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sábado, 29 de dezembro de 2012

AUTORIDADE É PARA OS FRACOS - 2

O último texto sobre "autoridade" não me satisfez. Escrevi pouco sobre o que queria, de fato, enfatizar. Por isso a necessidade de avançar, insistir no tema.
Vejo a rarefação do cristianismo nessa sanha por autoridade como há na Igreja. Algumas delas, é bem verdade. Vejo muito pouco a Jesus e sobram perfis de líderes corporativos nas palestras; nem dá para chamar de pregação ou sermão a um discurso que destoa do que foi ensinado pelo Mestre da Galileia.
Jesus disse para termos autoridade sobre demônios e pecados. Os mestres modernos e pós-modermos ignoram isso, mas falam em autoridade sobre pessoas, equipes e líderes. Lembram mais a gerentes de venda de Consórcio Remaza querendo motivar equipes do que homens santos apontando o caminho para uma vida de desapego. Cansam.
De repente um batalhão de crentes avança orientado pelo desejo de liderar. Qierem liderar o mundo enquanto não resolvem a vida de um cônjuge e um parzinho de filhos. Não se fala outra coisa. Gostaria de voltar a ouvir sobre o fruto do espírito ("amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança", Gálatas 5.22) e como desenvolvê-los. Mas agora não dá, porque parte da Igreja está pautada pela agenda de valores estranhos ao Evangelho. O resultado são palestras ensinando religiosos a serem bons mundanos. "Bons" é por minha conta: religiosos orientados por valores mundanos não são maus religiosos nem bons mundanos. São fracos.
Quem são os fortes, então? Fortes não são os que se deixam levar pela inércia popular. Não se faz força para chegar ao erro e ao pecado: basta deixar-se levar. Pare de resistir e logo está lambuzado da sujeira: ela é o padrão do mundo.
É preciso esforçar-se - isso sim - fazer força para produzir valores legítimos, equalizados aos valores que encontramos na vida de homens e mulheres de fé. E é bom lembrar que fé em nada se parece com auto-sugestão nem com confissão positiva nem com autoajuda.
É preciso nos esforçarmo por virtudes e valores que privilegiem a vida pessoal modificada pelas boas Novas e pelos direitos do vizinho. É muito estranha essa preleção que ensina a conquistar o mundo lá fora e o nivelamento dos bons (seleção natural aplicada à sociedade), mesmo que para isso a família seja desintegrada e os direitos do meu semelhante sejam desconstruídos porque alguém se imagina "filho do rei".
Nada mais pobre do que essa prosperidade secular e poucas coisas são tão anticristãs como algumas mensagens ouvidas em certas igrejas.

AUTORIDADE É PARA OS FRACOS

Poucos temas despertam tanta atenção de evangélicos como a autoridade. Livros são escritos, congressos são realizados, DVDs são distribuídos, tudo com a finalidade de ensinar uma parcela de cristãos interessados a reconhecer, desenvolver e exercer sua autoridade nos mundos espiritual e físico.
Se você navegar pela TimeLine do Twitter de alguns pastores ou palestrantes, verá com que facilidade elaboram frases de efeito sobre autoridade. Vá a uma boa livraria evangélica e em cinco minutos você verá alguém que não consegue cuidar da própria vida, mas está inebriado pelo canto da sereia desse modismo, à procura de material sobre como se tornar um líder em umas poucas lições (lições dadas, muitas vezes, por gente que nada sabe sobre o tema; é bom que se diga).
Como conciliar esta tendência com a orientação dada por Jesus em Mateus 20? Vejamos o texto:

"Então Jesus, chamando-os para junto de si, disse: Bem sabeis que pelos príncipes dos gentios são estes dominados, e que os grandes exercem autoridade sobre eles. Não será assim entre vós; mas todo aquele que quiser entre vós fazer-se grande seja vosso serviçal".

Tenho grande dificuldade em enfatizar certas passagens da Bíblia em detrimento de outras; isso é desonestidade, em primeiro lugar. Está claro que a procura e o desejo de possuir autoridade espiritual é um desvio flagrante e equivocado do espírito do Evangelho, do espírito cristão. O desejo de ter autoridade, como a vemos estimulado na Igreja, é uma tentativa de igualar-se ao sistema vigente, a cultura corrompida e ao padrão de comportamentos humanos, contra os quais cristãos cuidadosos deveriam exercer sua influência, caso tivessem sido influenciados por Jesus e por suas palavras. Isso não ocorreu. Esses cristãos não conhecem as palavras de Jesus nem gastam tempo com ele a fim de serem influenciados.
Há umas décadas, parte dos cristãos entenderam que era preciso aproximar-se das pessoas de fora da Igreja para poder apresentar-lhes o Evangelho. Mas entenderam que também era preciso mostrar que a Igreja tinha algum atrativo: músicas com os mesmos ritmos, reuniões com a mesma dinâmica e... comportamento e linguagem semelhantes. O sistema e a cultura permaneceram corrompidos como sempre foram, mas a Igreja, ao baixar a guarda para legitimar e expandir seu discurso, permitiu que a influência de fora entrasse pela porta da frente, e os cristãos estenderam palmas e cantaram: "Hosana! Somos atraentes e parecidos!".
Não parou aí. Aqueles que foram atraídos para dentro a Igreja, como não viram diferença entre lá e cá, demonstaram pouca disposição em manifestar sinais mínimos de mudança comportamental: não houve conversão, mas convencimento. Por seu lado, alguns cristãos que "abriram suas mentes" para a aproximação, passado algum tempo deixaram de buscar almas e contentaram-se repartir os despojos, isto é, aquilo que trouxeram de fora: ambição, egoísmo, individualismo, sede de poder, empenho por autoridade, necessidade de auto-afirmação e uma gama de defeitos e vícios os quais não precisávamos em hipótese alguma.
As virtudes que percebo como essenciais e que marcaram toda a história da Igreja, as mesmas que grandes religiões perseguem, foram abandonadas por esta parcela da Igreja; hoje fazem parte de um museu da história dos fracos. Humildade, serviço, mansidão, submissão, amor, longanimidade, paciência, prudência. Quem quer isso? Quem quer ser conhecido por essas qualidades?
Jesus não enganou os cristãos durante toda a trajetória da Igreja nos últimos dois mil anos. O Evangelho não foi reeditado; ele é o mesmo desde o primeiro século. Desse modo, todo aquele que procura ler e entender a Bíblia como um todo orgânico e unificado, que não deturpa o sentido original das Escrituras e tem se aproximado de Jesus com reverência, colocando-se no lugar do discípulo diante do Mestre perceberá facilmente que a autoridade apregoada em nossos dias é para os fracos. Cristãos que cuidam de sua espiritualidade não são encantados pela sedução de viver conforme o modelo caído e em estado de putrefação, modelo perverso e enganador da cultura vigente. Há cristãos boquiabertos diante da possibilidade de serem poderosos, reconhecidos, autoridades nacionais (ainda que, repito, não entendam bem o que é isso).
Não quero essa autoridade ilegítima, condenada e denunciada por Jesus, contrária ao Evangelho e essencialmente anticristã. Procuro e busco o modelo deixado pelo Senhor e insisto em fazer dele o meu modo de vida. Esforço-me por ser servo; autoridade é para os fracos.