforme o Senhor der o entendimento. Não devemos fazer “copy > paste” da vida de quem quer que seja, a não ser de um: o próprio Jesus. Dele são todos os anos, todos os dias, dele somos todos nós.
* Em mística, “luz tabórica” é uma referência à experiência da transfiguração de Jesus no Monte Tabor, e remete à iluminação dada por diálogo com personagens passados ou ainda com a própria pessoa do Senhor.
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terça-feira, 17 de janeiro de 2012
“Dançando conforme a música” ou “Eu também tenho um sonho”
A passagem dos primeiros versículo aos Gálatas 2, embora cômica, revela muito do jeito humano (e cristão) de ser diante de situações díspares. Estando entre os cristãos da gálacia, portanto gentios, Pedro desfruta as práticas deles sem quaisquer constrangimentos. Isto inclui as práticas religiosas daqueles cristãos, por exemplo sua liberdade no culto. E por que deveria ficar constrangido? Porque sendo judeu, vivia imerso numa cultura mais rígida e fechada.
Porém, com a chegada dos cristãos de Jerusalém e, portanto judeus que preservam costumes judaicos tanto mais rígidos, Pedro aos poucos isolou-se daqueles irmãos e de suas práticas a fim de não ser contestado pelos pares da sua própria nação (ou “denomi”nação).
“Quando vi que não estavam andando de acordo com a verdade do evangelho, declarei a Pedro, diante de todos: ‘Você é judeu, mas vive como gentio e não como judeu. Portanto, como pode obrigar gentios e viver como judeus’?” (Gl 2.14).
Pedro... sempre ele. Buscava aprovação dos outros. E para isso, tinha que dançar conforme a música. Paulo, noutra ocasião, declarou que se fazia de grego, de bárbaro, de fraco, de qualquer coisa, a fim de ganhar esses que eram diferentes dele, cuja cultura era outra. Há diferença entre esses comportamentos? Por que Pedro foi advertido e Paulo não mereceu a mesma correção? Por causa da motivação? Vejamos.
Ao “ajustar” o seu comportamento à fé livre dos gentios, Pedro falseava a própria teologia, isto é, suas próprias convicções de fé. Paulo não; ele mantinha as suas convicções e ajustava-se à cultura local tão somente. Diante dos gálatas, Pedro se comportava como um deles para em seguida dizer que havia outro padrão ao qual deveriam ajustar-se: o modo judeu de ser cristão, conforme vemos Paulo acusando-o. É como se dissesse: “Vocês estão no caminho certo, mas não é ‘bem isso’ o que se espera de cristãos maduros. Vocês ainda chegam lá, como eu cheguei.”
Paulo não usa do mesmo expediente, pois entende sua missão como pregador do evangelho, e não interfere na cultura local nem nos costumes das Igrejas, salvo se os mesmos forem contrários ao próprio evangelho.
Pedro está discutindo questões secundárias à fé, querendo fazer delas pontos fundamentais da doutrina. É como se um pentecostal dissesse a um batista: ‘Você precisa falar línguas estranhas para ser maduro”, ou um presbiteriano dissesse: “Vocês devem batizar crianças” ou um batista afirmasse: “As línguas eram só para aqueles tempo”. O pentecostal crê que as línguas são tanto um dom como sinal para incrédulos ainda hoje, o presbiteriano entende que o pedobatismo está fundamentado nos preceitos da aliança do Antigo Testamento, e o batista admite a cessassão de parte dos dons (não todos), mas nem uma nem outra doutrina movem o fundamento, que é Cristo. Eu não batizo crianças, mas isso não significa que eu tenha dúvidas sobre a salvação daqueles que são batizados nesta época de suas vidas. É questão secundária.
Após os primeiros rompantes da Reforma no Século 16, teve início as chamadas guerras confessionais, disputas internas no movimento reformista para determinar “a mais pura doutrina”. Algo semelhante já havia ocorrido nos primeiros séculos da Igreja com relação a divindade de Cristo, ao Espírito Santo, a Trindade, só para citar algumas.
Às guerras confessionais sucederam as disputas denominacionais, assim que as confissões de fé desdobraram-se em instituições as quais se formaram em torno de cada confissão admitida. Isso não tem fim no âmbito macro, institucional. Mas pode ― e deve ― ser equacionado nos níveis mais baixos, no nível humano, eu diria; entre os irmãos.
Vejo haver certa urgência em buscar um cristianismo mais simples, que mesmo com menos sofisticação não seja por isso menos inteligente. Vejo haver urgência de um cristianismo que não seja regido pelo número de page views em nossos blogs, pelo sensacionalismo, pelo Ibope dos canais de televisão. Um cristianismo que não anuncie a minha ou a sua maneira de ser como a mais correta e funcional, mas que apresente o modo como o Senhor Jesus nos quer em comunhão com o próximo e vivendo no mundo, implantando o seu Reino.
Enquanto buscarmos aprovação uns dos outros seremos sempre Pedro na galácia, negando nossas origens e tendo a consciência pesada por tal negação (salvo aqueles que já a tem cauterizada). Teremos uma teologia instável, dependente da aprovação daqueles com quem queremos nos associar. Isso só provoca em nós mais mal estar. Devemos ficar na posição em que fomos chamados.
Diante disso tudo, “eu também tenho um sonho”, como diria Luther King Jr.
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Porém, com a chegada dos cristãos de Jerusalém e, portanto judeus que preservam costumes judaicos tanto mais rígidos, Pedro aos poucos isolou-se daqueles irmãos e de suas práticas a fim de não ser contestado pelos pares da sua própria nação (ou “denomi”nação).
“Quando vi que não estavam andando de acordo com a verdade do evangelho, declarei a Pedro, diante de todos: ‘Você é judeu, mas vive como gentio e não como judeu. Portanto, como pode obrigar gentios e viver como judeus’?” (Gl 2.14).
Pedro... sempre ele. Buscava aprovação dos outros. E para isso, tinha que dançar conforme a música. Paulo, noutra ocasião, declarou que se fazia de grego, de bárbaro, de fraco, de qualquer coisa, a fim de ganhar esses que eram diferentes dele, cuja cultura era outra. Há diferença entre esses comportamentos? Por que Pedro foi advertido e Paulo não mereceu a mesma correção? Por causa da motivação? Vejamos.
Ao “ajustar” o seu comportamento à fé livre dos gentios, Pedro falseava a própria teologia, isto é, suas próprias convicções de fé. Paulo não; ele mantinha as suas convicções e ajustava-se à cultura local tão somente. Diante dos gálatas, Pedro se comportava como um deles para em seguida dizer que havia outro padrão ao qual deveriam ajustar-se: o modo judeu de ser cristão, conforme vemos Paulo acusando-o. É como se dissesse: “Vocês estão no caminho certo, mas não é ‘bem isso’ o que se espera de cristãos maduros. Vocês ainda chegam lá, como eu cheguei.”
Paulo não usa do mesmo expediente, pois entende sua missão como pregador do evangelho, e não interfere na cultura local nem nos costumes das Igrejas, salvo se os mesmos forem contrários ao próprio evangelho.
Pedro está discutindo questões secundárias à fé, querendo fazer delas pontos fundamentais da doutrina. É como se um pentecostal dissesse a um batista: ‘Você precisa falar línguas estranhas para ser maduro”, ou um presbiteriano dissesse: “Vocês devem batizar crianças” ou um batista afirmasse: “As línguas eram só para aqueles tempo”. O pentecostal crê que as línguas são tanto um dom como sinal para incrédulos ainda hoje, o presbiteriano entende que o pedobatismo está fundamentado nos preceitos da aliança do Antigo Testamento, e o batista admite a cessassão de parte dos dons (não todos), mas nem uma nem outra doutrina movem o fundamento, que é Cristo. Eu não batizo crianças, mas isso não significa que eu tenha dúvidas sobre a salvação daqueles que são batizados nesta época de suas vidas. É questão secundária.
Após os primeiros rompantes da Reforma no Século 16, teve início as chamadas guerras confessionais, disputas internas no movimento reformista para determinar “a mais pura doutrina”. Algo semelhante já havia ocorrido nos primeiros séculos da Igreja com relação a divindade de Cristo, ao Espírito Santo, a Trindade, só para citar algumas.
Às guerras confessionais sucederam as disputas denominacionais, assim que as confissões de fé desdobraram-se em instituições as quais se formaram em torno de cada confissão admitida. Isso não tem fim no âmbito macro, institucional. Mas pode ― e deve ― ser equacionado nos níveis mais baixos, no nível humano, eu diria; entre os irmãos.
Vejo haver certa urgência em buscar um cristianismo mais simples, que mesmo com menos sofisticação não seja por isso menos inteligente. Vejo haver urgência de um cristianismo que não seja regido pelo número de page views em nossos blogs, pelo sensacionalismo, pelo Ibope dos canais de televisão. Um cristianismo que não anuncie a minha ou a sua maneira de ser como a mais correta e funcional, mas que apresente o modo como o Senhor Jesus nos quer em comunhão com o próximo e vivendo no mundo, implantando o seu Reino.
Enquanto buscarmos aprovação uns dos outros seremos sempre Pedro na galácia, negando nossas origens e tendo a consciência pesada por tal negação (salvo aqueles que já a tem cauterizada). Teremos uma teologia instável, dependente da aprovação daqueles com quem queremos nos associar. Isso só provoca em nós mais mal estar. Devemos ficar na posição em que fomos chamados.
Diante disso tudo, “eu também tenho um sonho”, como diria Luther King Jr.
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sexta-feira, 13 de janeiro de 2012
Eu sou de Paulo, eu sou de Calvino, eu sou de Armínio, e eu de Cristo
A história se repete. Não duvide. E dentro da Igreja, com muita frequência. Pois o que ocorreu na igreja da cidade de Corinto, há alguns séculos ganhou nova versão, promovida pelos autodenominados “reformados”. “Reformado” é todo aquele que acredita seguir os cânones da Reforma Protestante de Lutero, Calvino e os demais, inclusive os grupos pré-reformadores, que fique registrado.
Calvino (1509―1554) ganhou fama pela genialidade com que escreveu ou sistematizou a teologia durante o movimento da Reforma. Lutero acendeu o pavio que outros esticaram, mas o “genebrino” sentou e escreveu o que a turma discutia. Seu biógrafo, Theodoro Beza (1519―1605), tomou a obra de Calvino (As Institutas da Religião Cristã) e enfatizou sobremaneira a questão da predestinação. Enfatizou de tal modo que o próprio Calvino não havia feito.
Em nossos dias, os reformados, calvinistas, a partir da postura assumida pelos simpatizantes dessa corrente dentro do cristianismo, repetem à exaustão o esquartejamento do Corpo de Cristo, bailando um divisório “nós-ou-eles”. Calvinistas barulhentos são incansáveis em arrogar a si um conhecimento herdado, fruto da eleição divina, enquanto menosprezam aqueles que não compartilham as mesmas convicções.
Tenho muitos amigos calvinistas, professores, pastores etc. Um deles, de quem fui aluno, chegava a dizer que “arminiano você encontra em qualquer boteco, mas para ser calvinista é preciso estudar”. Que arrogância, irmão! Mais que isso. Leia um livro de autor calvinista com 300 páginas. Antes de entrar no tema do livro ele gastará as primeiras 100 páginas para refutar a doutrina arminiana, que admite o livre arbítrio no âmbito da salvação, posição enfaticamente rejeitada pelos calvinistas, que pensam ser a salvação um ato unilateral de Deus, fruto da eleição “da nata”, não podendo o homem rejeitá-la.
É lamentável ainda haver isso em nosso meio. Blogs, livros, mensagens, além de piadinhas compõem o portfólio dessa turma que divide a Igreja a pretexto de uma gnose que lhes foi imputada.
Foi alguém batizado em nome de Calvino? Morreu Calvino por algum de nós? Paulo faz esta pergunta. E apenas para apimentar o debate, quando lemos um livro escrito por calvinista, é fácil notar a exaustiva citação feita ao reformador. Vez ou outra um texto bíblico, mas no geral citam Calvino. Isso lembra os textos sabatistas com igual dependência a Ellen White, a quem muitos classificam herege. O que muda? A fonte citada, mas o critério de composição dos textos é o mesmo. Então por que uns são hereges e outros não?
E ainda, os Cânones de Dort, tão venerado por este círculo, é a própria prova da unilateralidade divisionista de muitos calvinistas. Quem conhece a obra deve admitir. Se arminianos não compareceram àquela assembleia para defenderem suas posições – e o motivo justifica – como podem uns dizer que outros são hereges? É hora da ala reformada observar o lema da Reforma, Ecclesia reformata et semper reformanda est.
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Calvino (1509―1554) ganhou fama pela genialidade com que escreveu ou sistematizou a teologia durante o movimento da Reforma. Lutero acendeu o pavio que outros esticaram, mas o “genebrino” sentou e escreveu o que a turma discutia. Seu biógrafo, Theodoro Beza (1519―1605), tomou a obra de Calvino (As Institutas da Religião Cristã) e enfatizou sobremaneira a questão da predestinação. Enfatizou de tal modo que o próprio Calvino não havia feito.
Em nossos dias, os reformados, calvinistas, a partir da postura assumida pelos simpatizantes dessa corrente dentro do cristianismo, repetem à exaustão o esquartejamento do Corpo de Cristo, bailando um divisório “nós-ou-eles”. Calvinistas barulhentos são incansáveis em arrogar a si um conhecimento herdado, fruto da eleição divina, enquanto menosprezam aqueles que não compartilham as mesmas convicções.
Tenho muitos amigos calvinistas, professores, pastores etc. Um deles, de quem fui aluno, chegava a dizer que “arminiano você encontra em qualquer boteco, mas para ser calvinista é preciso estudar”. Que arrogância, irmão! Mais que isso. Leia um livro de autor calvinista com 300 páginas. Antes de entrar no tema do livro ele gastará as primeiras 100 páginas para refutar a doutrina arminiana, que admite o livre arbítrio no âmbito da salvação, posição enfaticamente rejeitada pelos calvinistas, que pensam ser a salvação um ato unilateral de Deus, fruto da eleição “da nata”, não podendo o homem rejeitá-la.
É lamentável ainda haver isso em nosso meio. Blogs, livros, mensagens, além de piadinhas compõem o portfólio dessa turma que divide a Igreja a pretexto de uma gnose que lhes foi imputada.
Foi alguém batizado em nome de Calvino? Morreu Calvino por algum de nós? Paulo faz esta pergunta. E apenas para apimentar o debate, quando lemos um livro escrito por calvinista, é fácil notar a exaustiva citação feita ao reformador. Vez ou outra um texto bíblico, mas no geral citam Calvino. Isso lembra os textos sabatistas com igual dependência a Ellen White, a quem muitos classificam herege. O que muda? A fonte citada, mas o critério de composição dos textos é o mesmo. Então por que uns são hereges e outros não?
E ainda, os Cânones de Dort, tão venerado por este círculo, é a própria prova da unilateralidade divisionista de muitos calvinistas. Quem conhece a obra deve admitir. Se arminianos não compareceram àquela assembleia para defenderem suas posições – e o motivo justifica – como podem uns dizer que outros são hereges? É hora da ala reformada observar o lema da Reforma, Ecclesia reformata et semper reformanda est.
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Falando o que não entendemos
A passagem que narra o retorno para Emaús traz um enigma. Dois discípulos caminhando, Jesus ressuscitado aproxima-se e pergunta sobre o que estão falando. Um deles, chamado Cleópas, pergunta ironicamente se Jesus ignora tudo o que havia ocorrido em Jerusalém naqueles dias: prisão, julgamento ilegítimo, crucificação e a própria ressurreição.
No versículo 20 Cleópas acrescenta: “Ele era um profeta, poderoso em palavras e em obras diante de Deus e de todo o povo” (NVI). Em seguida Jesus retruca: “Como vocês custam a entender e como demoram a crer em tudo o que os profetas falaram!” (v 25). Eles não haviam entendido sequer o que os antigos profetas disseram a seu respeito, quanto mais as coisas que Jesus disse, muitas delas por parábolas.
Se gabaram de saberem algo sobre Jesus, mas este afirma que o principal da história havia sido ignorado. O conhecimento íntimo e profundo sobre Jesus vem por meio de nossas próprias experiências com Ele. As experiências e os testemunhos de outros dificilmente nos levam ao aprofundamento da nossa relação com Jesus. No máximo indicam a direção.
Veja como a fala dos discípulos os denuncia. Primeiro, Jesus mesmo diz que eles não o haviam compreendido e, segundo, que embora não compreendessem corretamente (apesar de se gabarem disso), não impediram a Sua morte, mas entristeceram-se por ela. Eles estão condenando os líderes e autoridades do seu país, atribuindo o problema a outros, mas nada falam de si mesmos. Esquecem-se de considerar que a morte de Jesus ocorreu por pecados, e pecados de todos!
Aqueles discípulos não encontravam prazer no que Jesus fez, mas estão entristecidos pelo que Jesus não fez, segundo suas expectativas. Sim, porque as expectativas de muitos judeus que o seguiam era que ele provocasse um levante político, o que definitivamente não era a missão do Messias.
Será que nós também não temos expectativas equivocadas a respeito de Jesus? Será que não temos criado em nossas mente e coração uma imagem artificial, contemporânea e enganosa a respeito dele? Pois se assim for, estamos igualmente no caminho de Emaús, tristes, frustrados, sem perceber o principal componente da missão do Senhor e sem discernir a sua voz.
Criar expectativas erradas sobre o relacionamento com Jesus promove, a médio prazo, decepção, angústia e até revolta, além da clara ignorância. Mais que isso, leva-nos a falar coisas sobre as quais não conhecemos. Muitos de nós esbravejam, impõem, exaltam coisas sobre Jesus e o Cristianismo que de fato não conhecemos. Paulo diz que “em parte conhecemos, em parte profetizamos”.
Precisamos mais um pouco de cautela. Precisamos resgatar algumas disciplinas básicas (primárias até!), a fim de salvar-nos de uma arrogância que impera e grassa, especialmente no coração de quem faz uso da palavra, seja na pregação ou no ensino. Temos falado muito, escrito demais e entendido muito pouco.
Concluindo, o que Jesus fez como um todo não o fez para contemplar apenas um grupo e seus interesses, não importa a característica desse grupo, se de intelectuais ou ignorantes. A Igreja não é apenas a boca do pastor, o braço de quem faz assistência social, as mãos estendidas esperando receber algo ou os pés daquele que prega o evangelho; a Igreja é um corpo e como tal comporta mais do que um simples movimento ou vertente.
Realmente eles não entenderam muita coisa.
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No versículo 20 Cleópas acrescenta: “Ele era um profeta, poderoso em palavras e em obras diante de Deus e de todo o povo” (NVI). Em seguida Jesus retruca: “Como vocês custam a entender e como demoram a crer em tudo o que os profetas falaram!” (v 25). Eles não haviam entendido sequer o que os antigos profetas disseram a seu respeito, quanto mais as coisas que Jesus disse, muitas delas por parábolas.
Se gabaram de saberem algo sobre Jesus, mas este afirma que o principal da história havia sido ignorado. O conhecimento íntimo e profundo sobre Jesus vem por meio de nossas próprias experiências com Ele. As experiências e os testemunhos de outros dificilmente nos levam ao aprofundamento da nossa relação com Jesus. No máximo indicam a direção.
Veja como a fala dos discípulos os denuncia. Primeiro, Jesus mesmo diz que eles não o haviam compreendido e, segundo, que embora não compreendessem corretamente (apesar de se gabarem disso), não impediram a Sua morte, mas entristeceram-se por ela. Eles estão condenando os líderes e autoridades do seu país, atribuindo o problema a outros, mas nada falam de si mesmos. Esquecem-se de considerar que a morte de Jesus ocorreu por pecados, e pecados de todos!
Aqueles discípulos não encontravam prazer no que Jesus fez, mas estão entristecidos pelo que Jesus não fez, segundo suas expectativas. Sim, porque as expectativas de muitos judeus que o seguiam era que ele provocasse um levante político, o que definitivamente não era a missão do Messias.
Será que nós também não temos expectativas equivocadas a respeito de Jesus? Será que não temos criado em nossas mente e coração uma imagem artificial, contemporânea e enganosa a respeito dele? Pois se assim for, estamos igualmente no caminho de Emaús, tristes, frustrados, sem perceber o principal componente da missão do Senhor e sem discernir a sua voz.
Criar expectativas erradas sobre o relacionamento com Jesus promove, a médio prazo, decepção, angústia e até revolta, além da clara ignorância. Mais que isso, leva-nos a falar coisas sobre as quais não conhecemos. Muitos de nós esbravejam, impõem, exaltam coisas sobre Jesus e o Cristianismo que de fato não conhecemos. Paulo diz que “em parte conhecemos, em parte profetizamos”.
Precisamos mais um pouco de cautela. Precisamos resgatar algumas disciplinas básicas (primárias até!), a fim de salvar-nos de uma arrogância que impera e grassa, especialmente no coração de quem faz uso da palavra, seja na pregação ou no ensino. Temos falado muito, escrito demais e entendido muito pouco.
Concluindo, o que Jesus fez como um todo não o fez para contemplar apenas um grupo e seus interesses, não importa a característica desse grupo, se de intelectuais ou ignorantes. A Igreja não é apenas a boca do pastor, o braço de quem faz assistência social, as mãos estendidas esperando receber algo ou os pés daquele que prega o evangelho; a Igreja é um corpo e como tal comporta mais do que um simples movimento ou vertente.
Realmente eles não entenderam muita coisa.
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quinta-feira, 12 de janeiro de 2012
Aversão ao Templo
A atual aversão ao cristianismo institucionalizado tem raízes mais profundas. Remonta ao seu próprio nascimento, quando alguns judeus e muitos helenistas não sentiam prazer nos cultos “oficiais”. Os helenistas, por serem considerados “mestiços” ou mesmo impuros. Alguns judeus, por preferirem uma vida espiritual mais vibrante que a promovida e mantida por sacerdotes de conduta suspeita.
O livro de Atos dá indicação de ter sido esses helenistas que levaram o evangelho de Jerusalém para Samaria após a perseguição contra os doze, já que estes não saíram de Jerusalém. Mas os helenistas (gr. hellenistai), sim. Hellenistai deriva do verbo hellenizein que não significa “falar grego”, mas viver à maneira grega. Poderia tratar-se de judeus ou descendentes desses que viviam de maneira grega, judeus com tendências mais místicas, com tendências sincréticas. Isso explica o repúdio por parte dos que se consideravam mais santos e justos.
Os helenistas recusam o culto no templo e pregam contra ele assim como os essênios, razão pela qual foram expulsos de Jerusalém. Em João 4.38, Jesus declara que os “outros” (gr. alloi) inauguram a missão em Samaria e então os apóstolos “entram” em seu trabalho. Definitivamente não foram os apóstolos nem os discípulos originais que levaram o evangelho até aquela região.
Oscar Cullmann admite que o quarto evangelho tem um laço de afinidade com os helenistas e com a seita de Qunram. Os três, o quarto evangelho, os essênios e os helenistas, têm em comum a aversão ao templo. Neste sentido, a metáfora de Paulo para a Igreja, o corpo como templo, e a missão paulina aos gentios alinham-se a esse discurso e até mesmo prepara a sua defesa.
João, por sua vez, situa a purificação do templo no início do seu evangelho, diferente dos sinóticos ― o templo está no foco. É nesse evangelho, no início também, que Jesus afirma a uma samaritana que nem em Samaria nem no templo em Jerusalém é o lugar onde o Pai seria adorado. Nada mais adequado.
Lucas, em Atos 6, justamente quando fala dos helenistas, afirma que numerosos “sacerdotes” se têm unido à Igreja (v. 7). Com efeito, muitos membros da seita de Qunram eram sacerdotes. Excelente maneira de “esvaziar” o templo dos seus oficiais levando-os para “o novo templo’, que é a Igreja nascente.
Os helenistas, portanto, eram aqueles que não faziam parte do judaísmo oficial, nem mesmo da comunidade de Israel. Não existia outro nome para designá-los. Do mesmo modo, parte do cristianismo oficial chama “sincretistas” (ou mesmo liberais, dependendo do caso) àqueles que não concordam com os posicionamentos e agendas da liderança estabelecida... isso quando não os chama de hereges mesmo!
“Os helenistas eram a parte mais viva e mais interessante da igreja primitiva”. (Cullmann)
Paulo, como lhe convém, constrói a sua teologia a partir de Cristo na cruz (1Co 1.23; 2.2). E ele mesmo afirma em 1Co 1.23 que até para os judeus a mensagem de Cristo na cruz é escandalosa, contra cultural. Mas, “para os que foram chamados é o poder de Deus” (v. 24). Nada de Templo; o assunto é a cruz.
A função básica da mensagem não é adequar-se à cultura: nem Jerusalém, nem Samaria. Também não deve adequar-se aos chamados em cada cultura. A mensagem é o poder de Deus e a sabedora de Deus, ou seja, aquilo que cada cultura necessita. Portanto, está implícita a sugestão de que a mensagem tem o poder de modificar cada cultura. E como a cultura é dinâmica, está sempre sendo alterada, justifica-se o lema da Reforma “Igreja reformada sempre reformando” (lat. Ecclesia reformata et semper reformanda est) No v. 24 o apóstolo indica que Deus faz sentido para todas as culturas em todos os tempos.
Cullmann sustenta, ainda, que o evangelho de João tenha uma relação ou elementos que o liguem a um tipo de judaísmo tanto mais “esotérico”, no sentido de marginal ao judaísmo oficial do final do primeiro século, já existente na Palestina. Este judaísmo específico teria sido a manjedoura do cristianismo. Estevão, helenista, deve ter tido alguma ligação com este grupo. Foi ele quem citou Isaias 66.1: “O céu é o meu trono, e a terra, estrado dos meus pés. Que espécie de casa vocês me edificarão?” Vejam só o desprezo pelo Templo em preferência a uma religião mais aberta a novas possibilidades. Seria já o efeito da graça?
Para concluir, João parece “opor-se” a Mateus 10.5 (“Não entrem em cidade samaritana”), quando em seu quarto evangelho faz questão de mostrar que Jesus queria sim a missão em Samaria. Já no quarto capítulo narra Jesus opondo-se ao modelo religioso oficial de Jerusalém com o seu Templo. Se podemos aprender algo com esse discurso, não percamos tempo.
A partir da ressurreição de Jesus, a shekinah, a glória de Deus no Templo, se desliga deste e se une ao Logos feito carne. Cristo substitui o templo! Antes de sua morte, a presença divina se manifestava na encarnação; após ela, nos sacramentos, celebrado por todos os cristãos, judeus e pagãos, que em todos os lugares formam a Igreja. Definitivamente Deus não está num templo feito por mãos de homens.
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O livro de Atos dá indicação de ter sido esses helenistas que levaram o evangelho de Jerusalém para Samaria após a perseguição contra os doze, já que estes não saíram de Jerusalém. Mas os helenistas (gr. hellenistai), sim. Hellenistai deriva do verbo hellenizein que não significa “falar grego”, mas viver à maneira grega. Poderia tratar-se de judeus ou descendentes desses que viviam de maneira grega, judeus com tendências mais místicas, com tendências sincréticas. Isso explica o repúdio por parte dos que se consideravam mais santos e justos.
Os helenistas recusam o culto no templo e pregam contra ele assim como os essênios, razão pela qual foram expulsos de Jerusalém. Em João 4.38, Jesus declara que os “outros” (gr. alloi) inauguram a missão em Samaria e então os apóstolos “entram” em seu trabalho. Definitivamente não foram os apóstolos nem os discípulos originais que levaram o evangelho até aquela região.
Oscar Cullmann admite que o quarto evangelho tem um laço de afinidade com os helenistas e com a seita de Qunram. Os três, o quarto evangelho, os essênios e os helenistas, têm em comum a aversão ao templo. Neste sentido, a metáfora de Paulo para a Igreja, o corpo como templo, e a missão paulina aos gentios alinham-se a esse discurso e até mesmo prepara a sua defesa.
João, por sua vez, situa a purificação do templo no início do seu evangelho, diferente dos sinóticos ― o templo está no foco. É nesse evangelho, no início também, que Jesus afirma a uma samaritana que nem em Samaria nem no templo em Jerusalém é o lugar onde o Pai seria adorado. Nada mais adequado.
Lucas, em Atos 6, justamente quando fala dos helenistas, afirma que numerosos “sacerdotes” se têm unido à Igreja (v. 7). Com efeito, muitos membros da seita de Qunram eram sacerdotes. Excelente maneira de “esvaziar” o templo dos seus oficiais levando-os para “o novo templo’, que é a Igreja nascente.
Os helenistas, portanto, eram aqueles que não faziam parte do judaísmo oficial, nem mesmo da comunidade de Israel. Não existia outro nome para designá-los. Do mesmo modo, parte do cristianismo oficial chama “sincretistas” (ou mesmo liberais, dependendo do caso) àqueles que não concordam com os posicionamentos e agendas da liderança estabelecida... isso quando não os chama de hereges mesmo!
“Os helenistas eram a parte mais viva e mais interessante da igreja primitiva”. (Cullmann)
Paulo, como lhe convém, constrói a sua teologia a partir de Cristo na cruz (1Co 1.23; 2.2). E ele mesmo afirma em 1Co 1.23 que até para os judeus a mensagem de Cristo na cruz é escandalosa, contra cultural. Mas, “para os que foram chamados é o poder de Deus” (v. 24). Nada de Templo; o assunto é a cruz.
A função básica da mensagem não é adequar-se à cultura: nem Jerusalém, nem Samaria. Também não deve adequar-se aos chamados em cada cultura. A mensagem é o poder de Deus e a sabedora de Deus, ou seja, aquilo que cada cultura necessita. Portanto, está implícita a sugestão de que a mensagem tem o poder de modificar cada cultura. E como a cultura é dinâmica, está sempre sendo alterada, justifica-se o lema da Reforma “Igreja reformada sempre reformando” (lat. Ecclesia reformata et semper reformanda est) No v. 24 o apóstolo indica que Deus faz sentido para todas as culturas em todos os tempos.
Cullmann sustenta, ainda, que o evangelho de João tenha uma relação ou elementos que o liguem a um tipo de judaísmo tanto mais “esotérico”, no sentido de marginal ao judaísmo oficial do final do primeiro século, já existente na Palestina. Este judaísmo específico teria sido a manjedoura do cristianismo. Estevão, helenista, deve ter tido alguma ligação com este grupo. Foi ele quem citou Isaias 66.1: “O céu é o meu trono, e a terra, estrado dos meus pés. Que espécie de casa vocês me edificarão?” Vejam só o desprezo pelo Templo em preferência a uma religião mais aberta a novas possibilidades. Seria já o efeito da graça?
Para concluir, João parece “opor-se” a Mateus 10.5 (“Não entrem em cidade samaritana”), quando em seu quarto evangelho faz questão de mostrar que Jesus queria sim a missão em Samaria. Já no quarto capítulo narra Jesus opondo-se ao modelo religioso oficial de Jerusalém com o seu Templo. Se podemos aprender algo com esse discurso, não percamos tempo.
A partir da ressurreição de Jesus, a shekinah, a glória de Deus no Templo, se desliga deste e se une ao Logos feito carne. Cristo substitui o templo! Antes de sua morte, a presença divina se manifestava na encarnação; após ela, nos sacramentos, celebrado por todos os cristãos, judeus e pagãos, que em todos os lugares formam a Igreja. Definitivamente Deus não está num templo feito por mãos de homens.
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quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
Quando ele vem, nos envia
Enquanto comiam a páscoa, a sua última, Jesus tomou outro pão a fim de instituir a Santa Ceia: “Enquanto comiam, Jesus tomou o pão, deu graças, partiu-o, e o deu aos seus discípulos, dizendo: ‘Tomem e comam; isto é o meu corpo.” (Mt 26.26, ênfases acrescentadas). Estavam reunidos no cenáculo (foto acima), uma sala ampla no coração de Jerusalém.
A Santa Ceia veio a ser para os cristãos a representação material da habitação espiritual da fé e da Palavra de Deus em nós. Da fé, porque é dessa forma que nos apropriamos do seu sacrifício de sangue, representado ali pelo vinho. Da Palavra, porque Jesus mesmo, o Verbo, disse ser ele o Pão da Vida. A Santa Ceia constitui-se, portanto, numa renovação de votos e compromissos de seguirmos firmes na fé apoiada pelo sacrifício e que a Palavra habita em nós e, com isso, nos renova a cada instante.
É a riqueza da simbologia cristã que não podemos deixar de celebrar. Todo o Antigo Testamento foi embelezado com essas propostas linguísticas da tipologia e nós, a Igreja, temos ainda mais motivos para observá-las, já que somos privilegiados por conhecermos o seu cumprimento. Para eles no AT os símbolos eram guias; para nós encantamento com o seu exato e rigoroso cumprimento em Jesus. Que sabedoria o Senhor ocultou naqueles ricos rituais!
A quase dois meses da ocorrência da Santa Ceia, os discípulos de Jesus estavam reunidos no mesmo cenáculo, orando. Eles que haviam sido penetrados pelo Corpo de Cristo na Ceia num compromisso de fé, agora seriam confirmados na sua disposição de expor vidas, força, emoções e razão no anúncio e proclamação da Boa Nova. Mas faltava-lhes algo para romper os limites do judaísmo com suas barreiras étnicas, uma vez que a fé e a Palavra já estavam presentes também nos crentes judeus, seus antecessores.
Assim, naquele mesmo cenáculo, o Espírito Santo vem transbordá-los, resultando num rompante de exaltação à grandeza do Deus visto, crido e confessado. Eles agora se diferenciavam dos antigos homens e mulheres de fé, pois a habitação do Espírito era, dessa vez, dada a toda a carne. Isto é confirmado à medida que Pedro, Felipe, Estêvão e os outros levam para mais longe de Jerusalém o testemunho de que a Verdade que habita em nós leva-nos pelo Caminho.
Quem assim caminha descobre paisagens que se apresentam enquanto avança. Avançam aqueles aos quais Jesus primeiro vem, habita, edifica e orienta. E descobrem a verdade os que, enviados, seguem em frente sem olhar para trás.
Siga-me no Twitter: @magnopaganelli
A Santa Ceia veio a ser para os cristãos a representação material da habitação espiritual da fé e da Palavra de Deus em nós. Da fé, porque é dessa forma que nos apropriamos do seu sacrifício de sangue, representado ali pelo vinho. Da Palavra, porque Jesus mesmo, o Verbo, disse ser ele o Pão da Vida. A Santa Ceia constitui-se, portanto, numa renovação de votos e compromissos de seguirmos firmes na fé apoiada pelo sacrifício e que a Palavra habita em nós e, com isso, nos renova a cada instante.
É a riqueza da simbologia cristã que não podemos deixar de celebrar. Todo o Antigo Testamento foi embelezado com essas propostas linguísticas da tipologia e nós, a Igreja, temos ainda mais motivos para observá-las, já que somos privilegiados por conhecermos o seu cumprimento. Para eles no AT os símbolos eram guias; para nós encantamento com o seu exato e rigoroso cumprimento em Jesus. Que sabedoria o Senhor ocultou naqueles ricos rituais!
A quase dois meses da ocorrência da Santa Ceia, os discípulos de Jesus estavam reunidos no mesmo cenáculo, orando. Eles que haviam sido penetrados pelo Corpo de Cristo na Ceia num compromisso de fé, agora seriam confirmados na sua disposição de expor vidas, força, emoções e razão no anúncio e proclamação da Boa Nova. Mas faltava-lhes algo para romper os limites do judaísmo com suas barreiras étnicas, uma vez que a fé e a Palavra já estavam presentes também nos crentes judeus, seus antecessores.
Assim, naquele mesmo cenáculo, o Espírito Santo vem transbordá-los, resultando num rompante de exaltação à grandeza do Deus visto, crido e confessado. Eles agora se diferenciavam dos antigos homens e mulheres de fé, pois a habitação do Espírito era, dessa vez, dada a toda a carne. Isto é confirmado à medida que Pedro, Felipe, Estêvão e os outros levam para mais longe de Jerusalém o testemunho de que a Verdade que habita em nós leva-nos pelo Caminho.
Quem assim caminha descobre paisagens que se apresentam enquanto avança. Avançam aqueles aos quais Jesus primeiro vem, habita, edifica e orienta. E descobrem a verdade os que, enviados, seguem em frente sem olhar para trás.
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Tolerância e apologética
Ano passado postei aqui uma reflexão sobre tolerância e intolerância nos nossos discursos cristãos. A experiência que tive naquela ocasião foi das mais frutíferas nos últimos anos, pois esgarçou-me os olhos para perceber o quanto somos combativos em questões que deveríamos ser pacíficos e mansos.
O fato de "dever ser pacifico" não implica em ser "imparcial" nem tampouco "indiferente". Pacificidade é a qualidade ou virtude de promover a boa convivência, a cooperação e também a tolerância. Repito: isso não significa ceder nas questões cruciais; não significa abrir mão de valores; não significa inclinar-se à opinião contrária.
A postura combativa que nos é tão peculiar tem raízes, muitas delas estrangeiras, trazidas dos missionários norteamericanos que nos evangelizaram. A mentalidade do norteamericano na ocasião da expansão missionária do século dezenove era a da conquista do mundo (e parece não ter mudado muito desde então). A postura era, portanto, combativa, conquistadora, "libertadora". Veja reflexo disso nos hinos tradicionais da Harpa Cristã e Cantor Cristão, por exemplo. As letras inspiram ao combate, incitam os cristãos a marcharem, avançando contra o mal, arvorando estandartes!
Soma-se a isso a presença igualmente combativa da Igreja Católica e os confrontos que se seguiram por décadas, quando precisavámos atacar suas doutrinas para estabelecer a nossa. Resultado: os cristãos tupiniquins aprenderam que crente bom é crente valente, confrontador, que ataca a tudo e a todos. Nessa esteira vieram, recentemente, os ministérios de batalha espiritual. Uma nova geração com o mesmo comportamento, agora agravado: já não bastava batalhar contra católicos, umbandistas e kardecistas. Era preciso dominar os demônios por trás desses sistemas na batalha contra o invisível, apesar de que muitos afirmaram "ver" o mal contra o qual combatiam.
Com tudo isso, removemos da pauta evangélica tudo o que inspirasse a mansidão, a pacificidade e a... tolerância. Tornamo-nos intolerantes depois de criarmo-nos agressivos e, com isso, desconsideramos a atuação do próprio Espírito Santo na vida daqueles com os quais convivemos e a quem desejamos vê-los salvos. Assim, não enxergamos o próximo como a alguém a quem precisamos demonstrar naturalmente a importância e o valor da presença de Cristo em nossas vidas, mas contra quem precisamos guerrear. Vez ou outra miramos para dentro de nossa própria casa, atacando os nossos. Absurdo!
O contexto do evangelho, tanto nas palavras de Jesus como de Paulo, indicam que há um modo de apresentar o evangelho sem confrontação. Evidentemente não há uma norma única para isto, mas há situações nas quais somente assim haverá repercussão. É atribuída a Francisco de Assis a máxima: "Pregue a todo instante. Se precisar, use palavras".
Percebo que o momento é de reaprender a apresentar a fé cristã, sob risco de ficarmos falando sozinhos. "Jesus é a resposta, mas quem está perguntando?" Alguns dirão que vale a pena manter-se assim, combativo, pois sempre haverá que ouça discursos mais acalorados. Mas note que os que nos ouvem têm sido os de dentro. Nossos programas de televisão, rádio e internet são feitos para a própria Igreja, às vezes a igreja local! A Igreja, no entanto, foi chamada desde os primeiros apóstolos para falar aos de fora. E "os de fora" encontram dificuldades em ouvir intolerantes.
A violência e a agressividade tem encontrado cada vez menos espaço na sociedade, caracteristica da pós-modernidade, salvo naqueles meios onde a tônica é o sensacionalismo, gente cheia de si. Jesus, no entanto, veio para os doentes, que se reconhecem carentes, não de gente que se imagina dona da razão, autosuficiente.
Quer ter êxito no discurso cristão? Procure os doentes, fale aos necessitados, aos abertos ao diálogo, ávidos pelo Evangelho. Não há resultados satisfatórios em ministrar remédio a gente sadia. E doentes não podem ser tratados com agressividade nem intolerância.
Será que conseguiremos nos empenhar no cultivo de uma nova mentalidade? Nós que já passamos pela metanóia descrita em Romanos 12.1,2, saberemos rever e renovar nossa própria postura frente aos novos desafios apresentados pelo mundo?
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O fato de "dever ser pacifico" não implica em ser "imparcial" nem tampouco "indiferente". Pacificidade é a qualidade ou virtude de promover a boa convivência, a cooperação e também a tolerância. Repito: isso não significa ceder nas questões cruciais; não significa abrir mão de valores; não significa inclinar-se à opinião contrária.
A postura combativa que nos é tão peculiar tem raízes, muitas delas estrangeiras, trazidas dos missionários norteamericanos que nos evangelizaram. A mentalidade do norteamericano na ocasião da expansão missionária do século dezenove era a da conquista do mundo (e parece não ter mudado muito desde então). A postura era, portanto, combativa, conquistadora, "libertadora". Veja reflexo disso nos hinos tradicionais da Harpa Cristã e Cantor Cristão, por exemplo. As letras inspiram ao combate, incitam os cristãos a marcharem, avançando contra o mal, arvorando estandartes!
Soma-se a isso a presença igualmente combativa da Igreja Católica e os confrontos que se seguiram por décadas, quando precisavámos atacar suas doutrinas para estabelecer a nossa. Resultado: os cristãos tupiniquins aprenderam que crente bom é crente valente, confrontador, que ataca a tudo e a todos. Nessa esteira vieram, recentemente, os ministérios de batalha espiritual. Uma nova geração com o mesmo comportamento, agora agravado: já não bastava batalhar contra católicos, umbandistas e kardecistas. Era preciso dominar os demônios por trás desses sistemas na batalha contra o invisível, apesar de que muitos afirmaram "ver" o mal contra o qual combatiam.
Com tudo isso, removemos da pauta evangélica tudo o que inspirasse a mansidão, a pacificidade e a... tolerância. Tornamo-nos intolerantes depois de criarmo-nos agressivos e, com isso, desconsideramos a atuação do próprio Espírito Santo na vida daqueles com os quais convivemos e a quem desejamos vê-los salvos. Assim, não enxergamos o próximo como a alguém a quem precisamos demonstrar naturalmente a importância e o valor da presença de Cristo em nossas vidas, mas contra quem precisamos guerrear. Vez ou outra miramos para dentro de nossa própria casa, atacando os nossos. Absurdo!
O contexto do evangelho, tanto nas palavras de Jesus como de Paulo, indicam que há um modo de apresentar o evangelho sem confrontação. Evidentemente não há uma norma única para isto, mas há situações nas quais somente assim haverá repercussão. É atribuída a Francisco de Assis a máxima: "Pregue a todo instante. Se precisar, use palavras".
Percebo que o momento é de reaprender a apresentar a fé cristã, sob risco de ficarmos falando sozinhos. "Jesus é a resposta, mas quem está perguntando?" Alguns dirão que vale a pena manter-se assim, combativo, pois sempre haverá que ouça discursos mais acalorados. Mas note que os que nos ouvem têm sido os de dentro. Nossos programas de televisão, rádio e internet são feitos para a própria Igreja, às vezes a igreja local! A Igreja, no entanto, foi chamada desde os primeiros apóstolos para falar aos de fora. E "os de fora" encontram dificuldades em ouvir intolerantes.
A violência e a agressividade tem encontrado cada vez menos espaço na sociedade, caracteristica da pós-modernidade, salvo naqueles meios onde a tônica é o sensacionalismo, gente cheia de si. Jesus, no entanto, veio para os doentes, que se reconhecem carentes, não de gente que se imagina dona da razão, autosuficiente.
Quer ter êxito no discurso cristão? Procure os doentes, fale aos necessitados, aos abertos ao diálogo, ávidos pelo Evangelho. Não há resultados satisfatórios em ministrar remédio a gente sadia. E doentes não podem ser tratados com agressividade nem intolerância.
Será que conseguiremos nos empenhar no cultivo de uma nova mentalidade? Nós que já passamos pela metanóia descrita em Romanos 12.1,2, saberemos rever e renovar nossa própria postura frente aos novos desafios apresentados pelo mundo?
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terça-feira, 3 de janeiro de 2012
Para quê serve a fé?
A pergunta pode soar estranha, e para alguns será. Temos visto, ouvido e lido sobre a fé como requisito básico para os mais diversos fins: culto, consolação, cura, enriquecimento. E talvez pouca reflexão tem sido proposta sobre a fé para viver a vida. Não falarei sobre o "viver da fé" ou "viver pela fé" como se concebe a questão nas igrejas. Vamos ficar no campo da normalidade, entendendo "normalidade" como rege o grosso da membresia.
A fé não é objeto exclusivo das pessoas assumidamente religiosas. Se quisesse ser irônico poderia dizer que tudo o que muitos dos atuais "religiosos" não ostentam é paradoxalmente a fé, uma vez que vivem de poupudos salários ganhos no mercado da... fé!
A fé tampouco é só o amuleto dos ignorantes, pessoals do conhecimento científico, alienados. Ao contrário, a fim de se chegar à fé também é preciso levar a razão ao seu limite para, então, adentrar nos domínios da fé mais plena, onde a razão nada tem a dizer. É ali onde se descobre a mente e os desígnios de Deus, tarefa perseguida pela razão e, consequentemente, pelas modernas ciências. Como as ciências não têm todas as respostas, chega a um momento quando precisa se calar. É quando a fé pode ser ouvida ou mesmo o sussuro do próprio Deus.
Dessa forma, a razão provê base para decisões no curso de nossas vidas. Ela nos diz como viver determinadas situações. No entanto, a razão não dá todas as razões da nossa vida, da nossa existência. Sempre haverá um momento quando o intelecto se verá limitado pelas circunstâncias. Uma doença incurável, uma situação de desemprego ou endividamento, a solidão, o abandono, a traição entre outras ocorrências tão comuns a nós humanos.
É neste ponto que todos, indistintamente, recorremos à fé. Muitos inconscientemente, mas todos apoiamo-nos nesse recurso inato ao ser humano. Quando o pai de família acorda desempregado, precisando colocar alimento à mesa e já esgotou as possibilidades de recolocação, ele recorre à fé. É a sua fé em algo ou alguém que ele mesmo não saiba descrever ou nomear; mas ele escora-se na possibilidade de alguma força além de si que virá ao seu socorro. E isto é fé.
Todos precisamos de fé e todos nascemos com ela. Uns admitem-na e fazem uso indiscriminado, exploram-na, compartilham, vivem na fé. Outros se dizem céticos, ateus até, mas como diz uma canção, "quando a coisa aperta, dizem: 'Ai, meu Deus!'."
Está aí um fato curioso. O homem é um ser religioso no sentido de que manifesta traços de uma espiritualidade que muitas vezes não é reconhecida, e por isso não a admite. Mas ela está lá, latente, presente.
Chamem-na esperança, acaso, conspiração do Universo, sorte, casualidade, coincidência e tantos outros codinomes que a maqueiam, mas no fundo é ela: a fé. Que é a esperança de que este dia será melhor do que ontem senão a própria e viva manifestação da fé? A Bíblia afirma isto quando diz que a fé é a certeza daquilo que "esperamos". Portanto, a esperança é fé em estado bruto.
Por isso, não podemos negar outros elementos que a acompanham, como suas manifestações, pois seria mais embaraçoso para quem não admite tê-la. A pergunta a ser respondida por estes, então, é: Uma vez que a tem, você tem fé em quê? Ou ainda: Você tem nutrido a sua fé, alimentando-a como ao seu intelecto ou como cuida das suas emoções?
Siga-me no Twitter: @magnopaganelli
A fé não é objeto exclusivo das pessoas assumidamente religiosas. Se quisesse ser irônico poderia dizer que tudo o que muitos dos atuais "religiosos" não ostentam é paradoxalmente a fé, uma vez que vivem de poupudos salários ganhos no mercado da... fé!
A fé tampouco é só o amuleto dos ignorantes, pessoals do conhecimento científico, alienados. Ao contrário, a fim de se chegar à fé também é preciso levar a razão ao seu limite para, então, adentrar nos domínios da fé mais plena, onde a razão nada tem a dizer. É ali onde se descobre a mente e os desígnios de Deus, tarefa perseguida pela razão e, consequentemente, pelas modernas ciências. Como as ciências não têm todas as respostas, chega a um momento quando precisa se calar. É quando a fé pode ser ouvida ou mesmo o sussuro do próprio Deus.
Dessa forma, a razão provê base para decisões no curso de nossas vidas. Ela nos diz como viver determinadas situações. No entanto, a razão não dá todas as razões da nossa vida, da nossa existência. Sempre haverá um momento quando o intelecto se verá limitado pelas circunstâncias. Uma doença incurável, uma situação de desemprego ou endividamento, a solidão, o abandono, a traição entre outras ocorrências tão comuns a nós humanos.
É neste ponto que todos, indistintamente, recorremos à fé. Muitos inconscientemente, mas todos apoiamo-nos nesse recurso inato ao ser humano. Quando o pai de família acorda desempregado, precisando colocar alimento à mesa e já esgotou as possibilidades de recolocação, ele recorre à fé. É a sua fé em algo ou alguém que ele mesmo não saiba descrever ou nomear; mas ele escora-se na possibilidade de alguma força além de si que virá ao seu socorro. E isto é fé.
Todos precisamos de fé e todos nascemos com ela. Uns admitem-na e fazem uso indiscriminado, exploram-na, compartilham, vivem na fé. Outros se dizem céticos, ateus até, mas como diz uma canção, "quando a coisa aperta, dizem: 'Ai, meu Deus!'."
Está aí um fato curioso. O homem é um ser religioso no sentido de que manifesta traços de uma espiritualidade que muitas vezes não é reconhecida, e por isso não a admite. Mas ela está lá, latente, presente.
Chamem-na esperança, acaso, conspiração do Universo, sorte, casualidade, coincidência e tantos outros codinomes que a maqueiam, mas no fundo é ela: a fé. Que é a esperança de que este dia será melhor do que ontem senão a própria e viva manifestação da fé? A Bíblia afirma isto quando diz que a fé é a certeza daquilo que "esperamos". Portanto, a esperança é fé em estado bruto.
Por isso, não podemos negar outros elementos que a acompanham, como suas manifestações, pois seria mais embaraçoso para quem não admite tê-la. A pergunta a ser respondida por estes, então, é: Uma vez que a tem, você tem fé em quê? Ou ainda: Você tem nutrido a sua fé, alimentando-a como ao seu intelecto ou como cuida das suas emoções?
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segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
Guerra de doutrinas
A doutrina pentecostal é acusada de ser restrita aos primeiros cristãos, no tempo quando eram necessárias as suas manifestações com vistas ao evangelismo. Por sua vez, o movimento pentecostal é apontado como tendo surgido no século 20, o que significa a sua irrelevância durante quase dois mil anos de história do cristianismo, sem contar o desacordo com a interpretação que defende a sua extinção após o período apostólico (o chamado cessacionismo).
Ignorância da história fazer tais afirmações, além, é claro, do erro hermenêutico. Embora Paulo tenha alertado sobre o abuso no uso de tal dom, o mesmo foi mantido embora com menos ênfase, evidentemente. Montano incentivou a busca do pentecostes, no que foi apoiado por dois dos Pais da Igreja, Tertuliano e Irineu. Com medo dos excessos (o que em si não depõe contra o dom em sí, mas contra a prática), Roma considerou Montano um herege e tudo o que fizera foi desconsiderado, mesmo algum componente positivo do seu movimento.
No quarto século, Agostinho, o mais expressivo teólogo da primeira fase da Igreja, escreveu: "Ainda fazemos o que os apóstolos fizeram quando impuseram as mãos sobre os samaritanos e invocaram o Espírito Santo sobre eles, mediante a imposição das mãos. Espera-se que os convertidos falem em novas línguas". No mesmo quarto século, Pacômio, fundador do primeiro mosteiro, falava latim e grego, idiomas que não havia aprendido, habilidade que era atribuída ao dom do Espírito e que seria repetida nos séculos quatorze e dezesseis nas vidas de Vincent Ferrer e Francisco Xavier.
Mais de cinquenta anos antes dos episódios na Azuza Street (1905), há relatos de ocorrência das manifestações pentecostais com o falar em outras línguas em países como Escocia, Suíça, Inglaterra, Armênia, Estados Unidos e Rússia. Além disso, relatos de nomes expressivos de denominações tradicionais como Billy Graham e Dwight Moody (ambos batistas), John Stott (anglicano), Rev. James I. McCord (presidente do Princeton Theological Seminary, presbiteriano), Dr. Ernest Wright (Harvard) e uma contundente declaração feita pelo Rev. Samuel M. Schoemaker:
"Sem importar o que significa o antigo-novo fenômeno do 'falar em línguas', o mais admirável é que se declare não apenas no seio dos grupos pentecostais, mas também entre os episcopais, os luteranos e os presbiterianos. Tenho visto pessoas que a têm recebido, e isto as tem abençoado e lhe dado um poder que não possuíam antes. Não pretendo entender este fenômeno. Mas estou razoavelmente certo de que indica a presença do Espiríto Santo em uma vida, assim como a fumaça que sai de uma chaminé indica a presença de fogo por baixo. E sei, com certeza, que Deus quer entrar na igreja, corajosa, antiquada e autocentralizada, como geralmente ocorre, para que lhe outorgue uma modalidade de poder que a torne radiante, excitante, altruísta. Deveríamos procurar compreender e ser reverentes para com esse fenômeno em vez de desprezá-lo ou zombar dele." (The Episcopalian, 15 de maio de 1968).
Esse é um aspecto do cenário que encontramos na fronteira das igrejas pentecostais e tradicionais. O ramo reformado (presbiterianos, igreja reformada e parte dos batistas) mantém a insistência e ênfase exacerbada na doutrina da predestinação. A Bíblia menciona a predestinação e ela é um capítulo dos quatro grandes volumes da obra de Calvino As Institutas. Repito: um único capítulo de uma enorme obra comporta por qiatro volumes. Sabemos que Theodoro Beza, biógrafo de Calvino, foi quem tomou a predestinação como carro-chefe em sua teologia e o próprio Norman Geisler, calvinista, pergunta se "Calvino era calvinista?" (Eleitos, mas livres, Ed. Vida).
De fato não era, como nenhum outro grupo desde o judaísmo até o pós-Reforma enfatizou tal doutrina comoma da predestinação. Ainda que Paulo a incluísse no texto aos Romanos e Agostinho fizesse citação, ela nunca recebeu tamanha atenção como no último século, o que para muitos de nós demonstra que há algo errado com isso. Quando leio um livro escrito por um desses calvinistas não tenho como não lembrar de casos como Ellen White, considerada herege por mitos reformados e mesmo pentecostais (a questão aqui não é esta). Por dar muita ênfase na "guarda do sábado" os adventistas têm sido considerados hereges. E a ênfase na predestinação não dá ocasião à mesma desconfiança? Pessoalmente tenho essa sensação.
Mas por que estou escrevendo isto? Qual a relação entre as línguas, o pentecostalismo, a predestinação e os adventistas? Uma relação que fica mais e mais evidente para mim é que há muitos casos nos quais as doutrinas, quando ocupam uma posição que não deveriam ocupar, geram mais divisões que unidade, promovem mais separações e conflitos do que agregam e esclarecem nossas mentes.
Precisamos estudar, aprofundar temas, discutir pautas e levar a Igreja para fora de seus muros. Mas definitivamente não faremos isso apertando os botões no teclado em nossas trincheiras e disparando contra as bases cristãs daqueles que, mesmo aperfilados junto ao mesmo Senhor, têm recebido um chamado diferente do nosso. O Espírito pode ser o mesmo, mas a sua manifestação tem sido diferente. E temos sido tardios em perceber isso.
Se for zelo cristão, que vá lá. Mas se temos feito isso em nome de uma instituição, que seja anátema. Se defendemos cargos e salários, fora daqui com sua hipocrisia.
Que o Reino seja anunciado acima de todas as nossas diferenças, até mesmo acima da Igreja, pois que aquele comporta esta.
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Ignorância da história fazer tais afirmações, além, é claro, do erro hermenêutico. Embora Paulo tenha alertado sobre o abuso no uso de tal dom, o mesmo foi mantido embora com menos ênfase, evidentemente. Montano incentivou a busca do pentecostes, no que foi apoiado por dois dos Pais da Igreja, Tertuliano e Irineu. Com medo dos excessos (o que em si não depõe contra o dom em sí, mas contra a prática), Roma considerou Montano um herege e tudo o que fizera foi desconsiderado, mesmo algum componente positivo do seu movimento.
No quarto século, Agostinho, o mais expressivo teólogo da primeira fase da Igreja, escreveu: "Ainda fazemos o que os apóstolos fizeram quando impuseram as mãos sobre os samaritanos e invocaram o Espírito Santo sobre eles, mediante a imposição das mãos. Espera-se que os convertidos falem em novas línguas". No mesmo quarto século, Pacômio, fundador do primeiro mosteiro, falava latim e grego, idiomas que não havia aprendido, habilidade que era atribuída ao dom do Espírito e que seria repetida nos séculos quatorze e dezesseis nas vidas de Vincent Ferrer e Francisco Xavier.
Mais de cinquenta anos antes dos episódios na Azuza Street (1905), há relatos de ocorrência das manifestações pentecostais com o falar em outras línguas em países como Escocia, Suíça, Inglaterra, Armênia, Estados Unidos e Rússia. Além disso, relatos de nomes expressivos de denominações tradicionais como Billy Graham e Dwight Moody (ambos batistas), John Stott (anglicano), Rev. James I. McCord (presidente do Princeton Theological Seminary, presbiteriano), Dr. Ernest Wright (Harvard) e uma contundente declaração feita pelo Rev. Samuel M. Schoemaker:
"Sem importar o que significa o antigo-novo fenômeno do 'falar em línguas', o mais admirável é que se declare não apenas no seio dos grupos pentecostais, mas também entre os episcopais, os luteranos e os presbiterianos. Tenho visto pessoas que a têm recebido, e isto as tem abençoado e lhe dado um poder que não possuíam antes. Não pretendo entender este fenômeno. Mas estou razoavelmente certo de que indica a presença do Espiríto Santo em uma vida, assim como a fumaça que sai de uma chaminé indica a presença de fogo por baixo. E sei, com certeza, que Deus quer entrar na igreja, corajosa, antiquada e autocentralizada, como geralmente ocorre, para que lhe outorgue uma modalidade de poder que a torne radiante, excitante, altruísta. Deveríamos procurar compreender e ser reverentes para com esse fenômeno em vez de desprezá-lo ou zombar dele." (The Episcopalian, 15 de maio de 1968).
Esse é um aspecto do cenário que encontramos na fronteira das igrejas pentecostais e tradicionais. O ramo reformado (presbiterianos, igreja reformada e parte dos batistas) mantém a insistência e ênfase exacerbada na doutrina da predestinação. A Bíblia menciona a predestinação e ela é um capítulo dos quatro grandes volumes da obra de Calvino As Institutas. Repito: um único capítulo de uma enorme obra comporta por qiatro volumes. Sabemos que Theodoro Beza, biógrafo de Calvino, foi quem tomou a predestinação como carro-chefe em sua teologia e o próprio Norman Geisler, calvinista, pergunta se "Calvino era calvinista?" (Eleitos, mas livres, Ed. Vida).
De fato não era, como nenhum outro grupo desde o judaísmo até o pós-Reforma enfatizou tal doutrina comoma da predestinação. Ainda que Paulo a incluísse no texto aos Romanos e Agostinho fizesse citação, ela nunca recebeu tamanha atenção como no último século, o que para muitos de nós demonstra que há algo errado com isso. Quando leio um livro escrito por um desses calvinistas não tenho como não lembrar de casos como Ellen White, considerada herege por mitos reformados e mesmo pentecostais (a questão aqui não é esta). Por dar muita ênfase na "guarda do sábado" os adventistas têm sido considerados hereges. E a ênfase na predestinação não dá ocasião à mesma desconfiança? Pessoalmente tenho essa sensação.
Mas por que estou escrevendo isto? Qual a relação entre as línguas, o pentecostalismo, a predestinação e os adventistas? Uma relação que fica mais e mais evidente para mim é que há muitos casos nos quais as doutrinas, quando ocupam uma posição que não deveriam ocupar, geram mais divisões que unidade, promovem mais separações e conflitos do que agregam e esclarecem nossas mentes.
Precisamos estudar, aprofundar temas, discutir pautas e levar a Igreja para fora de seus muros. Mas definitivamente não faremos isso apertando os botões no teclado em nossas trincheiras e disparando contra as bases cristãs daqueles que, mesmo aperfilados junto ao mesmo Senhor, têm recebido um chamado diferente do nosso. O Espírito pode ser o mesmo, mas a sua manifestação tem sido diferente. E temos sido tardios em perceber isso.
Se for zelo cristão, que vá lá. Mas se temos feito isso em nome de uma instituição, que seja anátema. Se defendemos cargos e salários, fora daqui com sua hipocrisia.
Que o Reino seja anunciado acima de todas as nossas diferenças, até mesmo acima da Igreja, pois que aquele comporta esta.
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